Naquele enclave milionário na paisagem às margens da Rodovia Castelo Branco, seus 30 mil habitantes fazem parte do Brasil que não tem por que reclamar da vida. Esparramadas por duas dezenas de condomínios fechados, as casas em que eles vivem com renda per capita de R$ 5,9 mil têm em média três carros em cada garagem. O risco da violência foi contido por uma segurança particular ostensiva e, assim, ao longo dos últimos 30 anos a aura de riqueza do lugar só atraiu mais riqueza. No último dia 17, porém, um pedágio de R$ 3,50 foi colocado entre a ilha de prosperidade e a cidade de São Paulo, distante 11 quilômetros, numa pista marginal à rodovia, administrada pela concessionária Viaoeste. O bastante para que empresários virassem sindicalistas e donas de casa assumissem sua porção combativa. Em torno de um bem organizado boicote, a Alphaville nascida no boom econômico dos anos 70 está revoltada. ?Somos discriminados socialmente porque há, sim, gente muito rica por aqui?, diz Fátima Baracho, moradora do residencial 5. ?Mas não é por isso que o governo tem o direito de deixar a concessionária cobrar o que quer para chegarmos a São Paulo. Um real seria um preço justo.?

Com dinheiro arrecadado nos condomínios, uma comissão de moradores confeccionou adesivos, fez cartazes e colocou faixas nas ruas. Todas as manhãs, voluntários saem pelas alamedas para tirar os vizinhos do caminho do pedágio. Até um parecer jurídico, por R$ 15 mil, foi encomendado para dar sustentação ao movimento. Uma rota alternativa, seis quilômetros maior, vai sendo usada. ?Esse boicote ajuda, principalmente, a população flutuante?, lembra Maurício Gariglia, dono de um Jeep Cherokee com preço de mercado de R$ 60 mil. Hoje, diariamente, Alphaville atrai cerca de 100 mil pessoas, entre empregados locais e visitantes.

Com seu movimento prosaico, singular e inesperado, os ricos de Alphaville traduziram a insatisfação de boa parte da população contra os pedágios (leia texto ao lado). Por enquanto, são vitoriosos. O pedágio está esvaziado, com o acesso de cerca de 15 mil carros por dia, quando poderiam já ser 50 mil. A Viaoeste planeja instalar outro, em dois meses, na nova marginal que constrói no sentido Capital-Interior. Só planeja dar trégua nas tarifas quando todo o sistema estiver em operação. ?Podemos pensar em dar desconto a usuários freqüentes?, diz o diretor de operações da empresa, José Lima Filho. ?Mas, agora, não.?

O MELHOR NEGÓCIO

Concessão de rodovias é o negócio mais promissor do Brasil. Dentro de três anos, quando 17,4 mil quilômetros de rodovias estaduais e federais estarão privatizados, as projeções das próprias concessionárias indicam um retorno de 18% a 20% ao ano sobre o dinheiro investido. Porcentuais que superam o retorno médio dos bancos, de 16% anuais, e de empresas do setor produtivo, de 14%, segundo a ABM Consulting. Sem grandes riscos. As fontes de receita das concessionárias, os 140 pedágios existentes no País, recebem pagamentos à vista e em espécie. ?O negócio é bom porque é possível prever as receitas e o retorno aos acionistas?, diz Líbano Barroso, diretor-financeiro da CCR, a maior concessionária brasileira.

Obtido por DINHEIRO, o balanço do ano passado das 33 concessionárias em operação no País mostra que elas investiram R$ 1,6 bilhão, quase o dobro dos recursos aplicados no ano anterior. As receitas com pedágios chegaram a R$ 1,9 bilhão, 29% a mais. O déficit diminuiu de R$ 1,5 bilhão para R$ 1,2 bilhão. Pesquisa da Comissão de Concessões do Estado de São Paulo, entretanto, mostra que 78% dos usuários consideram o preço dos pedágios alto e 62% acham que eles existem em excesso. ?É melhor ter mais praças e cobrar menos em cada uma delas?, defende Moacyr Duarte, da Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias (ABCR).

Estela Caparelli