A crise fiscal acentuou um dos principais obstáculos do País na busca para aumentar a sua competitividade e a sua capacidade de gerar riquezas. O volume de investimentos em infraestrutura encolheu a um nível insuficiente para garantir até a manutenção de projetos existentes. O quadro só será alterado com uma participação mais ampla da iniciativa privada, que depende de maior clareza das regras para acelerar investimentos. Em debate promovido por DINHEIRO na terça-feira 8, disponível no canal da revista no Youtube, especialistas listaram medidas que podem contribuir para melhorar a segurança jurídica na área e garantir a execução mais eficiente de obras como rodovias, portos e ferrovias. Os benefícios são calculados em até R$ 200 bilhões ao ano.

O principal consenso entre os participantes é sobre a necessidade de se aprimorar a capacidade de planejamento do Estado para reduzir a influência dos ciclos eleitorais. O interesse de governantes em usar as obras com fins políticos atrapalha o rito necessário de estudos e de avaliações que evitarão problemas na fase de construção. “Investimento em infraestrutura é de longo prazo”, afirma o secretário Especial do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), Adalberto Santos de Vasconcelos. “Parte da solução passa por uma continuidade administrativa, um planejamento de Estado.” Um plano de logística foi finalizado recentemente pelo governo federal, para identificar os investimentos necessários ao volume estimado de cargas até 2025. O documento, que está em consulta pública, é uma tentativa de aprimorar o planejamento da infraestrutura no longo prazo, a exemplo do que acontece hoje no setor elétrico, apontado como referência pelos especialistas. A expectativa é obter uma redução de até R$ 55 bilhões ao ano no custo do frete.

Se o planejamento pode contribuir para uma carteira de bons projetos, na relação do Estado com investidores privados há a necessidade de aprimorar os contratos de prestação de serviço, para evitar que os riscos não mapeados ou mal calculados tragam custos extras. Para os especialistas, é preciso melhorar a divisão dos riscos entre o governo e o prestador de serviços e garantir flexibilidade para resolver problemas nos contratos, que costumam durar 30 anos ou mais. “Não é possível colocar todos os riscos sobre o setor privado”, afirma César Borges, presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR). “O governo faz um edital para atrair o privado e depois ele que se vire? Não é assim, a realidade se impõe aos contratos.” Problemas nas rodadas recentes de leilões geraram casos de concessionários com dificuldades e interessados em sair dos projetos, como o do aeroporto de Viracopos, em que o grupo entrou com pedido de recuperação judicial (saiba mais aqui).

Regras mais claras podem evitar que esses casos se repitam no futuro e garantir custos menores nas concessões. A frustração na demanda observada em Viracopos poderia, por exemplo, ter sido atenuada com a inclusão de um instrumento para limitar o impacto de mudanças abruptas, tanto no caso de grandes perdas ou de ganhos muito elevados. Entre os temas que mais causam atritos, o licenciamento ambiental e as desapropriações são citados como itens mais comuns no rol de incertezas e de atraso dos projetos. Para o pesquisador da FGV, Armando Castelar, os impasses afetam o retorno previsto e minam o apetite de investidores. “Estamos reduzindo por conta própria a rentabilidade.”

Outro fator apontado como fonte de insegurança é a inflexibilidade de órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU). “Há um monte de pessoas responsáveis pelo meio e ninguém pelo fim”, diz José Carlos Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), em referência ao impacto das auditorias no prazo de conclusão dos projetos. Um estudo da entidade estima em 1% do PIB as perdas com as obras paralisadas. A expectativa é de que uma lei recém-aprovada sobre segurança jurídica avance nesse quesito.

Pelo texto, a avaliação de paralisar uma obra suspeita de irregularidade deverá considerar o custo total de interrupção. “É um passo imenso para um ambiente mais saudável na interface com o poder público”, diz Evaristo Pinheiro, presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon). Ao garantir que o custo da defesa do funcionário público será coberto pelo Estado em eventuais investigações, a lei deve contribuir para acabar com o que ficou conhecido como “apagão das canetas”, em que servidores evitam tomar decisões por medo de punições futuras. Será menos uma trava no caminho para tirar o Brasil, nona maior economia global, da distante 73ª posição no ranking de infraestrutura do Fórum Econômico Mundial.