Para crescer no País, a empresa americana de pagamentos teve de mudar forma de atuar. Além de se associar ao Bradesco, ao Santander e a outros parceiros, está adotando soluções desenvolvidas fora de casa e prepara o lançamento de marketplaces para processar transações financeiras de seus clientes.

Formada em administração com especialização em marketing, a argentina Carolina Lamiaux, presidente da subsidiária da American Express no Brasil, tem muito trabalho pela frente. Para os clientes brasileiros, os cartões da American Express — Amex, para encurtar — foram mais um sinal de status do que uma ferramenta de consumo. A empresa fazia tudo sozinha: emitia os cartões, cadastrava os estabelecimentos em sua rede de adquirência (as maquininhas) e processava os pagamentos. Com isso, os cartões Amex sempre tiveram uma participação limitada no mercado. Nos últimos dois anos a meta da empresa foi crescer. Para isso, teve de enfrentar mudanças. Uma delas foi se associar com as demais empresas de processamento de pagamentos. Outra, buscar parcerias com bancos brasileiros e avaliar as soluções desenvolvidas por fintechs. Entre elas, a criação de marketplaces para gerir os pagamentos realizados pelas empresas clientes a seus fornecedores. Tudo isso representou uma ruptura na maneira de trabalhar por aqui. De­­safio para Ca­­rolina. Diri­gindo a Amex Brasil há 11 meses e morando no País desde o início de 2022, ela se surpreendeu com a diversidade brasileira. No mercado e no condomínio em que mora com a família. “Meus parceiros de tênis são de sete nacionalidades diferentes”, afirmou.

DINHEIRO — Durante muito tempo, a Amex no Brasil ficou restrita a nichos como o segmento corporativo e os clientes de alta renda. Isso limitou o crescimento da bandeira. O que mudou nessa estratégia?
CAROLINA LAMIAUX — Estamos com uma estratégia nova, voltada para o crescimento. Nosso posicionamento global é focado nos segmentos premium e empresarial. Além dos cartões de crédito, nossas atividades mais tradicionais são oferecer para as empresas soluções para o que chamamos de “Travel & Entertainment”, ou Viagens e Entrete­nimento. Sempre fomos fortes no segmento corporativo, com a gestão dos custos das empresas, por exemplo. Agora, no Brasil, nós acreditamos ter muitas oportunidades de crescimento no segmento empresarial, algo além dos nichos em que atuamos tradicionalmente.

Qual a estratégia?
Estamos apostando em soluções de gestão de fluxo de caixa e de pagamentos para empresas, pequenas, médias e grandes. Além da gestão de viagens e entretenimento, buscamos expandir nossas atividades no segmento B2B. Oferecemos ferramentas para ajudar a empresa a gerir seus custos operacionais e os pagamentos a fornecedores, tanto diretos quanto indiretos. Nossa meta é trazer para o Brasil soluções que empregamos em outros países.

Qual o tamanho da empresa aqui?
Não revelamos esses dados. Em todo o mundo temos 114 milhões de cartões.

Como conseguir aumentar sua base de cartões no Brasil?
Estamos expandindo nossa rede de adquirência. Em 2006 fechamos uma parceria com o Bradesco. Com isso, nossa rede cresceu exponencialmente. Nos últimos dois anos ampliamos a aceitação de nossos cartões para adquirentes que capturam 98,3% do volume total de transações. São as líderes de mercado: Cielo, Rede e Getnet. Isso representa uma grande mudança em nossa estratégia, e permite aumentar a emissão de cartões. O Bradesco, por exemplo, é nosso principal parceiro nisso. Lançamos vários produtos em parceria com eles. E fechamos uma parceria semelhante com o Santander no início deste ano.

“Nos últimos dois anos expandimos a aceitação de nossos cartões para adquirentes que capturam 98,3% do volume total de transações” (Crédito:Istock)

Soluções como pagamentos e gestão de fluxo de caixa, por exemplo?
Exato. O que podemos oferecer para a empresa melhorar seu fluxo de caixa? Estamos trabalhando no desenvolvimento de uma plataforma que funciona como um marketplace fi­nanceiro. Já temos isso implementado em grandes corporações em ou­tros países, e es­tamos trazendo essa solução para cá. Ao facilitar a conciliação de pagamentos agregamos valor para o cliente.

Algum desses marketplajá funciona no Brasil?
Não, ainda estamos trabalhando no desenvolvimento dessas soluções para o mercado brasileiro.

Há alguma previsão de lançamento?
Vamos falar sobre isso depois.

Antes vocês insistiam em sistemas proprietários. Isso mudou?
Não interessa quem desenvolveu as ferramentas, desde que elas funcionem e façam diferença para o consumidor.

As fintechs não são concorrentes?
Não. A chegada das fintechs contribuiu para melhorar o sistema financeiro, pois proporcionou uma inclusão de mais clientes e um aumento da oferta de produtos e de serviços para os consumidores. Isso representa uma oportunidade para nós, não um desafio. Atuamos como bandeira emissora de cartões, como adquirente e como rede global de pagamentos. Tudo isso pode funcionar em parcerias com as fintechs. Além disso, temos muita experiência em identificar as necessidades do cliente ao longo de sua jornada.

O que a Amex está fazendo em parcerias com fintechs?
Em 2011 estabelecemos um veículo de investimentos, a Amex Ventures. sua missão é atuar como investidor estratégico em novas empresas, especialmente de tecnologia, que tenham sinergias com nosso negócio. Atualmente a Amex Ventures está focada em trabalhar com fintechs para melhorar a criação de valor para nossos clientes.

De que maneira?
Os investimentos mais frequentes são nos negócios de emissão de cartões e na criação de soluções de pagamentos. Por exemplo, a plataforma Corpex, que pode ser usa­da por empresas para a programação de viagens e a conciliação das despesas. Também temos muita experiência na prevenção de fraudes, que é uma preocupação crescente para as empresas e para os indivíduos.

Isso está ocorrendo no Brasil também?
Aqui ainda não temos nenhuma parceria desse tipo. Estamos estudando. Nosso foco é em soluções globais. Porém, uma coisa que me surpreendeu quando cheguei ao Brasil foi a diversidade e a profundidade do sistema financeiro. O sistema de fintechs no Brasil é diversificado e muito dinâmico.

A Amex tem uma percepção instantânea da demanda por viagens. Já é possível notar uma recuperação no volume depois da queda provocada pela pandemia?
Sim, felizmente. O segmento de viagens e entretenimento caiu muito com a pandemia. Felizmente, os negócios agora estão voltando à normalidade, e essa volta tem sido acelerada. Os dados globais da Amex referentes ao primeiro trimestre deste ano, que foram divulgados no fim de maio, mostram que o total de transações nesse segmento de viagens e entretenimento cresceu 42% em relação ao primeiro trimestre de 2021. O faturamento do segmento de viagens na empresa cresceu 107% no primeiro trimestre na comparação anual. Em março, os volumes totais foram maiores do que os de março de 2019, anteriormente à pandemia. Isso ocorreu no mundo todo e o Brasil não foi exceção.

“O segmento de viagens cresceu 107% no primeiro trimestre na comparação anual. Em março, os volumes totais foram maiores do que os de março de 2019” (Crédito:PHIL NIJHUIS /AFP)

E nas outras atividades além das viagens?
Os resultados também foram muito bons nos demais serviços corporativos. Notamos um crescimento de 30% no volume de transações e um aumento de 29% no faturamento no primeiro trimestre, sempre em comparação com o mesmo período do ano passado.

Você tem experiência internacional na Amex. Qual a diferença entre a estratégia da empresa no Brasil e a de outros países?
O Brasil é um país estratégico. É o principal vetor de crescimento na América Latina entre os países nos quais atuamos com nossa própria bandeira. Estou há 11 meses na Amex Brasil, mas morando aqui desde o início do ano. A primeira coisa que eu percebi é que a velocidade das coisas no Brasil é muito diferente da dos outros países da América Latina em que estive.

E como está sendo morar no Brasil?
Minha família é de origem francesa, mas eu sou argentina. Tenho uma carreira de 16 anos na American Express e já trabalhei em oito países da América Latina, entre eles Chi­le, Para­guai, Uruguai, Co­­lôm­bia, até Venezuela. Para nós vir para o Brasil representou uma mudança, pois minha família sempre ficou na Ar­­gen­tina e eu viajava. Agora, pela primeira vez nós nos mudamos todos. Está sendo uma experiência muito positiva.

Quais as impressões?
Em primeiro lugar a diversidade. Tenho dois filhos adolescentes, um casal de 15 e 13 anos. Hoje eles estudam em um colégio internacional. Metade dos alunos não é do Brasil. Moro em um condomínio e jogamos tênis. Meus parceiros no jogo são de sete nacionalidades diferentes. Isso representa uma oportunidade enorme de crescimento pessoal. Tanto que eu perguntei outro dia para os meus filhos se eles queriam voltar para a Argentina. Os dois disseram que não.