Cartas marítimas e boletins meteorológicos advertem: há uma tormenta se formando no caminho da Halliburton, a maior empresa de serviços em campos de petróleo do mundo. E uma das nuvens negras chama-se Brasil. Na primeira semana de fevereiro, investidores e analistas de Wall Street tiveram acesso a um alarmante relatório da empreiteira texana que o vice-presidente americano, Dick Cheney, presidiu até as vésperas do governo Bush. O documento apresenta, em 26 páginas, uma lista de fatores de risco aos quais a empreiteira está sujeita neste ano. Um deles é o ?fator Cheney?. A conexão da companhia com a Casa Branca, que lhe rendeu contratos bilionários depois da Guerra do Iraque, agora é uma ameaça por causar ?intenso escrutínio? das suas operações. Menos bombástico, porém mais imediato, é o que se pode chamar de ?risco Petrobras?. Desde junho passado, a estatal vem cobrando da Halliburton cerca de US$ 380 milhões em multas pelo atraso na entrega de dois navios-plataforma encomendados para a exploração de petróleo na Bacia de Campos ? cada um deles com capacidade para produzir 180 mil barris de petróleo/dia.

Os contratos, avaliados em mais de US$ 2,5 bilhões, previam a entrega da primeira plataforma em novembro de 2003 e da segunda em meados de 2004. Mas as obras atrasaram, não há expectativa de entrega antes do segundo semestre de 2005 e a Petrobras decidiu que não arcará sozinha com o prejuízo. A Halliburton, por sua vez, culpa a Petrobras por ter alterado normas técnicas para as plataformas, provocando o atraso. Sem acerto negociado, o contencioso foi parar na Comissão das Nações Unidas para Leis de Comércio Internacional, um tribunal de arbitragem em Nova York.

Na única declaração que fez sobre o assunto, o diretor de Exploração e Produção da estatal, Guilherme Estrella, disse que as negociações evoluíram e podem levar a um acordo entre as partes ?a curto prazo?. Sem detalhes sobre o acerto, a informação despertou ceticismo. ?Na Petrobras, Estrella é o diretor menos simpático a empresas privadas?, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura. Indicado por sindicalistas para o cargo, Estrella seria ?demasiadamente nacionalista? para negociar com a multinacional. Para o mercado, o que está em jogo é o cronograma para o Brasil se tornar auto-suficiente em petróleo. Por causa do atraso na entrega das plataformas, a meta, que estava fixada em 2005, foi adiada para 2006.

Já no fechamento do primeiro semestre de 2003, a Halliburton admitia que seus lucros desceriam a um nível muito abaixo das expectativas de Wall Street devido às perdas no projeto brasileiro. Agora, com o relatório apresentado aos investidores, a Petrobras assume de vez um papel de destaque no inferno astral de uma Halliburton cada vez mais enredada na teia que teceu em torno da Casa Branca e do Pentágono. Desde a eclosão da Guerra do Iraque, a companhia já faturou contratos de US$ 15,6 bilhões para realizar obras de reconstrução. Dinheiro muito bem-vindo para uma empresa que faturou US$ 16,2 bilhões em 2003, mas fechou o ano com prejuízo de US$ 820 milhões. O efeito colateral foi ter seu nome associado a palavras como ?padrinho? e ?capitalismo entre compadres?. Cheney deixou a presidência da Halliburton em 2000, depois de cinco anos à frente da empresa, para assumir o cargo no governo. Mas ainda recebe mais de US$ 1 milhão por ano de ?verbas rescisórias? da companhia ? uma das grandes financiadoras da campanha de George Bush. Para a empreiteira texana, o custo-benefício da proximidade com a Casa Branca até o momento é positivo e o problema que essa proximidade gera é meramente político. ?A Halliburton foi e continua sendo foco de alegações, algumas delas feitas por razões políticas por adversários do vice-presidente e do governo Bush?, diz a empresa no relatório ao mercado. ?Esperamos que essas alegações continuem e se intensifiquem enquanto as eleições de 2004 se aproximam.?