A autonomia e a governança das estatais brasileiras ainda precisarão dar passos importantes para que o País consiga estar por dentro de todas práticas recomendadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na qual o Brasil deseja ingressar. Em evento de lançamento oficial do relatório da OCDE sobre a governança das estatais do País, o analista da organização Caio Oliveira sinalizou a necessidade de mudanças no formato de indicações para cargos nessas empresas, tópico que está no ‘olho do furacão’ do episódio de ingerência do presidente Jair Bolsonaro na Petrobras.

Ao falar sobre as recomendações do relatório da OCDE, Oliveira afirmou que uma das medidas “especialmente importantes” para o caso brasileiro é que o conselho de administração das estatais seja o único com poder de destituir ou nomear um presidente de estatal. O analista destacou que não deve ser prerrogativa de ministros ou chefes de governo “escolher ou destituir” o comandante dessas empresas.

O caso da Petrobras é exemplo do que ocorre atualmente. O governo, como acionista majoritário, indicou o nome do general Joaquim Silva e Luna para presidir a petroleira e substituir Roberto Castello Branco. O conselho de administração da Petrobras ainda precisa aprovar a indicação, e tem poder de barrá-la. O governo, porém, tem maioria no colegiado de 11 membros.

O analista da OCDE observou que o conselho de administração pode, como acontece também no setor privado, escutar a opinião do acionista controlador sobre quem deve ser o presidente da estatal, mas deve ter sua autonomia preservada. “O Conselho de administração não deixa de ser um filtro contra indicações políticas ou não técnicas para cargo de presidente. Claro que conselho, como acontece com companhias privadas, pode e muitas vezes escuta acionista controlador sobre sua opinião de quem deve ser o presidente, mas a decisão final deve ser do conselho de administração”, disse.

A falta de autonomia de um conselho, na visão da OCDE, pode custar a autoridade desse órgão. “Conselho que não pode escolher um presidente, não tem autoridade alguma para supervisioná-lo, porque se ele sabe que o conselho não pode destituí-lo, ele não vai escutar o que o conselho tem a dizer e decidir”, disse Oliveira. “As estatais podem sim ter objetivos que não só o lucro, mas esses objetivos devem ser definidos de forma transparente, e se administração central intervier a todo momento nas atividades das estatais simplesmente não é possível que essas companhias sejam eficientes e mesmo que atinjam seus objetivos de políticas públicas”, afirmou.

Além disso, o analista da OCDE citou que o processo de escolha dos conselheiros de administração ainda pode ser “bastante melhorado” no Brasil, mesmo com a evolução trazida pela Lei das Estatais (2016). Ele pontuou que, fora as vedações legais, o ministro supervisor do ministério tem “liberdade de decidir” que vai querer nomear para o conselho. Oliveira observou que, embora existam profissionais qualificados nesses órgãos, a organização identificou uma ausência de conselheiros especializados em contabilidade e auditoria ou com experiência internacional.

Por isso, a OCDE recomendou que para preencher esses cargos o governo use firmas de headhunting, ou até mesmo opte por estabelecer um pool de candidatos qualificados, com base num processo transparente e competitivo. Nesse caso, a escolha final poderia até vir da liderança política, mas ela ficaria restrita a essa lista prévia.