ONGs alertaram neste sábado para uma possível catástrofe humanitária na Síria, depois que Rússia e China vetaram um projeto de resolução da ONU para prorrogar por um ano a ajuda humanitária transfronteiriça das Nações Unidas a milhões de pessoas naquele país.

A ajuda beneficia principalmente habitantes de regiões que, em parte, não estão sob o controle de Damasco, principalmente na província de Idlib, onde 12 civis morreram hoje em bombardeios do regime e de sua aliada, Rússia, segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH).

Neste sábado, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, considerou “vergonhoso” que Rússia e China tenha vetado o projeto ontem.

“Têm sangue nas mãos”, apontou Pompeo.

Ambos os países “preferiram apoiar seu sócio Damasco, pondo em perigo a vida de milhões de civis inocentes no pior momento do inverno e ameaçando ainda mais os civis, ao respaldar a contínua ofensiva militar do regime de (Bashar al) Assad e da Rússia contra Idlib”, uma província do noroeste do país, acrescentou o secretário americano.

Pompeo insistiu em que “não há alternativa às entregas transfronteiriças da ONU, nem soluções distintas viáveis para alimentar milhões de sírios até que o regime sírio ponha fim à guerra contra seu povo”.

Os bombardeios se intensificaram desde o último dia 16 no sul de Idlib, obrigando dezenas de milhares de pessoas a deixar seus lares, segundo a ONU.

A ajuda humanitária, procedente de Jordânia, Iraque e Turquia, chega à Síria através de pontos de passagem designados pela ONU sem autorização oficial do regime sírio, mas a missão concedida à ONU expira em 10 de janeiro.

“As famílias necessitadas, muitas delas tendo sido obrigadas a fugir várias vezes durante a crise, dependem da ajuda oferecida pelas operações da ONU”, assinalou hoje a ONG Oxfam. “Não há nenhuma forma realista de chegar a centenas de milhares destas famílias” a partir do interior da Síria.

– ‘Única forma’ –

Idlib, controlada pelos jihadistas do Hayat Tahrir al-Sham (HTS), ex-braço sírio da Al-Qaeda, abriga mais de 3 milhões de pessoas, sendo que a maioria foi deslocada para outras partes do país reconquistadas por Damasco.

Para o regime, que controla agora mais de 70% do território, segundo o OSDH, a reconquista de Idlib é chave para encerrar a guerra, iniciada em 2011. Levando em conta a violência persistente e os deslocamentos, a ajuda humanitária continua sendo indispensável, estimam ONGs.

“Enquanto Estados-membros da ONU se acusam mutuamente, em vez de renovar a ajuda necessária para as crianças sírias, centenas de milhares de pessoas em Idlib sofrem bombardeios intensos”, lamentou Carolyn Miles, da Save the Children. O mecanismo de ajuda em vigor “é a única forma de alcançar um grande número destas crianças”, insistiu.

Apesar do cessar-fogo anunciado por Moscou no fim de agosto, mais de 280 civis e centenas de combatentes dos dois lados morreram desde então em bombardeios e combates em terra, segundo o Observatório.

– ‘A era da impunidade’ –

“O fim do envio transfronteiriço significa que grupos de ajuda locais apoiados pela ONU terão que interromper suas operações”, advertiu Maamun Kharbut, da organização local Violet. “Isto irá paralisar o esforço humanitário no norte da Síria.”

Cerca de 4 milhões de sírios se beneficiam da ajuda humanitária transfronteiriça, embora um total de 11 milhões continuem recebendo apoio internacional. “É a nova era da impunidade. Os combates continuam, mas a ajuda está em ponto morto”, lamentou ontem David Miliband, do Comitê Internacional de Resgate.

Mais de 370 mil pessoas morreram desde o início da guerra na Síria, e milhões foram deslocadas.