Poucas vezes se viu um movimento tão intenso e generalizado de retaliações comerciais a um País como o que ocorre agora contra a Rússia. A asfixia econômica tem sido a principal arma contra os abusos ostensivos de Vladimir Putin, que resolveu invadir a Ucrânia na marra. E que bom que assim seja! No plano do que se convencionou chamar de Guerra Fria. Mas a escolha por esse caminho acontece não de forma indolor para todos, sem consequências. Ao contrário. A resposta vem (nos moldes de ação/reação) na mesma medida. Cortar relações comerciais gera prejuízos multilaterais, em todas as direções. O Brasil, por exemplo, está enfrentando nesse contexto um cenário que piorou muito. A produção de bens possui laços diretos com o que ocorre do outro lado do mundo. O agronegócio, principal fonte das exportações daqui, nem se fala. O Brasil corre o risco de despontar como um dos maiores afetados na hipótese das sanções à Rússia se estenderem pelos setores de energia e commodities. Putin, na contrapartida das sanções tomadas pelos adversários, já avisou que poderá suspender sumariamente o fornecimento de fertilizantes. E outras respostas no mesmo padrão estão prestes a ocorrer. O gás, o petróleo e um universo gigantesco de mercadorias e matérias-primas já começam a enfrentar sinais de escassez. O viés de uma inflação subindo em escalada, globalmente, turvou o horizonte. Assim, não está sendo apenas a terra de Putin a sofrer com os efeitos do “bombardeio comercial”, digamos. Sobrará para quem estiver perto, distante, de um lado ou do outro. O conflito mobiliza de imediato a indústria de mineração, que contabiliza significativas perdas. No contexto conflituoso em vigor, o mundo vai queimando riquezas como se não houvesse amanhã. Exportadores nacionais temem que problemas na logística e nos pagamentos atrapalhem de maneira fatal os negócios. Na amostra fria dos números, a participação russa no cômputo geral de exportações brasileiras é pequena – menos de 1%, e vem caindo –, mas o arco de atividades e resultados comprometidos no tabuleiro desse episódio bélico é enorme. Produtores de carne, soja, amendoim, café e açúcar acusaram o golpe do prejuízo contratado pela inevitável queda das vendas. Com a invasão da Ucrânia, o risco de gargalos entrou na ordem do dia. Insumos andam em falta. Era uma realidade visível havia algum tempo por conta da pandemia de Covid, mais seu potencial de estrago elevou-se ainda mais. A preocupação, hoje, é com o impacto nos contratos futuros de produção. As oportunidades pós-conflito diminuíram brutalmente. Na Organização Mundial de Comércio (OMC), a União Europeia quer retirar todas as concessões comerciais da Rússia. Significa que pelo menos R$ 95 bilhões de vendas ficarão ameaçadas. É uma iniciativa com dimensão sem precedentes nas trocas globais. Representantes de comércio de ao menos 27 países estão discutindo a remoção do que se convencionou chamar de status de “nação mais favorecida”, concedido no passado a Rússia sob as regras da OMC. Trocando em miúdos, a virada de conceito daquela nação significa que as exportações russas na União Europeia poderão ser discriminadas de todas as formas possíveis. É apenas o começo. Ainda persistem inúmeras hipóteses sobre o confronto, como o do tempo de sua duração, gerando tensões políticas e econômicas em cascata para a atividade global. Nada desprezível será o tamanho do rombo em gestação. O cenário mostra-se complexo e com variantes negativas em especial para os chamados emergentes. Os juros tendem a subir generalizadamente para financiamentos e empréstimos. E o mais grave de todo o quadro: os movimentos protecionistas serão intensificados, subindo a um patamar que os especialistas apontam como semelhante ao de meio século atrás. Um retrocesso a ser computado na coluna de prejuízos das retaliações.

Carlos José Marques Diretor editorial