Dezenas de pessoas realizaram nesta sexta-feira (16) em Istambul uma oração fúnebre em homenagem ao jornalista saudita a Jamal Khashoggi, no mesmo dia em que a imprensa turca revelou que os investigadores têm mais provas que desacreditam a versão do assassinato dada pela Arábia Saudita.

Uma fonte da presidência turca afirmou nesta sexta à noite que o presidente Recep Tayyip Erdogan e seu homólogo americano, Donald Trump, mantiveram uma conversa por telefone na qual “acordaram que devem esclarecer totalmente o assassinato de Jamal Khashoggi e que qualquer encobrimento do incidente não deve ser permitido”.

Um mês e meio depois de seu assassinato, que causou uma verdadeira comoção no mundo, o corpo de Khasshoggi – um jornalista crítico ao poder saudita e colaborador do Washington Post – continua desaparecido.

Ante um espaço vazio, tradicionalmente reservado para um caixão em frente à mesquita Fatih, os amigos de Jamal Khashoggi fizeram uma oração pelo ausente, um ritual do Islã para os mortos cujos corpos foram destruídos ou não foram encontrados.

Khashoggi, jornalista também crítico com o príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman, foi assassinado em 2 de outubro no consulado saudita em Istambul. Seu corpo foi esquartejado e não conseguiram localizá-lo desde então.

“Como estamos convencidos de que o corpo nunca será encontrado, decidimos organizar essa oração pela salvação da alma de Jamal”, explicou à AFP Fatih Öke, diretor da Associação de Mídia Árabe Turca (TAM), da qual o jornalista era membro.

A cerimônia, que foi realizada sob chuva na esplanada da mesquitA Fatih, “é também uma mensagem enviada ao mundo para dizer que o homicídio não ficará impune. A justiça será feita”, declarou Ibrahim Pekder, morador de Istambul que assistiu a homenagem.

A homenagem a Khashoggi foi feita em um ambiente de ceticismo na Turquia devido à última versão dada na quinta-feira pela Justiça saudita sobre o assassinato do jornalista.

A Procuradoria saudita anunciou na quinta-feira que pedia a pena de morte para cinco dos acusados e exonerou o príncipe herdeiro, tido pela imprensa russa como ligado ao assassinato.

Segundo o procurador saudita, que no total acusou 11 pessoas, uma equipe foi enviada a Istambul para levar o jornalista de volta a Riad, de forma voluntária ou à força, mas seu chefe tomou a decisão de assassiná-lo sem consultar seus superiores.

– ‘Segunda gravação de áudio’ –

A Turquia já expressou suas dúvidas sobre essa versão.

Nesta sexta, um jornal turco indicou que existem provas, em particular uma gravação de áudio, que contradizem essa versão.

O influente jornalista Abdulkadir Selvi, próximo ao governo turco, afirma no jornal Hürriyet que uma gravação de áudio, que está nas mãos das autoridades turcas, demonstra que em nenhum momento tentaram negociar com Khashoggi para convencê-lo a voltar à Arábia.

Segundo ele, o jornalista não foi drogado, mas o estrangularam ou asfixiaram “com uma corda ou uma sacola de plástico”.

Ainda de acordo com Selvi, os serviços de segurança turcos também têm uma segunda gravação de áudio de 15 minutos feita antes do assassinato que não deixa dúvidas sobre o caráter deliberado do crime.

Nesta gravação “é possível ouvir a equipe saudita falando sobre como vão matar Khashoggi, revisando o plano com antecedência e lembrando a cada um dos membros o papel” que devem desempenhar, assinalou Selvi.

A versão saudita foi descartada nesta sexta por Yasin Aktay, um amigo de Khashoggi e conselheiro do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan.

“Querem nos fazer acreditar que os assassinos tomaram sozinhos a decisão de matar Jamal Khashoggi. Não acreditamos nessa história”, lançou. “Continuaremos perguntando quem são, realmente, (as pessoas) que deram a ordem”.

– Khashoggi ‘mártir’, MBS ‘assassino’ –

Os cartazes exibidos pelos amigos de Khashoggi diante da mesquita não deixam dúvidas sobre suas suspeitas, com a palavra “mártir” sob o rosto do jornalista, e a inscrição “assassino” sob a do príncipe herdeiro Mohamed bin Salman, conhecido como “MBS”.

O presidente turco Recep Tayyip Erdogan afirmou em diversas ocasiões que a ordem para matar Khashoggi veio do “mais elevado nível do Estado” saudita. E descartou a responsabilidade do rei Salman, enquanto a imprensa e autoridades turcas, sob anonimato, acusam o príncipe herdeiro, seu filho.

A administração Trump, que tentou, em princípio, ser indulgente com seu aliado saudita, acabou endurecendo a sua posição, assim como outros países ocidentais com estreitas relações com o reino.

Na quinta-feira, os Estados Unidos anunciaram sanções econômicas a 17 responsáveis sauditas envolvidas, segundo Washington, no assassinato de Khashoggi.