CONFESSE. QUANTAS VEZES VOCÊ pensou, durante as últimas semanas, que investir suas economias em ações não foi uma idéia tão boa? Nos últimos dois meses, Petrobras, Vale, Gerdau e outras blue chips da Bolsa caíram a uma velocidade vertiginosa (veja gráfico), derrubando o Ibovespa a 55 mil pontos em 4 de agosto, número que não atingia desde janeiro. Para agravar o cenário, o Banco Central aumentou a taxa básica de juros para 13% ao ano e a inflação anda bastante acelerada. Será o fim das vacas gordas? Prever o futuro da economia em tempos voláteis é missão impossível. Mas se você está preocupado, assustado ou até mesmo apavorado com os rumos de sua carteira de ações, acalme-se. Épocas como essa acontecem periodicamente. E, se a sua entrada na bolsa é recente, comece a se acostumar a elas.

A história do empresário Roberto Alves, dono de uma lotérica em Sorocaba (SP), reflete a realidade de muitos novatos na Bolsa. Ele começou a investir há dois anos e nunca havia enfrentado perdas significativas. Por isso, resgatou 100% de seu capital investido em renda fixa para comprar ações. E foi além: vendeu 50% de seu patrimônio imobiliário para montar uma carteira de longo prazo. Começou a operar no mercado de opções, em que são negociados direitos de compra e venda futura a preços determinados. Em maio deste ano, Alves tomou um empréstimo bancário de R$ 100 mil para reformar sua casa, mas decidiu investir temporariamente em ações. Comprou tudo em papéis preferenciais da Petrobras para garantir uma operação de opções e quebrou a cara. O mercado virou, a ação despencou e Alves acumulou um prejuízo de 35%. ?Consegui perder tudo o que ganhei nesses anos?, lamenta. O desespero bateu quando as prestações do empréstimo começaram a vencer. Além de congelar a reforma, ele teve que pagar as parcelas. Agora, não pretende esperar muito para vender suas ações da Petrobras. ?Se o prejuízo recuar para 15% ou 20%, eu vendo?, conta.

IBRAHIM CRUZ/AG. ISTOÉ

Esse é um ótimo momento para comprar
 

FABIANA MAGALHÃES, que perdeu 20% nas blue chips

 

Quem, como ele, via na escalada das ações uma tendência sem fim deve aproveitar a lição. Tudo o que sobe, desce, inclusive a pata de um urso quando ataca ? daí a expressão ?bear market? (mercado do urso, em inglês), usada nos Estados Unidos para definir a tendência de baixa na Bolsa, especialmente quando a queda supera 20% desde o pico. O Ibovespa recuou 24% desde seu ponto máximo, em 20 de maio (73.516 pontos). Algumas ações perderam mais de 50% do valor. Temores de recessão nos Estados Unidos, com quebra de bancos e prejuízos gigantescos das empresas, têm levado milhões de pessoas e instituições a vender ações para aplicar em renda fixa. Isso tem derrubado as Bolsas no mundo todo, inclusive por aqui. ?Os brasileiros estão conhecendo o que é bear market. O último que houve foi em 2002, mas foi mais brando?, explica Paulo Portinho, gerente-geral do Instituto Nacional de Investidores (INI).

Segundo o INI, as ações no Brasil têm caído devido à fuga do capital estrangeiro. Um estudo com base em todas as entradas e saídas de investimentos no mercado de capitais desde 2005 mostrou que a movimentação externa tem um peso de 72% na oscilação do Ibovespa. Somente em julho, foram repatriados R$ 7,6 bilhões na BM&F Bovespa. ?Os estrangeiros são fundos que representam milhares de pessoas lá fora. Eles são obrigados a manter padrões de segurança. Como o ambiente mundial não está favorável ao risco, eles vendem e as cotações caem?, explica Portinho. Outro motivo é a alta liquidez do mercado brasileiro, isto é, a facilidade de se vender ações. ?As blue chips brasileiras estão entre as mais líquidas do mundo?, diz Carlos Fernando Kochenborger, analista de siderurgia da Geração Futuro.

Até quando o urso vai dar as cartas na Bolsa? Quem disser que sabe, estará ?chutando? ou mentindo. Mas esperança é o que não falta para o chef e empresário paulistano Eduardo Andreoli. Investidor há pouco mais de dois anos, possui uma carteira de longo prazo composta por blue chips como Vale, Gerdau, Petrobras, Bradesco e Itaú. Suas contas indicam uma desvalorização de 25%. Só não perdeu mais porque realizou boa parte dos lucros na época em que o Ibovespa atingiu 72 mil pontos. Preocupado, Andreoli não tira os olhos do pregão, no aguardo da recuperação. Quem sabe, ainda em 2008. Enquanto isso, ele tem de enfrentar a frustração. ?O pior não foi lidar com a perda, mas com a decepção de não ganhar tanto dinheiro como estava acostumado?, conta. ?O mais difícil foi administrar meu ego.?

IBRAHIM CRUZ/AG. ISTOÉ

O mais difícil foi administrar meu ego
 

EDUARDO ANDREOLI, cujas ações caíram 25%

 

O amadurecimento faz parte do processo de investimento em ações. Segundo o economista William Eid, da FGV, os investidores individuais continuam fazendo o oposto do que deveriam em épocas de vacas magras. Em vez de comprar mais barato para vender mais caro depois, eles se desesperam e se desfazem dos papéis na baixa, com prejuízo. ?Os fundos de ações refletem o comportamento do investidor pessoa física. Quando cai o Ibovespa, o capital evapora do fundo. Isso não é maturidade?, afirma Eid. A captação líquida (depósitos menos saques) dos fundos de ações não passou de R$ 70 milhões em julho. No mesmo período de 2007, o resultado havia sido de R$ 4,1 bilhões. O principal conselho do economista é manter a cautela e aguardar a recuperação. ?O mercado interno continua muito aquecido e a previsão é de desaceleração do IPCA. Ressacas como essa acontecem em economias em crescimento, mas as perspectivas para o Brasil são muito boas?, diz.

Mesmo assustados com a queda, muitos investidores acham que esta é a hora ideal para garimpar papéis baratos na Bolsa. Algumas empresas voltaram ao ponto de compra, acredita a paulistana Fabiana Magalhães.

?Esse é um ótimo momento para comprar?, diz ela. Ela possui dois terços de seu capital em blue chips e periodicamente investe o dinheiro excedente em ações de empresas menores (small caps) para obter ganhos de curto prazo. Dentre elas, a Ferbasa, que subiu 151% no ano e reduziu um pouco a desvalorização da sua carteira de longo prazo (20%). Ela não pretende realizar prejuízos. Se pudesse, Fabiana investiria mais ainda em ações, de olho na aposentadoria. ?Bolsa é investimento de longo prazo e o mundo sempre vai precisar de petróleo e aço?, diz. Difícil é esperar para ver.