Luiza Helena Trajano, presidente do conselho de administração da rede Magazine Luiza, é uma das vozes mais ativas do empresariado brasileiro no que diz respeito à economia, política e empoderamento feminino. Em entrevista ao programa MOEDA FORTE na TV Dinheiro, que vai ao ar na segunda-feira, 24 de setembro, ela fala sobre todos esses assuntos e também comenta a transformação digital da rede. “Éramos uma empresa física com uma área digital e nos tornamos uma empresa digital, com pontos físicos e, melhor ainda, com calor humano”, diz Luiza. Acompanhe alguns trechos. Os vídeos na íntegra podem ser acessados no www.istoedinheiro.com.br

Estamos vivendo uma das maiores recessões da história do Brasil. Quando vamos sair dessa situação?
Enquanto não acabar esse ano eleitoral, vai ser essa confusão. Sempre foi assim e esse ano, como está muito mais dividido, com muito mais rancor, muito mais raiva, a economia vai continuar assim. E veja que temos 13 milhões de desempregados. Uma economia de um país em desenvolvimento é feita de crédito, salário e renda. Perdemos salário, automaticamente a renda e, quando tem recessão, o crédito é mais apertado. Não nego que a crise existe e esse período foi de crises moral, política e econômica. O País está dividido e isso é muito ruim.

Diante do cenário político, das eleições, a senhora está otimista?
Estou otimista e não é pelas eleições. Está acontecendo uma coisa que as pessoas ainda não perceberam. Essa crise levou as pessoas a desenvolverem o espírito de cidadania. Nessa eleição, ninguém vai fazer milagre porque o nosso sistema político é viciado. Você tem que negociar por dois meses o partido que vai apoiar e tem que dar cargo. Numa empresa a gente não pode fazer isso, não existe isso. Estão acontecendo vários movimentos de cidadania, de grupos que estão juntos pelo Brasil. Portanto, estou confiante.

Como nasceu o seu movimento Grupo Mulheres do Brasil?
Acredito que só a sociedade civil, assumindo o Brasil, sem reclamar, com propostas consistentes, vai conseguir transformar o País. Era o meu sonho ter uma sociedade civil fazendo acontecer. Começamos com 40 mulheres e hoje temos 20 mil mulheres e 15 comitês. E somos totalmente apartidárias.

Quais são as principais pautas do grupo?
Educação, saúde, igualdade racial, contra a violência a mulher, cultura e empreendedorismo. Atuamos no varejo, ajudando ONGs, e também no atacado, desenvolvendo estudos e enviando para os políticos.

Aliás, um tema que tem sido muito falado nessa campanha é a igualdade entre homens e mulheres quando diz respeito a salários e oportunidades. O que o grupo conseguiu?
Conseguimos passar no Senado cotas para mulheres em conselhos de administração nas empresas de capital aberto. Tem 7% só e se você tirar as donas, como eu, cai para 2%. Os países que têm cota melhoraram a economia. Mas eu digo que salário é questão de caneta. Você não gostaria que uma filha sua, com a mesma capacidade de um filho, ganhasse menos só porque é mulher. Não podemos aceitar isso mais. Agora, mede-se capacidade. Meus colegas dizem ‘Ah Luiza, isso não existe’. Isso existe, sim. Estatísticas mostram que, pelo fato de gênero, ganha-se 20% a menos.

A senhora continua em contato com os clientes?
Até hoje. A minha maior vantagem é que eu não saí da ponta. Mesmo com todos os cargos que ocupei e mesmo hoje, como presidente do conselho, tenho uma linha direta com os clientes. Tem gente que, quando a empresa cresce e vai para o escritório, perde o contato com o cliente. Temos 900 lojas, mas é como se tivéssemos uma só. Fico muito triste quando pego uma reclamação de um cliente que não recebeu o produto. É nessa hora que eu entro.

E ajuda nesses casos?
Eu não só ajudo como cobro e quero resposta. Eu tenho uma linha direta com o cliente e uma linha direta com o pessoal da ponta. Porque uma das coisas que tive mais medo era perder o jeito nosso de ser, aquela cultura Magazine Luiza. Imagina só, temos 900 lojas, 23 mil funcionários e você vai perdendo o contato. Por isso, tenho essas linhas diretas com o pessoal de base e com o cliente.

Como uma rede tradicional do varejo físico conseguiu se transformar em uma loja digital?
Você sabe que o mercado é feito de ondas… Antes, todo mundo acreditava que o pontocom deveria ser uma empresa totalmente separada, que não falaria com o físico, que era outro mundo. Mas, tanto eu como o Frederico (CEO do Magazine Luiza e filho de Luiza), acreditávamos que o pontocom era uma parte do corpo. Não dava para separar. Fomos muito sacrificados. Nossas ações chegaram a valer menos de R$ 1 (Em 14 de dezembro de 2015, a ação era negociada a R$ 0,97. Na quarta-feira, 19 de setembro de 2018, o papel era cotado a R$ 119,01).

E hoje é uma das mais valorizadas …
Agradeço até hoje a minha família, que tinha 74%, que nunca nos pressionou. A gente não separou e, há quatro anos, o Frederico foi criando pequenos laboratórios e desenvolvendo aplicativos que serviriam tanto para a loja como para o pontocom. Os analistas nos castigavam e nós nos mantivemos firmes. De repente, o mercado viu que não se vive sem a loja física. Então, éramos uma empresa física com uma área digital e nos tornamos uma empresa digital, com pontos físicos e, melhor ainda, com calor humano.

O Magazine Luiza está criando uma ferramenta na área de meio de pagamento?
O Frederico acabou de chegar da China e ele até falou, não tem dinheiro e nem cartão. Por isso estamos muito atentos a isso. Temos um aplicativo que pode se transformar em moeda de pagamentos ou algo parecido.

(Nota publicada na Edição 1088 da Revista Dinheiro, com colaboração: Moacir Drska)