25/06/2021 - 11:31
País em que o consumo de vinhos mais cresceu em 2020 (18% sobre o ano anterior, segundo a OIV, Organização Internacional da Vinha e do Vinho), o Brasil está provando novas maneiras de negociar a bebida. A principal delas é o marketplace espacializado. Semelhante ao modelo adotado por varejistas on-line como Amazon, Americanas e Mercado Livre, ele também se baseia na oferta de produtos cuja venda — e, em muitos casos, também a entrega — é de responsabilidade de vendedores parceiros (ou sellers), cabendo à plataforma a transação financeira. A diferença, no caso do vinho, é que os marketplaces especializados buscam agregar valor naquilo que mais interessa a quem vai comprar: conteúdo e curadoria.
Ter expertise suficiente nesse mercado a ponto de validar boas compras para o consumidor final e ainda melhorar a performance de vendas dos produtores e importadores é o que tem atraído mais interessados nesse modelo de negócio. Eles vão de startups com poucos funcionários a gigantes como o Grupo Pão de Açúcar (GPA), rede supermercadista com 185 lojas físicas espalhadas pelo País e um e-commerce que no ano passado vendeu 4 milhões de garrafas de vinho (250% acima de 2019), gerando uma receita de R$ 140 milhões apenas com itens dessa categoria. Para o diretor de e-commerce do GPA, Rodrigo Pimentel, o marketplace é estratégico para alcançar a meta do grupo no segmento: “Queremos de fato ser o maior portal de vinhos da internet brasileira”, afirmou Pimentel à DINHEIRO. Com seu marketplace de vinhos, que hoje abriga 48 sellers, o portifólio que era de 1,5 mil rótulos passou a 5 mil (confira os números à página 42). “Esse modelo nos permite acessar marcas antes não disponíveis para o GPA. Queremos apoiar pequenos produtores e importadores”, disse.
Na semana passada, o Inner Group, do empresário Christian Burgos, lançou a Seleção Adega, marketplace com 1,2 mil rótulos. À frente de um ecossistema que impacta mensalmente um público de 780 mil apreciadores de vinho por meio de publicações especializadas (entre elas a edição brasileira do Guia Descochados), clube de asssinatura, site, podcasts, a feira ProWein e outros eventos, Burgos conseguiu reunir na mesma vitrine Mistral e World Wine, duas das mais respeitadas importadoras do País. “Eu vejo que alguns players estão trabalhando muito bem a frente de popularizar o consumo de vinho no Brasil”, afirmou. “Nosso posicionamento é outro: disseminar a cultura do vinho, reconhecendo que o limite de cada consumidor é a sua capacidade econômica. Queremos servir a todos os públicos em uma relação de completa transparência”.
Na Seleção Adega os rótulos partem da faixa de R$ 50 e chegam até ícones como Mouton Rotshchild. Todos têm em comum o fato de serem pontuados por críticos influentes, como Robert Parker, Jancis Robinson, Wine Spectator e a revista Decanter. “Todos os sellers que estão no nosso marketplace só podem subir vinhos que tenham recebido alguma avaliação. Dessa forma, o consumidor consegue ter de cara uma indicação de qualidade intrínseca daquela garrafa”, disse.
PROCEDÊNCIA Pioneira na venda de vinhos pela internet no Brasil com um e-commerce criado em 1999, a Mistral aderiu à Seleção Adega por entender que a parceria pode agregar valor à cadeia e fazer com que seus rótulos cheguem a um público mais amplo. “Mais importante, porém, é a visão do negócio, com curadoria de qualidade, respeito ao produtor e ao consumidor, o que casa com a nossa proposta”, disse Otavio Lilla, diretor-executivo da Mistral. Para ele, o fato de dividir o mesmo espaço com a concorrência não é um problema. “Isso já ocorre em outros canais de venda, como lojas, restaurantes e na própria internet. A competição é saudável para o mercado e não tira nossas vendas”. Outro fator que Lilla considera importante é a garantia de procedência das garrafas — algo que nem sempre ocorre em markeplaces não especializados.
Autodenominado o primeiro da categoria no País, o Sonoma Market foi criado pelo californiano Alykhan Karim a partir de uma plataforma de e-commerce que teve altos e baixos até fechar, em 2016. Como marketplace, o Sonoma oferece mais que apenas vinhos. “Queremos nos posicionar como um mercado premium de gastronomia no meio digital”, disse. Ele aposta na variedade de itens — queijos artesanais, azeites e trufas — e na agilidade da entrega para que o negócio cresça em seu novo formato. Na Grande São Paulo, os pedidos podem chegar em até 90 minutos. Dependendo da região, em uma hora. “Isso é possível hoje graças à logística de empresas como Uber Eats e iFood”, afirmou. Segundo ele, essa comodidade atende a uma seleta base de clientes. “Isso agrega valor para os sellers e para os buyers”.
CAPACITAÇÃO Se o marketplace é bom para quem vende, para quem compra e para quem os conecta, então ele é o futuro do negócio de vinho, certo? Sim. Mas não o único. Depois de trabalhar na plataforma Wine, a empresária Carol Montenegro decidiu montar um novo negócio usando o método já consagrado por fabricantes de produtos de beleza como Natura e Mary Kay: a venda consultiva. “A Soma nasceu com o propósito de ajudar o embaixador a viver da sua paixão pelo mundo do vinho”, afirmou Carol. “Embaixador”, nesse caso, é quem integra a base da equipe de 2 mil vendedores. Acima deles estão os líderes. “As pessoas têm muita dificuldade para escolher vinhos. O embaixador pode recomendar os rótulos certos para seus conhecidos”, disse. Cada venda feita na plataforma — a maioria por WhatsApp — gera uma comissão entre 8% e 10%. O líder ganha de 2% a 4%. Para capacitar essa turma que adora vinho mas ainda tem muito a aprender sobre o assunto, Carol criou uma universidade. Pelo valor simbólico de R$ 49,90 mensais é possível acessar todos os treinamentos on-line a ir às confrarias de degustação. Bons vendedores podem ser premiados com jantares harmonizados, adegas cheias ou viagens. Esse sim parece ser o futuro do negócio de vinhos.