capa.jpg

O PIB do País bate marca histórica e deve crescer mais do que a inflação, pela primeira vez em 50 anos

 

Na semana passada, o governo brasileiro ainda vivia em clima de réveillon. De malas prontas para um giro de dez dias pela Ásia, por pouco o presidente Fernando Henrique não estourou o champanhe. Pela primeira vez desde que o real foi criado, o governo tinha o que comemorar. O Produto Interno Bruto do ano 2000 chegou à casa dos doze zeros, alcançando a marca espetacular de R$ 1,05 trilhão, como resultado de um crescimento da economia da ordem de 4%. E o deste ano promete não apenas manter o gigantismo, como, pela primeira vez em 50 anos, crescer acima da taxa de inflação. O IBGE, que deve divulgar oficialmente os números de 2000 em abril, já calcula para este ano um PIB aumentado em 4,5%, contra uma inflação de 4%. ?Há mais de meio século isso não acontece no Brasil, mas no biênio 2001-2002 vai acontecer?, disse o ministro da Fazenda, Pedro Malan, à DINHEIRO. De fato, desde o tempo em que o general Eurico Gaspar Dutra estava na Presidência, aproveitando os ventos desenvolvimentistas soprados pela industrialização promovida anteriormente por Getúlio Vargas, não se verificava o cruzamento da curva ascendente do PIB com a declinante da inflação. ?Isso significa que o País está começando uma fase de crescimento mais sustentável?, explica o chefe do Centro de Estatísticas e Análises Econômicas da Fundação Getúlio Vargas, Salomão Quadros.

 

29_capa4_din177.jpg

FHC comemora: doze zeros na produção é coisa de primeiro mundo

 

Em todo o País, os empresários que ajudaram o PIB a atingir a casa trilionária comemoram o feito anunciado. ?Nos últimos cinco anos, 2000 foi o nosso melhor ano?, diz João Bosco da Silva, presidente da Alcan, líder no setor de alumínios. ?Nosso volume de produção aumentou 20% em relação ao ano anterior e a receita, 25%.? A empresa teve um faturamento de R$ 1 bilhão. Outro gigante presente numa das bases da atividade industrial, a siderurgia, também colheu resultados espetaculares. ?O segmento metal-mecânico, um dos nossos principais mercados, teve um crescimento expressivo no ano passado?, lembra Frederico Gerdau, vice-presidente do Grupo Gerdau, acentuando que cresceu 54% em 2000, saltando de R$ 4 bilhões para R$ 6,2 bilhões. Para este ano, o grupo prevê uma expansão de até 7%, ultrapassando as primeiras perspectivas do novo PIB, que poderá ser 4,5% maior do que o do ano passado. ?Produtos nacionais como têxteis, calçados e veículos automotores estão retomando sua competitividade no exterior, um fator importante para explicar a elevação do PIB?, lembra Carlos Zignani, diretor da Marcopolo S/A, maior fabricante nacional de carrocerias de ônibus. Ano passado, a empresa fechou contratos de exportação de US$ 112,2 milhões, número 40,5% maior do que em 1999.

 

29_capa5_din177.jpg

 

?A recuperação econômica é consistente?, afirma Clarisse Meser, diretora titular do Departamento de Pesquisas Econômicas da Fiesp. ?O ano de 2001 já começa com indicadores bastante favoráveis, como a elevação de 11% da atividade industrial em comparação com janeiro de 2000 que, por sua vez, fora 10,4% maior do que o mesmo período do ano anterior?. Uma movimentação que vai sendo percebida pelo setor financeiro. ?Quando o PIB passa da casa dos R$ 900 bilhões para a do trilhão, num ambiente de moeda estável, é possível perceber nitidamente a expansão da economia?, diz o economista-chefe do Lloyds TSB no Brasil, Odair Abate. ?Com a inflação, essa melhoria era mais difícil de perceber.? Nas previsões dele, o PIB de 2001 deverá crescer, em dólar, 3%, levando-se em consideração uma desvalorização do real de 0,94% e o crescimento do PIB, em real, como prevê o governo, de 4%.

 

29_capa6_din177.jpg29_capa7_din177.jpg

Passado e futuro Malan e Fraga asseguram que a economia vai repetir façanha de Dutra

 

A maré de boas notícias levantada pelo show do trilhão é consistente. O aquecimento da produção industrial, por exemplo, teve como combustível a evolução das exportações e a expansão da demanda interna. As condições de crédito estiveram mais favoráveis e ocorreu ainda uma gradual recuperação do mercado de trabalho. Na decomposição do PIB, registrou-se o crescimento dos bens de capitais e de bens de consumo duráveis. O nível médio de utilização da indústria foi de 84,5% da capacidade instalada. Pesquisa da Abimaq identificou o uso mais intenso das instalações nas indústrias produtoras de bens de capital. A média elevou-se de 67%, em 1999, para 75,4% no ano passado. O aumento da produtividade no setor de agronegócios também pesou para tornar o PIB tão robusto, respondendo por mais de 30% do produto. Isto em um ano ruim em que os preços das commodities caíram. A safra de cana quebrou e o preço do café despencou. Para 2001, a previsão é de uma safra recorde de 90 milhões de toneladas. ?Devemos crescer entre 4 e 5% e agricultura deve contribuir para isso?, garante o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes.

Um show da ordem de um trilhão despertou entre os economistas o apetite para a polêmica. ?Nós tínhamos duas alternativas: a medíocre, que era crescer apenas 4 a 4,5%, e a mais ousada, que era de uma expansão em torno de 6 a 7%. Ficamos com a primeira opção?, lamenta o economista Antônio de Barros de Castro, ex-presidente do BNDES. ?Ainda é preciso tomar medidas para tornar o ambiente macroeconômico mais parecido com o mundo desenvolvido?, pondera o economista Raul Veloso. ?Não se cresce porque alguém decide a taxa de crescimento. O que se deseja é que a economia cresça de forma sustentada por muito anos. Queremos evitar o stop and go, o que gera problemas no balanço de pagamentos?, ensina Malan. A própria equipe econômica avalia que o momento é de um otimismo comedido. O governo não deseja repetir os erros do plano cruzado, quando a euforia enterrou a oportunidade de o País crescer de forma sustentada. Agora, apesar de ter feito o dever de casa, o Brasil depende do que acontece no cenário externo. O susto com a crise argentina já está no retrovisor, mas o risco de uma recessão nos Estados Unidos ainda é uma ameaça no pára-brisa. Prova disso foi o diálogo ocorrido na semana passada entre o presidente Fernando Henrique e Armínio Fraga:

? Vou passar dez dias fora e queria saber como anda a economia ? iniciou FHC.
? No Brasil está tudo bem. A Argentina também já está com a crise equacionada, mas o problema é o soft landing da economia americana ? explicou Fraga.
? E como será isso? ? perguntou o presidente
? Não será soft, mas será land, concluiu Fraga. O presidente deixa o País para a viagem a Ásia com a certeza de que a aterrissagem americana poderá não ser suave, mas por enquanto a turbulência não afetará o vôo da economia brasileira. Primeiro, o volume de exportações para os Estados Unidos representa apenas 23% do total das vendas para o exterior. Depois, porque o estoque de dinheiro captado no exterior está abastecido. Se resta alguma preocupação esta será discutida em Quebec, Canadá, durante encontro entre Fernando Henrique e o presidente eleito dos EUA, George W. Bush.