Investigadores que acompanham transações em diferentes paraísos fiscais estão intrigados com uma coincidência: empresas offshore citadas nas delações da JBS também aparecem em investigações sobre construtoras brasileiras. Pessoas próximas aos casos querem saber o motivo pelo qual essas offshores foram utilizadas em diferentes momentos, por pessoas sem relações diretas, mas sempre para transferir recursos a políticos e operadores.

Afora o fato de serem investigadas em esquemas de pagamento de propinas a políticos brasileiros, é difícil estabelecer correlações entre a JBS, maior produtora de carne do mundo, com a Queiroz Galvão, empresa que atua nas áreas de engenharia, óleo e gás, ou com a construtora Camargo Corrêa. A partir das várias delações e investigações em crimes de corrupção, porém, novas informações mostram que em algum momento elas tiveram vínculos financeiros. A relação ocorreu de forma indireta, por meio de Lunsville e Valdarco, empresas offshores abertas por Joesley no Panamá, um paraíso fiscal.

Joesley contou em sua delação que passou a reservar, para pagar propina, de 1% a 3% do valor de comissões originadas a partir de operações de exportações de várias empresas do grupo. Para movimentar esses recursos, abriu duas offshores: Lunsville Internacional e Valdarco Investments. Joesley Batista, dono da JBS, declarou que sempre havia dinheiro para que ambas pudessem fazer remessas a contas em diferentes países e a doleiros no Brasil.

Cruzamento

Ao se fazer o cruzamento de delações, descobriu-se que Lunsville foi citada por Expedito Machado, filho de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras. Em sua colaboração, Expedito narrou que, entre 2007 e 2013, recebeu recursos do exterior de esquemas do pai com várias empresas. Segundo ele, Lunsville era responsável por pagamentos da Queiroz Galvão. Expedito disse ter perdido os registros dos depósitos e listou de cabeça as contrapartes da Queiroz Galvão, incluindo na lista a Lunsville.

A Valdarco foi identificada pelas autoridades do Peru, a partir de investigações da promotoria de crimes financeiros do país. O ponto de partida foram denúncias de que o ministro de Habitação, Construção e Saneamento, Juan Sarmiento Soto, também do conselho da Sedapal – empresa responsável pelo abastecimento de água -, teria fraudado uma licitação em benefício da Camargo Corrêa. O ano era 2009 e o presidente, Alan Garcia. A partir de várias diligências, incluindo a busca e apreensão de documento no escritório local da construtora brasileira, foi possível traçar o caminho do dinheiro.

Segundo os investigadores, Juan não teria sido pago diretamente. A propina fora repassada a Enrique Saco Sarmiento, um parente, numa conta em Miami. A conta dos Estados Unidos, por sua vez, recebera o dinheiro do Panamá, num depósito feito pela Valdarco. O pagamento ocorreu em março de 2009. A investigação no Peru foi associada à Operação Castelo de Areia, mais tarde considerada ilegal no Brasil. Mas, no ano passado, investigadores do Peru trocaram informações com a força-tarefa da Lava Jato, por meio de acordo de cooperação.

Suíça

As osffshores da JBS fizeram várias movimentações via Suíça. Em uma delação premiada, o diretor-financeiro da JBS, Demilton Antonio de Castro, explicou que duas empresas de fachada eram alimentadas no banco suíço Julius Baer. A instituição financeira era a mesma que também manteve quatro contas de empresas offshore controladas pelo ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A reportagem apurou que essa situação mudou quando a Operação Lava Jato ganhou novas dimensões e bancos suíços foram obrigados pelos procuradores a registrar e informar às autoridades suíças qualquer tipo de movimentação fora do comum envolvendo brasileiros.

No Julius Baer, o volume de recursos movimentados pela JBS e seus padrões de transferência acenderam um sinal de alerta, levando o banco a exigir explicações. Segundo fontes do meio financeiro suíço, as contas foram fechadas e transferidas para o banco Hottinger. Documentos anexados nas delações confirmam a mudança.

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Em nota, o grupo JBS informou que “todos os atos ilícitos que a companhia e seus executivos cometeram no passado foram comunicados à Procuradoria-Geral da República e estão documentados nos autos da delação”. empresa ressaltou que informações, dados e provas encontram-se em poder da Justiça, reforçando que “a companhia segue em seu firme propósito de colaborar com a Justiça brasileira.”

Por meio de sua assessoria, a construtora Queiroz Galvão declarou que “não comenta investigações em andamento”. A construtora Camargo Corrêa, bem como a defesa do ex-deputado Eduardo Cunha disseram que não comentariam. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.