Para o executivo, quanto mais sofisticado for um mercado e quanto mais dinâmicas forem as relações econômicas, mais as pessoas vão precisar de proteção.

O mercado de seguros no Brasil vive em constante transformação. Produtos tradicionais, como automóveis, saúde, vida e capitalização, já há algum tempo dividem espaço com opções de proteção para pets, celulares e até contra riscos cibernéticos. Ano após ano, o consumidor brasileiro parece dar mais atenção aos perigos envolvidos nas mais diversas atividades e situações, como foi o caso da pandemia, que movimentou R$ 7 bilhões em indenizações. Diante do novo comportamento, a arrecadação do setor – excluindo saúde – cresceu. Chegou a R$ 294,6 bilhões no período entre janeiro e outubro deste ano, 17,9% maior na comparação com o mesmo período de 2021. Ao que tudo indica deverá superar o recorde de R$ 306,4 bilhões faturados no ano passado. Dyogo Oliveira, presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg), vive a expectativa de expansão do segmento ao mesmo tempo em que cobra melhor comunicação da indústria aos consumidores. “Existem países em que o tamanho do mercado segurador corresponde a 15% do PIB”, disse. “No Brasil, deveremos fechar este ano em 6,4%. Há espaço para avançarmos mais.”

DINHEIRO – Diante de tantas opções de seguro, como fazer para que a participação do brasileiro aumente?
DYOGO OLIVEIRA – Primeiro, comunicação. Fazer chegar à população a informação, o conhecimento de que existe, de que é acessível. Há uma visão errada de que o seguro é caro no Brasil. Não é. Existem produtos muito baratos, por R$ 5, R$ 10 ao mês. O seguro de uma residência de R$ 1 milhão, por exemplo, sai por R$ 500 por ano. Existem diversos seguros e com preços bem acessíveis à maioria da população.

Como atrair o cliente?
Precisamos mostrar os benefícios dos produtos, que é o segundo ponto, depois da comunicação. Temos trabalhado muito na indústria de seguros como um todo para facilitar a relação entre o cliente e a seguradora, facilitar a contratação digital, facilitar a contratação via parceiros ou via corretores, para dinamizar esse relacionamento. E o terceiro ponto é eficiência. Reduzir custos, além de implantar metodologias de negócio mais eficientes.

De que maneira?
Se a pessoa paga R$ 5 ou R$ 10 por mês por um seguro, e a emissão do boleto custa de R$ 2 ou R$ 4, isso representa de 20% a 80% do valor. Sistemas de cobranças mais baratos vão contribuir para isso. Por fim, é necessária a contínua evolução, desenvolvendo produtos cada vez mais adequados ao dia a dia das pessoas. Hoje, existem alguns que são contratados por hora, por evento.

“A pandemia foi um grande desafio em termos de pagamentos de indenizações. Só em seguro de vida indenizamos 190 mil pessoas em R$ 7 bilhões” (Crédito:AFP)

É a customização dos produtos?
O seguro hoje tem algumas tendências muito claras. A primeira é a digitalização em todas as suas partes. Desde a contratação, regulação de pagamentos de indenização, gestão interna das empresas, administração da cadeia de fornecedores, acionamento das assistências, assim como a coleta de informações. Dispositivos que são incluídos nos veículos, nas residências, nas empresas, para coletar informações sobre o segurado de modo a precificar o seguro adequado para cada perfil de risco.

Pelo lado das empresas, perfeito. E pelo lado dos consumidores?
Existe uma diversificação e uma personalização dos produtos. A regulação hoje ainda tem muitas restrições, mas passou por flexibilização nos últimos anos. Então, o cliente pode comprar um seguro de vida e junto vem uma assistência para um animal de estimação. Ou um seguro de veículo que protege também a bicicleta. Agora tudo isso é possível.

Quais as vantagens?
Há produtos em que a pessoa paga apenas quando usa. Com isso, você vai conseguir chegar a um seguro de que o cliente realmente necessita. Um exemplo: a cobertura para furacão é muito comum nos Estados Unidos. No Brasil não é algo que seja válido na maior parte das cidades. Enchente já é mais comum por aqui. Então, sim, é recomendável incluir proteção contra alagamento. Essas coisas devem ser realmente customizadas. Acho que esse é o caminho que a indústria está seguindo.

Qual o diferencial para outros países?
O nível de cobertura da sociedade. Você tem países em que o tamanho do mercado segurador corresponde a 15% do PIB. Este ano, no Brasil, deveremos fechar em 6,4%, que já é algo também muito relevante pelo tamanho do País. Mas comparativamente há ainda uma grande distância. Temos de crescer em termos de volume, mas não em qualidade de produtos, nem em tecnologia nem em gestão das empresas. O sistema de seguro brasileiro é muito bem capitalizado, com companhias muito fortes, grande parte delas internacionalizadas, apesar de as nacionais também serem empresas extremamente desenvolvidas.

O Brasil precisa avançar em quê?
No geral, acho que a nossa grande dificuldade é fazer chegar ao consumidor a importância de ele possuir um seguro. Mostrar o quanto o crescimento da indústria é importante para o desenvolvimento do País. O seguro faz parte hoje da sofisticação das atividades econômicas de um país. Quanto mais sofisticado ele for, quanto mais dinâmicas forem as relações econômicas, mais elas vão precisar de elementos de seguro no processo de desenvolvimento.

E como estão os números de cada ramo?
Vários setores da indústria ainda têm cobertura bastante baixa, como o seguro residencial, hoje presente em pouco mais de 11% das casas. Mesmo em veículos, que é um produto mais desenvolvido, a cobertura não passa de 30% da frota.

De que maneira a pandemia afetou o segmento?
Houve um crescimento da percepção de risco na sociedade. As pessoas se viram suscetíveis a ocorrência de fatores completamente imprevistos. A Covid gerou uma reação positiva em alguns ramos, principalmente no seguro de vida, que tem crescido em torno de 16% este ano. Na saúde também houve incremento da demanda. Recuperamos cerca de 3 milhões de beneficiários que, até antes da pandemia, tinham saído dos planos de saúde em virtude da crise econômica.

E o lado ruim?
A pandemia foi um grande desafio para o setor em termos de pagamentos de indenizações. Apenas em seguro de vida indenizamos 190 mil pessoas em um total de R$ 7 bilhões. Mas como tudo tem um lado positivo, a pandemia aumentou a percepção das pessoas de que precisam estar protegidas por um seguro.

“Muitas famílias, praticamente a maioria, têm animais de estimação, e hoje existe um cuidado maior com eles. As pessoas têm acesso a isso via seguradora” (Crédito:Istock)

Existe uma mudança de comportamento do consumidor em relação a automóveis. Muitos jovens já não fazem questão de ter o bem. Qual o reflexo no mercado?
O setor está se adaptando a essa nova sociedade. Não compartilho a tese de que as pessoas não vão ter um automóvel. Elas vão ter carro, querem ter carro e gostam de carro. A indústria automotiva vai mudar, os veículos serão diferentes. Temos automóveis eletrificados, provavelmente teremos semiautônomos e autônomos, o que também se mostra um desafio para a indústria de seguro. Como é que se faz o seguro de um veículo autônomo? São desafios que estamos nos preparando para lidar. Basta observar que um dos ramos que mais têm crescido é o cibernético, que não era realidade cinco anos atrás.

Assim como o de pet…
Muitas famílias, praticamente a maioria, têm animais de estimação, e hoje existe um cuidado muito maior com eles. As pessoas têm acesso a isso via seguradora. Uma demonstração de que a indústria se desenvolve e rapidamente se adapta às necessidades.

O que o segmento espera do novo governo federal?
A CNSeg está bastante otimista com as perspectivas da economia brasileira para 2023. Estão prevendo um crescimento de 2,2% do PIB [o Relatório Focus, do Banco Central, prevê elevação bem menor: 0,75%]. E dentro desse cenário estamos acreditando num processo de estabilização política do País, um processo de formação de um novo governo, com uma capacidade de governabilidade suficiente pra conduzir as suas pautas. Também estamos considerando a continuidade do conjunto básico das políticas econômicas do País que deram certo nesses últimos anos, que são basicamente uma política monetária autônoma, focada no respeito às metas de inflação [o IPCA ficou acima da meta em 2019 e 2020 e o teto da meta foi estourado em 2021 e irá estourar em 2022].

E do lado fiscal?
Uma política fiscal buscando equilíbrio das contas públicas, considerando as necessidades do País em relação a essa crise social que estamos vivendo.