Bolsas caindo, mercado mundial inseguro e quem aposta no ouro para se proteger contra a crise desencadeada pelo coronavírus pode até ter motivos para respirar aliviado. O ativo é considerado porto seguro em momentos de incertezas. De 1º de janeiro (R$ 196,42) até quarta-feira 18 (R$ 247,35) o grama teve alta de 26%. Em dois anos, variou de R$ 138,86 o grama (19 de março de 2018) para o preço atual – elevação superior a 78%.

Tradicionalmente, o ouro funciona como salvaguarda quando falta dinheiro e é o refúgio de quem busca proteção para o patrimônio. Além do investimento em fundos de ativos indexados ao metal, que tem boa liquidez, os interessados em não perder dinheiro diante da crise podem apostar em barras de ouro.

Ainda assim, como qualquer investimento de renda variável a volatilidade pode assustar. O veterano investidor e autor dos livros Os Mercadores da Noite e 1929, Ivan Sant’Anna, diz que partir do princípio de que o ouro é um porto seguro sem nuances é um erro. “Fosse esse o caso a cotação da onça agora estaria acima dos US$ 1.895, máxima de todos os tempos, alcançada em setembro de 2011, e não em US$ 1.580 como está [sendo vendido] agora”, escreveu, em artigo publicado no sábado 14 de março.

A formação do preço do ouro tem influência em três variáveis: a taxa de juros norte-americana (quanto maior a taxa, menos atrativo é o investimento), o preço do dólar (quanto mais baixo, mais valorizado fica o ouro) e, por último, está amplamente vinculado à demanda direta, alimentada pelo crescimento de países compradores de joias (como Emirados Árabes, China e Índia).

SOMA DE MEDOS “É como o investimento em dólar: a pessoa compra sabendo do valor, mas ciente de que pode haver depreciação”, explica Edson Magalhães, gerente de operações sênior da BP Trading e da Reserva Metais. “O joalheiro está comprando menos e isso é sensível assim como houve uma queda pontual no mercado internacional, mas a tendência do ouro é de alta”, afirma Magalhães. “Isso ocorre porque ele é a soma de todos os medos: o do supermercado vazio, o da medo de companhia aérea parar, o de medo de ficar doente, e até mesmo o medo de precisar e não ter.” De acordo com o trader, o ouro é o que chamam de colchão de liquidez, inerte a qualquer crise setorial ou geopolítica. Uma espécie de teflon.

Mauriciano Cavalcante, diretor de operações de câmbio da Ourominas, endossa a opinião e diz que a procura por ouro físico cresceu 20% em relação ao mesmo período de 2019. “Diante de qualquer crise, seja ela externa ou interna, o ouro é o primeiro investimento a ser procurado, justamente pela liquidez imediata”, afirma. “O ativo não perde valor e não há depreciação em pouco tempo.”

O cenário é favorável porque o Brasil é um dos maiores produtores de ouro. A maior parte do metal sai de Minas Gerais (60%), seguido por Goiás e Bahia, conforme os dados da Associação Nacional de Mineração. Apesar dos números expressivos, o potencial de extração de ouro brasileiro ainda é desconhecido. “É necessário investimentos para que o país conheça melhor seus recursos geológicos e melhore a segurança jurídica para quem for fazer a exploração”, diz Rogério Manoel, presidente da Abramp (Associação Brasileira dos Metais Preciosos). Não há números atualizados precisos sobre o comércio de ouro ilegal, mas, operações da Polícia Federal e da Receita estão em constantes trabalhos de investigação para prender pessoas ligadas a qualquer esquema de extração ou comércio ilegal do produto.

“A extração ilegal tem uma série de riscos, que vão desde as condições insalubres, os riscos ao meio ambiente chegando até o destino deste ouro”, afirma Rogério Manoel, da Abramp. “O País ainda precisa aperfeiçoar muito o combate ao garimpo ilegal. Nessa prática todos estão perdendo, inclusive o meio ambiente.”

Os compradores brasileiros garantem a recompra do ativo com emissão de nota fiscal, mas, na prática, ao realizar a venda, as casas de ouro usam a cotação do dia, o que pode acarretar em variações. No caso da tributação, é garantida a isenção tributária para valores abaixo de R$ 20 mil. Acima desse montante, há a incidência de 15% de imposto sobre o lucro da operação. O recolhimento do IR deve ser feito pelo próprio investidor até o último dia útil do mês subsequente ao da operação.