A 27 dias de 2020 acabar, a forma como Orçamento do governo federal será fatiado e distribuído vai ficar para os 45 minutos do segundo tempo. E desta vez a culpa não é do presidente Jair Bolsonaro ou de sua equipe econômica, já que a demora se concentra em uma resistência do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que entrou em uma verdadeira cruzada contra os parlamentares do Centrão – que queriam ser protagonistas na condução do Orçamento. Sem chances de conseguir finalizar a aprovação final da Lei Orçamentária Anual (LOA) em 2020, foi preciso que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre entrasse na batalha e articulasse ao menos o acordo que garante aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Isso evita que o governo comece 2021 sem condições de investir e honrar despesas obrigatórias.

Para tentar mitigar o impasse que envolvia o nome do presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), o acordo do presidente do Senado foi tirar a necessidade de que o texto enviado pelo governo precisasse ser apreciado pela CMO, colocando a proposta atual diretamente para votação em plenário na última semana antes de os parlamentares saírem de férias. A decisão de Alcolumbre parece não ter agradado assessores técnicos do ministro Paulo Guedes, que temem desconfiguração de sua proposta – enviada em abril ao Congresso – sem que haja tempo hábil para uma articulação política por parte do governo. Um dos homens que ajudou o ministro a construir a proposta falou com a DINHEIRO em condição de anonimato e disse que Guedes se mostra preocupado. “Votar o texto sem passar pela CMO facilita a obstrução”, disse. Há ainda a preocupação sobre como fica a prestação de contas com o Tribunal de Contas da União (TCU).

E a dor de cabeça de Guedes realmente vai além das paredes convexas do Palácio Nereu Ramos. No dia 26 de novembro o TCU ameaçou condenar o ministro caso a equipe econômica ignore o alerta enviado pelo órgão e deixe de enviar ao Congresso uma meta fiscal para o resultado primário de 2021. Guedes havia sinalizado o interesse enviar uma meta “flexível” o que o Tribunal entendeu como forma de ludibriar o orçamento e cometer crime de responsabilidade. Segundo o assessor do ministro, para que as metas sejam mais rígidas, é preciso saber o que o Congresso definirá sobre o Orçamento. Para os ministros do TCU, tal medida compromete a execução orçamentária em 2021. E como se não bastasse, no dia 2 de dezembro, o ministro-relator do acórdão, Walton Alencar Rodrigues também notificou o Ministério da Economia, a Controladoria-Geral da União e a Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso Nacional sobre possível insuficiência de caixa de R$ 46 bilhões já para este ano. Fruto de uma queda de 4,48% na arrecadação no quarto bimestre de 2020. Para Rodrigues a baixa fará com que o País entre ainda mais desestruturado em 2021. “Tal insuficiência configura risco capaz de afetar o equilíbrio das contas públicas e a gestão fiscal responsável.”

DOR DE CABEÇA Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, entra em uma batalha política com seu opositor Arthur Lira. (Crédito:Ettore Chiereguini)

PANOS QUENTES Enquanto a incerteza cresce, o discurso dentro do governo é para tentar apaziguar os ânimos. O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, por exemplo, garantiu à reportagem que a redução gradual da incerteza econômica permite que a equipe econômica consiga ver os números do ano que vem com mais clareza. “Estamos à disposição do Congresso para discutir as cláusulas do PLDO”, disse, sem citar o prazo apertado. Menos aberto ao diálogo com o Congresso, o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, entende que mudanças no Parlamento impactam o andamento da economia em 2021.

O professor de contas públicas e ex-ministro do TCU Robério Salomão afirma que não há tempo para mais negociação “Quando mais demorar [para aprovar], mais inviável será o início da execução dos recursos.” Outra saída, na avaliação de Salomão, seria negociar com o Parlamento a postergação do estado de calamidade pública e do Orçamento de Guerra que, assim como neste ano, suspendem as regras fiscais em 2021.

Com a intervenção de Davi Alcolumbre (DEM-AP) ficou decidido que o Orçamento será votado entre os dias 14 e 19, às vésperas do recesso parlamentar. Em Brasília, deputados aliados de Maia afirmam que o presidente da Casa dará espaço para que a oposição apresente pontos que alterem a PLOA. “Não podemos falar que a Covid é um evento inesperado, e o Orçamento reduz os recursos da Saúde”, disse um aliado de Maia. Tentando acelerar o processo, Luiz Eduardo Ramos, o ministro da Secretaria de Governo, se encontrou com Alcolumbre e disse ser possível que o texto avance sem grandes alterações. O ônus do acordo para o governo, no entanto, é o Senado também tentará votar os 22 vetos presidenciais parados na Casa.