A decisão do banco BTG Pactual de sacramentar o nome de André Esteves para a presidência do Conselho de Administração, anunciada no dia 29 de abril, tem importância mais formal do que prática. Esteves já havia sido autorizado a retornar formalmente ao grupo de controle do banco no fim do ano passado. E quem conhece os meandros dos últimos andares do edifício de número 3.477 da Avenida Brigadeiro Faria Lima, coração do mercado de capitais brasileiro, sabe que a decisão do fim de abril está longe de ser um retorno. Superado o trauma de sua prisão, em 25 de novembro de 2015, Esteves retornou sua rotina de jornadas intensas e foco total nos negócios. Em setembro de 2018, foi inocentado a pedido do próprio Ministério Público Federal.

Se o retorno de Esteves não é exatamente uma novidade, nesses pouco mais de seis anos muita coisa mudou naquele endereço da Faria Lima. A instituição que ele deixou em novembro estava se tornando, em suas próprias palavras, “o único banco de investimentos que investe”. Ou seja, além das atividades tradicionais, o BTG Pactual estava investindo os próprios recursos na chamada economia real. Os resultado foram irregulares. Houve casos de sucesso como a empresa de gestão de estacionamentos Estapar, e derrapadas como a da rede de farmácia BR Pharma. Sem falar na controversa operação da Sete Brasil, companhia que nasceu para produzir sete plataformas de petróleo para explorar as riquezas do pré-sal e que terminou como uma enorme dor de cabeça para todos os envolvidos.

Boa parte dessa guinada estratégica vinha sendo capitaneada por Esteves. Seu afastamento do banco levou a uma volta às origens. Em uma entrevista à DINHEIRO em meados de 2019, o presidente Roberto Sallouti comemorava o fato de o BTG Pactual ter sido premiado na edição daquele ano de AS MELHORES DA DINHEIRO. E disse que a premiação tinha um sabor especial. Além de indicar que o BTG havia superado os arranhões em sua imagem, o prêmio comprovava o acerto de uma estratégia “tradicionalista”. O banco tinha obtido resultados excepcionais fazendo o que sempre fez bem desde sua fundação, em 1984. A saber, gerir fundos, captar recursos no mercado de capitais e ganhar dinheiro com o trabalho de sua tesouraria, reconhecida como uma das melhores do ramo.

Os resultados dos últimos dois anos comprovam o acerto dessa estratégia. Em 2021, o BTG Pactual divulgou um lucro líquido de R$ 6,34 bilhões, alta de quase 60% em relação ao 2020 (observe o quadro). As receitas cresceram 67% e o total de ativos avançou quase 40% no ano passado. E os resultados do primeiro trimestre, cuja divulgação está prevista para o dia 9 de maio, deverão mais uma vez mostrar bons números. Com isso, o valor de mercado da instituição tem subido de maneira consistente. No fim de abril, a capitalização do BTG Pactual estava alinhada com a do Santander Brasil e superava bastante a do Banco do Brasil. A importância do BTG pode ser comprovada pelo Banco Central. Há apenas seis instituições financeiras no País classificadas como S1, que significa serem capazes de provocar riscos sistêmicos em caso de quebra. São elas os cinco gigantes do varejo e o banco de Esteves, no qual ele não esconde ter trabalhado 12 horas por dias nos últimos anos.

TRADIÇÃO O BTG segue com as atividades nas quais de destacou: tesouraria, gestão de recursos e banco de investimentos. (Crédito:Claudio Gatti )

RUMO AO VAREJO A única alteração relevante na estratégia nos últimos tempos foi uma inserção cautelosa e, até agora, bem-sucedida, no varejo. Cliente pessoa física era um anátema no banco desde meados da década de 1990, quando o fundador do então Pactual, Luiz Cezar Fernandes, tentou comprar o Banco BCN. A ideia de assumir uma rede de agências e alguns milhares de bancários era tudo o que a cultura da casa repelia. Porém, há cerca de cinco anos, o BTG começou a distribuir seus produtos para investidores pessoa física de alta renda, por meio da plataforma BTG Pactual digital. No ano passado, essa estratégia se acelerou. O banco investiu na compra de empresas de tecnologia e também de conteúdo editorial voltado para investidores, como a plataforma Empiricus e a revista Exame, adquirida da Editora Abril, em recuperação judicial.

A mudança na estratégia se deve à tecnologia. Sem a necessidade de uma estrutura física pesada o banco ganhou posições entre os gestores de recursos, com mais de R$ 1 trilhão em ativos sob administração.Além disso, o BTG aplicou uma estratégia semelhante em uma instituição financeira que nasceu no extremo oposto de sua área de atuação, o banco Pan. Criado como PanAmericano, pertencia ao apresentador Sílvio Santos e esteve envolvido em uma das maiores fraudes do sistema financeiro. Seus administradores se aproveitaram do fato de a carteira de crédito ser muito pulverizada, sem controles do Banco Central, e orquestraram um esquema em que vendiam os mesmos empréstimos várias vezes. A solução passou por uma controversa injeção de recursos da Caixa Econômica Federal e, ao fim do processo, o banco de Sílvio Santos, rebatizado de Pan, tornou-se uma controlada do BTG. Atualmente, o Pan serve como uma plataforma de distribuição de produtos financeiros para clientes de baixa renda.

Ao longo dos últimos dois anos, os investidores no Brasil e no exterior passaram a preferir as instituições financeiras digitais aos bancos “tradicionais”. A ideia era que, livres dos custos físicos e dos sistemas pesados, os ‘’neobancos” poderiam ser mais ágeis e lucrativos. Prova disso é a valorização do Nubank. Ao abrir capital, no fim de 2021, o banco valia mais do que o Itaú Unibanco. Agora, sua capitalização de mercado é quase R$ 80 bilhões menor. Em um ambiente de juros mais altos e liquidez mais apertada, os bancos terão de lidar com problemas de economia em retração, como o aumento da inadimplência.

Em uma apresentação no Milken Institute, em Los Angeles, na segunda-feira (2), Esteves disse que os investidores devem se preparar para “mais emoções”. Segundo ele, o capital barato e abundante levou a um excesso de otimismo na avaliação de modelos de negócios e nas perspectivas de crescimento das empresas. Com juros subindo no mundo, será preciso um ajuste. “Quando o custo de capital é zero, o tamanhos dos sonhos tende ao infinito”, disse Esteves. “Agora os sonhos estão voltando à Terra”. Segundo ele, o fato de o BTG Pactual ser “uma fintech que paga dividendos” fará toda a diferença nesse cenário.