Os millennials, jovens nascidos entre a segunda metade da década de 1980 até 1995, constituem a geração mais diplomada da história do Brasil. Cerca de 25% completaram o ensino superior — e a cifra sobe para 58% quando são inseridos também os cursos técnicos e profissionalizantes. Essa geração tinha tudo para realizar uma proeza: diminuir a desigualdade social por meio do fortalecimento de renda com capacitações mais específicas para o mercado de trabalho. O que ocorreu foi o contrário: ela se vê mais vulnerável financeiramente que as gerações anteriores. Com a expectativa de que o País encerre 2020 com uma taxa de desemprego na casa dos 18%, os jovens — principalmente os negros e periféricos — podem perder para sempre a chance de trilhar um caminho profissional promissor.

A mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) Contínua, divulgada na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) escancara esse cenário. Ao final do primeiro trimestre, ainda sem levar em conta muitas das demissões causadas pela pandemia, a taxa de desemprego ficou em 12,2%, quase a mesma de igual período em 2019. Agora, com a ameaça econômica trazida pela Covid-19, estimativas como a do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), ligado à Fundação Getulio Vargas (FGV), preveem desocupação bem maior até o final deste ano. “O cenário será desafiador, e mais cruel com os jovens que estão entre os 18 e 30 anos”, afirma o professor de economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Carlos Augusto Torres.

A avaliação é a mesma do pesquisador Daniel Duque, que coordenou o estudo da FGV sobre desemprego. Ele prevê uma acentuação da desocupação a partir de abril. Com isso, haverá também diminuição no rendimento familiar, acentuando a desigualdade social. Segundo a pesquisa, a queda real no rendimento pode ser de 8,58%. “Com isso, a renda efetiva média fechará o ano no nível de R$ 2.206 mensais, frente a R$ 2.413 no ano anterior.”

Caso a previsão se confirme, a Massa de Rendimentos Efetivos do Trabalho (MRT) baterá o ponto mais baixo desde o início da série histórica, em 2012. “Ainda que o governo federal lance mão de grandes programas de transferência de renda, dificilmente seu volume seria capaz de compensar o montante perdido no período. Mais de R$ 30 bilhões mensais de perda de MRT correspondem a cerca de 5% do PIB de 2019”, diz o coordenador do estudo.

JOVENS PERIFÉRICO Se os jovens estão na linha de frente do desemprego, os periféricos são ainda mais vulneráveis. Segundo a consultoria alemã Roland Berger, 33% das famílias com renda mensal de até um salário mínimo no Brasil já possuíam, em abril, ao menos uma pessoa sem emprego por causa do novo coronavírus, cifra que cai para 4% entre as famílias com rendimento entre R$ 5 mil e R$ 10 mil. Para Edson Salgado, ex-coordenador núcleo de emprego e renda do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea), os jovens brasileiros enfrentarão um período de subutilização na informalidade que pode durar até três anos.

NECESSIDADE: Apenas no primeiro trimenstre deste ano 826 mil pessoas trocaram emprego formal por uma ocupação como entregador ou ambulante. (Crédito:Saulo Angelo)

Segundo os dados do IBGE relativos ao primeiro trimestre deste ano, nada menos que 826 mil trabalhadores trocaram, por vontade ou necessidade, um emprego formal por um informal. A base de comparação é o último trimestre de 2019. Isso engloba um universo do qual fazem parte milhares de motoristas de aplicativo, entregadores e ambulantes que não possuem qualquer projeto profissional de longo prazo, ainda que possuam instrução. “Ter a capacidade de montar um negócio próprio não significa que sua execução será fácil”, diz Salgado. É preciso levar em conta os desafios que aguardam quem decide empreender no Brasil, sem descartar o risco de eventos como a pandemia.

Para tentar amenizar os efeitos recessivos da paralisia nos negócios provocada pela Covid-19, o Congresso aprovou, em abril, uma medida que libera R$ 600 mensais para atender cerca de 38 milhões de trabalhadores informais do País. O valor é insuficiente para sustentar uma das engrenagens que mantêm a economia ativa. Para o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, o que se formará nos próximos meses é um cenário de aumento da pobreza. “Vamos precisar de políticas de emprego mais adequadas. Sendo bem transparente, o desemprego vai dar um salto no Brasil, infelizmente”.