Mergulhado em compromissos com líderes partidários, o presidente Jair Bolsonaro foi obrigado a cancelar, na quarta-feira 10, a gravação de um pronunciamento que faria em cadeia nacional de TV com um balanço dos 100 dias de gestão. Ao longo do dia, passaram pelo Palácio do Planalto 40 parlamentares, sem deixar tempo para a confecção da peça publicitária. Embora a interlocução com deputados e senadores soe natural para um político que passou quase 30 anos no Congresso, para o Bolsonaro presidente revela uma mudança de postura. Entra em campo agora o chefe do Executivo para liderar a articulação política e aumentar as chances de passar a reforma da Previdência. O gesto, que vinha sendo cobrado pelo Legislativo, faz a diferença. Aumenta as esperanças do mercado e de empresários de uma melhora na economia nos próximos meses.

Até agora, o presidente vinha mantendo uma posição dúbia em relação à revisão das aposentadorias e empurrando ao Congresso a responsabilidade de lidar com o tema. As portas do Executivo estavam fechadas, na tentativa de cumprir uma promessa de campanha para acabar com práticas da “velha política”. Em vez de receber parlamentares, o presidente os atacava, deixando claro sua opinião de que todos fazem parte das práticas enraizadas — e espúrias — de Brasília. Com isso, o clima de insatisfação prevaleceu no Legislativo, dando força a uma sequência de derrotas em votações de projetos de interesse do governo, que mancharam o período que deveria ter sido de lua-de-mel da nova administração. A tensão nas relações entre os poderes transbordaram para o mundo das finanças, contaminando os índices de confiança. Foi o sinal de alerta para a economia. Bolsonaro precisou agir.

Em compasso de espera: para Rocha, da Riachuelo, é preciso tirar o chip da campanha para aprovar a previdência e dar força à economia (Crédito:Gabriel Reis)

Na sexta-feira 5, começou a cumprir a promessa de abrir mais espaço na agenda aos líderes partidários. Após uma das reuniões, chegou a abraçar o presidente do DEM, ACM Neto. O partido detém a presidência da Câmara e do Senado. Na quarta-feira seguinte, Bolsonaro prometeu ainda mais tempo para receber deputados, senadores e presidentes das siglas. Sinalizou também a liberação de até R$ 3 bilhões em emendas parlamentares e a participação em campanhas a favor da reforma da Previdência. “O presidente está disposto a estar à frente dessa articulação”, afirmou o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

A falta de diálogo prejudicava não só a governabilidade como a avaliação do governo. Houve piora até em setores nos quais o apoio ao governo era elevado. Um levantamento da XP Investimentos mostrou a queda da aprovação entre representantes do mercado financeiro: o índice passou de 86% em janeiro para 28% em abril. A mesma pesquisa ainda mostra uma confiança no mercado de que a reforma da Previdência será aprovada. Cerca de 80% dos gestores acreditam na aprovação. “Independentemente do que o Bolsonaro fizer, há chances de ser aprovada”, afirma o analista político Cesar Alexandre Carvalho, da CAC Consultoria. “Agora, quanto antes o governo entrar no jogo, mais rápido e mais fácil ela sai. E isso necessariamente inclui a figura do presidente. O governo vinha batendo cabeça”.

A reforma da Previdência é vista como um ponto de virada das expectativas sobre a economia brasileira, citada como um gatilho para a decisão de novos investimentos. “É uma reforma que vem tarde. Abre o caminho para as outras reformas”, afirmou o presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, no 18º Fórum Empresarial do LIDE, em Campos do Jordão, na sexta-feira 5. Para André Esteves, fundador do BTG Pactual, os empresários irão responder à aprovação. “O tecido empresarial brasileiro vai fazer o resto. Chegou aqui com todo o vento contra e vai fazer toda a diferença agora se ajudarem um pouquinho”, afirmou. “É uma enorme alegria ver lideranças políticas tão maduras sobre o cenário brasileiro.”

Diante da urgência em torno da reforma da Previdência, as farpas entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, vinham causando desconforto entre os empresários. A avaliação era de falta de liderança para dar celeridade à pauta central da equipe do ministro Paulo Guedes. “A economia está em compasso de espera, aguardando o que vai determinar se o Brasil vai dar certo ou não, que é a aprovação da mãe das reformas: a da Previdência”, diz Flavio Rocha, presidente do Conselho de Administração da Riachuelo. Ele destaca uma mudança de postura “para melhor” do presidente no diálogo com o Legislativo. “É hora de trocar o chip: da campanha para o governo. Não é construtivo tentar insurgir a opinião pública contra o Congresso.”

O diálogo da previdência: alinhamento entre Maia (esq.), Guedes e Alcolumbre (dir.) foi elogiado por empresários (Crédito:Bruno Santos/Folhapress)

REVOGAÇO Enquanto a revisão do sistema de aposentadorias depende do ritmo da política e dos esforços do Planalto para dar mais velocidade à tramitação, o governo tenta caminhar com uma pauta paralela. A intenção é mostrar que o avanço de medidas para facilitar os negócios e diminuir o peso do Estado não depende exclusivamente da Previdência. Na quinta-feira 11, Bolsonaro anunciou, no evento de balanço de 100 dias de governo, um pacote de medidas microeconômicas. Entre elas estão o projeto de independência formal do Banco Central, a revogação de 250 atos normativos, para dar mais eficiência à máquina pública, além do 13º salário para o Bolsa Família. “O general porta-voz diz que o mar está revolto, mas tenho certeza que o céu está de brigadeiro”, afirmou Bolsonaro na cerimônia, no Palácio do Planalto.

O anúncio também busca injetar ânimo no momento em que a atividade não esboça reação. As projeções para o PIB deste ano estão sendo revisadas para baixo — o mercado estima um crescimento de 1,98%, ante os 2,5% previstos em janeiro. “Estamos crescendo 0,5% ao ano. Acabou! Não há mais para onde ir a não ser enfrentar frontalmente o problema”, afirmou Guedes a empresários, em Campos do Jordão. “Se o problema é o excesso de gastos, vamos atacar a reforma da Previdência, com um projeto que seja potente.” A proposta elaborada pela equipe de Guedes prevê uma economia de R$ 1,164 trilhão em dez anos. Mas uma desidratação já está prevista na tramitação com o Congresso. O tamanho exato vai depender da capacidade de negociação com os parlamentares. A bola está também com Bolsonaro.


Com a Previdência, teremos uma enxurrada de dinheiro no Brasil

O diretor-presidente da CSN, Benjamin Steinbruch, conversou com DINHEIRO no intervalo do Fórum Empresarial, em Campos do Jordão.

Como o senhor avalia a indicação do Bolsonaro de entrar no jogo da articulação política?
O tempo está curto, com poucos dias de governo. Ele ficou hospitalizado, tinha o recesso parlamentar… Existe uma diferença de proposta no relacionamento de poderes que tem de ser respeitada e testada. O presidente já entrou em campo e vai estar no diálogo, porque é assim que funciona: os três Poderes têm de se falar e vão se falar. Tenho certeza que é inevitável.

As previsões para o PIB estão sendo revisadas para baixo. Corremos o risco de um ano de crescimento frustrado?
Aprovando a Previdência e iniciando a série de boas notícias, a gente recupera todo esse atraso que tivemos no começo do ano. Vamos terminar muito melhor do que no ano passado e com uma perspectiva muito melhor ainda para 2020.

Dá para crescer acima de 2%?
Acho que sim. Com a Previdência, vamos ter uma enxurrada de dinheiro no Brasil, o que vai fazer com que o crescimento venha mais rápido e forte do que todos estão prevendo.