Se a corrida eleitoral nos Estados pudesse ser resumida em uma palavra, a definição seria continuidade. A apuração das urnas nas disputas estaduais mostrou que o eleitor brasileiro está, em grande parte, satisfeito com seu governo e pouco disposto a arriscar o voto em um candidato que represente a ruptura. As urnas comprovaram esse fato raro, visto em 1986, quando o PMDB conseguiu eleger 21 dos 22 governadores do País, guindado pela popularidade do Plano Cruzado. No domingo 3, 13 dos 20 candidatos que içaram a bandeira da continuidade se elegeram já no primeiro turno. 

 

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Sem segundo turno: em quatro dos Estados mais importantes do País, a decisão foi tomada no domingo 3. Em São Paulo, Geraldo Alckmin

passou com pouco mais de 50% dos votos; na Bahia,Jaques Wagner foi reeleito, assim como Sérgio Cabral, no Rio de Janeiro.

 

Em outros cinco Estados (Alagoas, Pará, Paraíba, Piauí e Rondônia), os atuais governadores tentarão se reeleger no segundo turno, em 31 de outubro. O Brasil chegou à eleição engrenado num círculo virtuoso de crescimento, emprego e renda. Esse teorema tem propiciado a ascensão de uma nova classe média que vai às compras como nunca, tem acesso a crédito farto e barato e começa a realizar o sonho da casa própria. Em ano de eleição, não há capital político maior de que a sensação de bem-estar da população.

 

Em nenhum lugar do Brasil esse discurso é mais verdadeiro do que no Nordeste, região que cresce a taxas chinesas e onde estão os maiores beneficiados pelos programas do governo federal, como o Bolsa Família. Todos os nove governadores buscaram se reeleger surfando na popularidade de Lula – inclusive o tucano Teotônio Vilela, de Alagoas. 

 

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À exceção do Rio Grande do Norte, onde Rosalba Ciarlini, do DEM, governará o único enclave da oposição na região, prevaleceram os candidatos de Lula. “A principal política pública do governo é o acesso ao crédito”, analisa o cientista político Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília. 

 

Os resultados dessa política estão nos números. Enquanto o Brasil cresceu 8,9% no primeiro semestre, Pernambuco e Bahia cresceram 9,9% e 10,4%, respectivamente. O petista Jaques Wagner pode creditar a sua reeleição ao governo baiano a números como a criação de empregos formais, com 231 mil postos de trabalho desde 2007. 

 

O pernambucano Eduardo Campos, o mais votado do País, deve seu desempenho aos mais de R$ 20 bilhões em investimentos atraídos nos últimos quatro anos, que dinamizaram a economia local e o transformaram num campeão de aprovação. Os governadores do Nordeste se beneficiaram também do fato de a região ter se tornado um atraente polo de investimentos. O Ceará atraiu R$ 5 bilhões em recursos estrangeiros para erguer luxuosos resorts em sua costa paradisíaca e gastou R$ 100 milhões em infraestrutura para melhorar o acesso aos empreendimentos. 

 

 

Tudo isso se reverteu em empregos para o eleitor cearense e votos para o reeleito Cid Gomes. O mesmo vale para o Rio de Janeiro. Uma injeção de R$ 118 bilhões em recursos do PAC e a preparação das obras para a Olimpíada de 2016 contribuíram para a tranquila reeleição de Sérgio Cabral. 

 

No Espírito Santo, a promessa de continuidade de elevação dos investimentos, o enxugamento dos gastos e a defesa dos royalties do pré-sal transformaram a larga aprovação do governador Paulo Hartung, que não era candidato, em 82% dos votos capixabas para o senador Renato Casagrande, apoiado por ele e o segundo mais votado do País. 

 

Roseana Sarney se beneficiou do empenho pessoal de Lula e seu Bolsa Família, que alimenta 873 mil famílias no Estado, e do anúncio da construção de uma refinaria da Petrobras no Estado. Nos Estados menos dependentes dos recursos do governo federal, ocorreu um fenômeno diverso. A percepção de bem-estar deveu-se mais ao dinamismo da iniciativa privada e às engrenagens regionais da economia do que a pujança da economia nacional como um todo. 

 

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Nos Estados onde há uma ampla participação da classe média na população, a desvalorização do câmbio é outro fator que acentua a percepção de alta no poder aquisitivo. “O número de pessoas viajando para o Exterior é impressionante”, exemplifica Robson Gonçalves, economista da Fundação Getulio Vargas. 

 

É nesse cenário que se elegeram Beto Richa, no Paraná, e Geraldo Alckmin, em São Paulo. Sua vitória foi efusivamente comemorada em seu bairro, o Morumbi, onde moradores de prédios da classe alta soltaram fogos e tocaram buzinas. Alckmin colhe os louros da recente inauguração do Rodoanel, da expansão recorde do metrô de São Paulo e do sucesso do programa Nota Fiscal Paulista, que turbinou a arrecadação do Estado em R$ 1,5 bilhão ao mesmo tempo que devolveu parte do ICMS aos contribuintes.

 

Apesar de todo o empenho da máquina federal, a oposição impôs outras baixas importantes nos planos de Lula de eleger uma ampla base de governadores. O caso mais relevante foi a derrota acachapante de Hélio Costa – candidato imposto em nome da aliança nacional com o PMDB – para o tucano Antonio Anastasia. 

 

Sem o apoio de Lula, apesar do discurso governista, Omar Aziz se reelegeu ao governo do Amazonas a reboque da expansão notável da Zona Franca de Manaus, cujo crescimento resultou na criação de empregos, quadruplicou a arrecadação estadual e deve gerar US$ 16 bilhões em receitas este ano. 

 

O bom momento no agronegócio brasileiro, puxado pela elevada demanda pelas commodities agrícolas brasileiras, ajudou a reeleger André Puccinelli, em Mato Grosso do Sul, e Silval Barbosa, em Mato Grosso. Crises políticas também se mostraram capazes de sepultar candidaturas à reeleição. 

 

No Tocantins, Carlos Gaguim sucumbiu para o ex-governador Siqueira Campos. E a governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, amargou um terceiro lugar – o petista Tarso Genro se elegeu no primeiro turno –, mesmo depois de sanear as combalidas contas do Estado. “A Yeda tentou ajustar a casa, mas não teve habilidade política para lidar com uma oposição articulada”, analisa Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.

 

Colaborou Márcio Kroehn