Um dos ativos à venda no plano de desinvestimentos da J&F, holding dos irmãos Joesley e Wesley Batista, e dona de uma capacidade anual de produção de 1,5 milhão de toneladas, a Eldorado Celulose parecia estar próxima de encontrar um comprador em meados de junho. Na época, a chilena Arauco fechou um acordo de confidencialidade para avaliar a aquisição. A oferta, inicialmente, estaria em R$ 14 bilhões, o que incluiria uma dívida de R$ 8 bilhões da companhia brasileira.

Há pouco mais de duas semanas, no entanto, a negociação mudou de rumo. E apareceu como favorito no páreo um nome até então pouco conhecido no mercado local: o da Asia Pulp and Paper (APP), produtora de celulose, papel e cartão da Indonésia. A empresa integra o Sinar Mas Group, controlado pela família de Eka Tipta Widjaja, cuja fortuna é estimada em US$ 5,6 bilhões. A cifra colocada pela APP na mesa dos irmãos Batista é de R$ 15 bilhões. “Estava tudo praticamente certo com a Arauco”, diz uma fonte a par das negociações. “Mas a empresa disse que não cobriria a oferta e desistiu do negócio.”

Proposta: a Asia Pulp and Paper, fundada pelo bilionário Eka Tipta Widjaja, está oferecendo R$ 15 bilhões pela Eldorado, que mantém suas operações em Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul (Crédito:Divulgação)

Os termos incluídos no acordo, no entanto, colocam em xeque o plano inicial da J&F. A companhia propõe a aquisição em duas etapas. Inicialmente, ela compraria uma participação de 30% a 35%. E assumiria o compromisso de adquirir a fatia restante assim que algumas dúvidas sobre os desdobramentos de investigações envolvendo a J&F fossem resolvidas. Procurada, a J&F disse que não se manifestaria. A APP afirmou que não está adquirindo a Eldorado. “No entanto, o Brasil segue como um mercado importante para a companhia e nós podemos explorar as possibilidades de novos investimentos no futuro”, escreveu o grupo em comunicado.

Fundada em 1972, a APP tem fábricas na Indonésia e na China, e possui uma capacidade de produção de 19 milhões de toneladas por ano. A empresa comercializa os seus produtos em mais de 120 países. E, nos últimos anos, despertou a ira de grupos ativistas como o Greenpeace, por supostos danos ambientais, especialmente em florestas da Indonésia. No Brasil, a companhia mantém há dez anos um escritório de vendas, sob a bandeira Cathay, que também responde pelos negócios na América Latina.

Formada por seis pessoas, a equipe local cuida do relacionamento comercial com a base de clientes, composta por distribuidores que, por sua vez, repassam os produtos a gráficas e editoras. “A APP é uma caixa preta”, diz Daniel Domeneghetti, CEO da consultoria DOM Strategy Partners. Ele ressalta que é difícil traçar um cenário confiável para um eventual acordo com a J&F. E não apenas pela ausência de referências sobre o grupo asiático. Mas também, pela situação complexa da estrutura de dívida da Eldorado.

Para Pedro Galdi, analista da Magliano Corretora, mesmo com a negociação, a favorita para levar a Eldorado segue sendo a também brasileira Fibria. O fato de as duas companhias possuírem fábricas próximas, em Três Lagoas (MS), é um dos motivos. “As sinergias são maiores”, afirma. “Até mesmo porque as duas companhias têm o BNDESPar como acionista, que vai fazer de tudo para manter esse ativo nas mãos de brasileiros.” Domeneghetti acrescenta: “A Fibria está olhando o acordo como um player de última rodada. Eles não vão antecipar um movimento e correr o risco de pagar caro pelo ativo.”

Procurada, a Fibria afirmou que já manifestou interesse na companhia. “Mas, até o momento, não iniciou negociação”, disse a empresa em comunicado. Nos bastidores, porém, a companhia chegou a fazer uma oferta, que esbarrou no pedido da J&F de uma compra sem due diligence (auditoria prévia). Segundo uma fonte próxima à negociação, um fator dificulta o acordo. “Há uma certa mágoa pelos supostos boicotes que a Fibria teria promovido contra a Eldorado, desde que a empresa iniciou sua operação”, afirma o executivo do setor, que pediu anonimato. “Mas isso não significa que as portas estão fechadas para uma nova conversa.”


Guerra de acionistas

A JBS está no centro de uma disputa judicial envolvendo os irmãos Batista e o BNDES

As negociações em torno da venda de ativos da J&F não são a única preocupação de Joesley e Wesley Batista. Outro fator tem tomado boa parte do tempo dos dois irmãos. Nos últimos dias, a dupla se envolveu em uma verdadeira batalha jurídica. No centro da disputa está a JBS, maior processadora de carnes do mundo e principal negócio da holding da família, que detém 42,16% na operação. No campo oposto, o BNDESPar, braço de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), dono de uma fatia de 21,32%, que defende a saída de Wesley da presidência da companhia.

O capítulo mais recente desse imbróglio foi escrito na sexta-feira 1º. A juíza Giselle de Amaro e França, do Tribunal Regional Federal da 3a Região, determinou a suspensão, por 15 dias, da Assembleia-Geral Extraordinária da JBS. A decisão veio minutos antes do início da reunião que discutiria, entre outros pontos, o afastamento de Wesley do comando da JBS. E atendeu a um recurso da J&F contra uma liminar obtida pelo BNDES na noite anterior, que impedia a participação dos irmãos Batista na votação das pautas da assembleia, sob a alegação de conflito de interesses. Com a mesma premissa, o BNDES havia recorrido, dias antes, à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que negou o pedido.

De acordo com a nova decisão divulgada na manhã de sexta-feira, as duas partes deverão discutir a questão sobre a existência ou não de conflito de interesses na esfera da arbitragem, conforme prevê o estatuto da JBS. Em comunicado, a J&F afirmou que sempre esteve e seguirá aberta ao diálogo independentemente de qualquer decisão judicial. “A companhia lamenta que o BNDES tenha instaurado o caminho judicial em detrimento ao diálogo e reitera que se mantém aberta ao entendimento que preserve os melhores interesses da empresa. Por fim, a J&F acredita que a JBS tem tomado as medidas corretas no tempo correto”, escreveu a holding. Procurado, o BNDES disse que está avaliando as medidas cabíveis.