Cada dia mais perto e real, o racionamento de energia vai tomando dimensão estrutural, agora sob a forma de MP. Um documento interno do governo revela a intenção de se criar um comitê com poderes para a tomada de decisões, como a da redução obrigatória do consumo e a da contratação emergencial de usinas térmicas, nos mesmos moldes realizados em 2001. Uma medida provisória nesse sentido já está desenhada. Em 2001, o Brasil foi obrigado a reduzir em 20% o total do consumo para evitar o apagão. Agora a meta pode ser ainda mais rígida. No Ministério das Minas e Energia impera o silêncio sobre o assunto apagão. O próprio titular da pasta, Bento Albuquerque, quando perguntado a respeito, nega veementemente qualquer possibilidade nesse sentido. Mas o governo se prepara para o pior. O apagão pode vir justamente após a fase mais difícil da pandemia, quando a economia promete sinais de retomada e pode pressionar o sistema. O risco deve coincidir ainda com o período de campanha das eleições majoritárias que irão eleger o novo presidente – algo capaz de atrapalhar os planos do capitão Bolsonaro de tentar a recondução ao cargo. Outra pendenga a resolver no campo energético diz respeito ao modelo da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para indenizar concessionárias do setor pelo controle tarifário feito no governo Dilma. Em virtude daquela manipulação restou um passivo da ordem de R$ 50 bilhões a pagar, resultante de juros a serem repassados na conta de luz até 2028 – o que pode pressionar significativamente consumidores físicos e industriais. A fórmula de cálculo da Aneel para tanto teria gerado distorções, embora a agência até hoje negue falha. Como problema pouco é bobagem, foco adicional de confusão, em um setor que promete tomar as atenções e preocupações do País nos próximos meses, é o da privatização da Eletrobras. O governo, o Congresso e boa parte do mercado não se entendem quanto ao modelo em questão e sobre o custo das regras de privatização. Segundo cálculos de analistas, as emendas realizadas por parlamentares no projeto podem acarretar um aumento de despesa da ordem de R$ 41 bilhões no valor final das contas de luz. De maneira direta ou indireta. Isso pode vir a representar um acréscimo médio de mais de 10% para a faixa dos pequenos consumidores e de até 20% para a dos grandes. É um despropósito, no qual quem sairá perdendo de novo, para variar, será o público. A controvérsia no tocante a estatal e ao seu repasse vai além desse número, que já é astronômico e motivo de preocupação. Ela se concentra ainda sobre a tal lei de privatização da companhia. Segundo os críticos, estaria ali embutido um certo dirigismo no plano de expansão e geração da capacidade de energia, estabelecendo quais as fontes, locais de produção e tipo de fornecedor aceitável. Algo que, definitivamente, tiraria a liberdade de escolha natural reservada aos negócios da iniciativa privada. No todo e em cada parte parece existir falta de planejamento e organização adequados para a atividade energética andar no País.

Carlos José Marques, diretor editorial