Há uma missão de desbravamento em curso hoje no varejo brasileiro e ela está baseada em uma corrida rumo ao novo nível dos negócios digitais. A incorporação de tecnologias de ponta para ampliar seus marketplaces e angariar um público ainda mais diverso entrou na ordem do dia. E esse movimento tem surtido efeito. O setor que respondia por algo perto de 19% do PIB brasileiro — nível registrado um pouco antes da pandemia — saltou para patamares na casa de 28% do PIB, em apenas dois anos. E as experiências de consumo revolucionárias, dentro de plataformas que começam a incorporar o sistema de 5G, são a explicação para a alavancagem. No último final de semana, perto de duas centenas de empresas do comércio se reuniram durante o 10º Fórum Lide do Varejo e Marketing para discutir e mostrar justamente esse padrão de relacionamento interativo. O encontro começou com uma inédita movimentação dos organizadores — capitaneados por Luiz Fernando Furlan, chairman do Lide, Célia Pompeia, vice-presidente do Grupo, e João Doria Neto, diretor executivo, além do consultor Marcos Gouvêa e do publicitário Marcos Quintela — atuando no plano do metaverso, com os “avatares” de cada um deles interagindo diretamente com a plateia para apresentar o mundo de oportunidades que vem sendo explorado nos últimos tempos. Nos ecossistemas tridimensionais agora em criação já estão mergulhados grupos como Magalu, Via, TikTok, dentre outros portentos, numa jornada de protagonismo rumo a mais alternativas e serviços para, naturalmente, faturar muito. Chegamos à era da interação plena e rápida que passou a ser palpável também no Brasil.

No Fórum, os cases nesse sentido foram muitos, dando conta do estágio de desenvolvimento que as ferramentas tecnológicas alcançaram e de como elas poderão ser úteis para o empreendedorismo. O presidente da Flex Interativa, Fernando Godoi, apontou que as experiências no campo do que chama de “realidade aumentada” vão proporcionar não apenas resultados financeiros generosos como uma interação mais lúdica entre cliente e varejista. A forma de as empresas se comunicarem com as pessoas, e mesmo dentro de suas equipes, está mudando rapidamente. Depois da pandemia, a explosão do home office já gerou, por si só, uma redução nos custos de deslocamento, um maior engajamento dos profissionais e um melhor relacionamento — até mais ativo — com o público-alvo. Na onda do metaverso, da realidade aumentada e da velocidade em tempo real do 5G, inclusive com novidades como a da holografia sendo possível para reuniões e entendimentos a distância, o processo entra em uma dimensão sem precedentes. No encontro dos players do varejo, a grande discussão em voga era sobre como se posicionar dentro do metaverso. Ali, desde o mais simples tênis de caminhada até terrenos virtuais em localidades disputadas já estão sendo negociados. Portentos como Bradesco, BMW, Boticário e Nike passaram a testar inclusive lançamentos de produtos antes mesmo de sua efetiva colocação na praça. De uma forma ou de outra, a avalanche digital em 5G — que deve ter sua implementação definitiva efetivada pelo governo já em julho próximo — começou a mudar nossas vidas. O varejo e o marketing vêm sendo revirados, navegando por vários conceitos e comportamentos distintos. O vice-presidente de Operação e Logística da Magalu, Fabrício Garcia, aponta que praticamente todo o seu sistema de vendas já foi digitalizado e convertido para um ecossistema digital multicanal. “Juntamos os métodos e parceiros analógicos e digitais, ampliamos as categorias de comércio e, assim, diversificamos as fontes de receita.” Nas suas contas, a Magalu dobrou de tamanho de 2019 para cá, alcançando um faturamento de R$ 50 bilhões. Dessa receita, quase 70% se dá on-line. Com 1.481 lojas no seu marketplace 3P, o grupo atingiu um desempenho surpreendente no atendimento just in time ao consumidor. Hoje, as entregas rápidas deles conseguem registrar um tempo inacreditável de até uma hora entre a compra da mercadoria e a efetiva chegada à casa de quem a adquiriu, eliminando a inquietação daqueles que gostam de sair com o produto debaixo do braço e temiam as aquisições na internet. As lojas físicas do Magalu praticamente se converteram em meros pontos de apoio e logística, facilitando a entrega, tornando-a mais barata e rápida.

BONS RESULTADOS Para Gabriela Comazzetto, head de Global Business Solutions do TikTok, a relevância do conteúdo está na criatividade dos posts, que são rápidos e diretos na linguagem. Todos os dias, 1 bilhão de pessoas passam ao menos uma hora conectadas à plataforma nascida na China. (Crédito:GustavoRampini)

No universo multiplataforma, até mesmo a gigante de alimentos JBS começou a fazer suas incursões. O CMO Global da JBS, Sérgio Valente, disse que o advento do “mercado omni” somente facilitou a lógica do comércio e da venda que é basicamente, como ele diz, “conversar com gente e encantar”. A JBS está apostando nos canais digitais para mostrar o que são seus negócios, no que acredita e como opera. É o que a empresa classifica como um efetivo ambiente de boas experiências e, por que não, também de vendas. “O primeiro degrau ali é se conectar com os consumidores”, disse Valente. Na ordem de comunicação traçada por ele, a base digital atende aos esforços da companhia em todas as direções: de se relacionar, conversar, engajar e encantar. São princípios revigorados que vêm sendo perseguidos com afinco pelos varejistas.

Gabriela Comazzetto, head de Global Business Solutions do TikTok, plataforma que virou febre das mídias sociais entre os jovens, diz que o grupo adotou como missão a ideia de inspirar a criatividade. Segundo ela, os negócios nascem decorrentes daí, misturando entretenimento, interesse e conteúdo lúdico. Nos cálculos do TikTok, cerca de 66% da comunidade cria seu próprio conteúdo e, paralelamente, apresenta, de forma espontânea, produtos que viram verdadeiros hits de venda. “Cada um e cada empresa vem para contar algo no TikTok e sai com bons resultados dali”, afirmou Comazzetto. Para ela, a relevância do conteúdo está na criatividade empregada nos posts, que são rápidos e diretos na linguagem. A plataforma está, definitivamente, em alta. Cerca de 1 bilhão de pessoas em todo o mundo, pelos cálculos da executiva, passam ao menos uma hora por dia em seu ambiente, atrás de interesses diversos — da música aos pets, envolvidos na temática da economia, do bem-estar ou mesmo da sustentabilidade. Do Tik Tok para as lojas físicas, na procura do que é mostrado na plataforma, é praticamente um pulo. Segundo pesquisa do TikTok, 92% dos usuários dizem que descobrem novidades a partir do que assistem no seu ambiente. Das manias em alta, o “booktok”, indicações de livros lançados ou lidos que são sugeridos para os participantes da rede, virou destaque. Várias livrarias físicas passaram a ter espaços específicos apontando os best-sellers escolhidos pelos tiktokers. Mais de 70% dos assíduos participantes da rede se dizem abertos a ouvir anúncios de lançamentos ou promoções de mercadorias.

BOAS EXPERIÊNCIAS CMO Global da JBS, Sérgio Valente vem apostando nos canais digitais para se relacionar com clientes, engajar e encantar. (Crédito:Kazuo Kajihara)

COMUNICAÇÃO ORGÂNICA De uma forma geral, as comunidades múltiplas que se espalham pelo meio digital estão se apresentando como o alvo ideal nesse momento para a geração de oportunidades de negócios. Os varejistas explicam que as pessoas, em suas redes sociais, estão trazendo experiências e compartilhando rapidamente as impressões sobre o que consomem, produzindo um ativo caldeirão de testes e desafios para as marcas. Hélio França e Silva, diretor de operações da Riachuelo, diz que o varejo vem definitivamente entrando em uma nova escala de vendas e relacionamento, trazendo a reboque uma comunicação orgânica mais efetiva. “Montamos um ecossistema de style e serviços financeiros que tem dado muito certo. É um marketplace digital com um universo de parceiros jamais reunido antes”, afirmou Silva. Para uma empresa de mais de 70 anos, o mergulho no chamado mundo “omni” exigiu uma transformação gigantesca, que foi realizada em 2020, em pleno ataque da Covid. A Riachuelo criou a RCHLover, traduzindo uma linguagem e mensagem em sintonia com as demandas desse novo ambiente. Foi, decerto, o que fez a maioria das empresas antenadas com a jornada 4.0 que surgiu após a consagração do home office.