Um projeto de mineração de terras raras na Groenlândia tem causado uma crise política e alimentado o debate sobre o futuro deste território ártico, ameaçado pelo aquecimento global, e que quer se tornar independente da Dinamarca.

A abertura, no início de fevereiro, de consultas públicas sobre o depósito de terras raras e urânio de Kvanefjeld (Kuannersuit em groenlandês), no extremo sul da maior ilha do mundo, desencadeou uma crise política que pode derrubar o governo.

O caso fraturou a coalizão governamental, privando-a de sua maioria no Parlamento local.

O partido de direita Demokraatit abandonou a coalizão, frustrado com a indecisão do maior partido, o social-democrata Siumut.

Na terça-feira, o Parlamento decidiu realizar eleições legislativas antecipadas em 6 de abril, um epílogo da crise política.

A lei para a realização de novas eleições foi aprovada por unanimidade pelos 27 deputados presentes, do total de 31 do Inatsisartut, o parlamento local.

Os apoiadores do projeto de mineração elogiam as vantagens financeiras que podem ajudar Nuuk em sua busca por autonomia.

Desde 2009, a Groenlândia decide sobre a gestão de seus recursos, e Copenhague conserva as funções soberanas.

Em 2010, a Greenland Minerals, empresa australiana apoiada por um investidor chinês, obteve a licença de exploração do depósito de Kvanefjeld, rico em terras raras (metais essenciais para tecnologias de ponta) e urânio.

É considerada uma das mais importantes do mundo para esses minerais, mas sua exploração enfrenta oposição crescente, devido às preocupações com os rejeitos radioativos gerados pela mina.

Após três recusas sucessivas, o plano de proteção ambiental da Greenland Minerals foi aprovado.

As consultas vão até 1º de junho, mas começaram sob tensão, e alguns políticos optaram por não comparecer após ameaças de morte.

Antes de obter uma licença de operação de 37 anos, a empresa precisará alcançar um acordo sobre impactos e benefícios.

– ‘Momento crucial’ –

Em princípio favorável ao projeto de exploração que representaria receitas tributárias significativas, o Siumut adotou uma linha mais reservada desde novembro e da eleição para a presidência do partido de Kim Kielsen, até agora chefe do governo.

“Estamos em um momento crucial com uma mudança geracional à frente do Siumut, e o projeto Kvanefjeld está criando tensão”, disse à AFP Mikaa Mered, professor de geopolítica no Instituto francês de Estudos Políticos (Sciences Po).

E o debate sobre a mina abarca o problema do financiamento da independência.

A Groenlândia deseja ser independente, mas esta emancipação da Dinamarca – à qual Copenhague não se opõe – a privaria dos generosos subsídios dinamarqueses, cerca de US$ 635 milhões por ano, ou seja, um terço de seu orçamento.

A diversificação de sua economia, que se baseia principalmente na pesca (setor que representa 90% das exportações da Groenlândia), será um tema central da campanha, juntamente com saúde e questões sociais.

“Um desenvolvimento econômico precisa de uma base financeira mais ampla, e a mineração e o turismo são pilares potenciais nesse processo”, estima Torben Andersen, presidente do Conselho Econômico da Groenlândia e professor de economia da Universidade Aarhus.

Recentemente, 141 ONGs solicitaram ao governo da Groenlândia, da Dinamarca e à União Europeia uma moratória sobre mineração, extração de petróleo e gás na Groenlândia para estabelecer um santuário no Ártico.

Chemnitz Larsen, do partido Inuit Ataqatigiit (IA, esquerda verde), opõe-se à mineração de urânio, mas apoia o desenvolvimento de uma mineração ambientalmente correta como um “suplemento de receita” para o território.

De acordo com Torben Andersen, do Conselho Econômico da Groenlândia, “o desenvolvimento econômico não requer grandes projetos de mineração”.

“Há também a questão da reputação e, possivelmente, um conflito com o desenvolvimento concomitante do turismo, principalmente se for dirigido a clientes muito interessados na natureza”, conclui.