Ao completar seu primeiro mês como ministro da Infraestrutura, o engenheiro carioca Tarcísio Gomes de Freitas embarcou na boleia de um caminhão e percorreu 1.000 km da BR-163, da Serra do Cachimbo até Santarém, no Pará. Uma das principais rotas de escoamento da produção do Mato Grosso para o Porto de Miritituba, a rodovia possui diversos trechos sem pavimentação e, em épocas de chuva, vira um mar de lama com caminhões presos no barro durante semanas. Na viagem, Tarcísio conheceu de perto uma realidade que assola o agronegócio há décadas — e coordenou pessoalmente até o resgate de veículos atolados.

“Este é o último ano que vamos ter que lidar com retenções por conta das chuvas do inverno amazônico”, afirmou a caminhoneiros. “Essa rodovia foi aberta pelo general Geisel e será concluída pelo capitão Jair Bolsonaro.” A promessa é entregar o asfalto ainda em 2019.

O jeitão “pé no barro” do ministro, que é formado pelo Instituto Militar de Engenharia, tem chamado a atenção. Na boca dele, a promessa de asfaltar BR-163, feita tantas vezes por outros, agora parece factível. Aos 43 anos, casado e pai de dois filhos, Freitas é reconhecido por sua habilidade de negociação, mediação, pontualidade e disciplina, além de ser um dos maiores conhecedores da infraestrutura brasileira. Entre outras funções, foi diretor executivo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).

Mesmo sendo um representante do núcleo militar do governo, segue a linha desestatizante — e tem pressa. Até quarta-feira 10, já havia recebido 17 dos 27 governadores do país, seis embaixadores e uma extensa lista de deputados, senadores, empresários e banqueiros. Em pauta, projetos e propostas para destravar o País. Sempre que pode, reforça a intenção de acelerar parcerias com o setor privado. “Nossa missão é botar projeto na rua. E a de vocês, investir”, disse na sexta-feira 5, durante o Fórum Empresarial do LIDE, em Campos do Jordão. Na ocasião, ele penou para deixar o evento, tamanho o assédio dos executivos presentes.

Atoleiro: na BR-163, no Pará, lamaçal prejudica o escoamento da safra agrícola. Melhorar a logística ajuda a desenvolver a região (Crédito:Joel Silva/Folhapress)

Dono de voz mansa e firme, é o que mais realizações apresentou nos primeiros 100 dias de governo dentre todos os ministros de Bolsonaro. Nesse período, saíram do papel 23 leilões. Entre eles, a venda de seis áreas portuárias no Pará; o leilão de concessão de 12 aeroportos, com uma arrecadação de R$ 4,2 bilhões e um ágio de quase 1.000% (leia mais na página 32); a assinatura de oito contratos de adesão de Terminais de Uso Privado (TUPs) para ampliar a movimentação de cargas em portos e outros dois de arrendamento em Santos (SP) e Itaqui (MA), além de um enroscado leilão da ferrovia Norte-Sul. “Goiás sonhou com a ferrovia por 30 anos. Ele resolveu em 90 dias. É um ministro que nos dá orgulho”, diz o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM).

Se o ritmo de trabalho atual for mantido, há chances de tirar outro projeto histórico do papel. Em janeiro, Freitas assinou com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), o protocolo de intenções para a construção do trecho Norte do Ferroanel, que deve transportar 67 milhões de toneladas de produtos por ano, substituindo mais de 2,8 mil caminhões nas estradas. A viabilidade da obra se dará com investimentos federais, cujos recursos serão da outorga de concessão ferroviária da MRS Logística. “O Tarcísio é uma vitória para o Brasil”, afirmou Doria. “Com ele, não tem conversa fiada. Se é sim, é sim. Se é não, é não. Ele carrega o mastro e a bandeira da desestatização.”

O setor de ferrovias, um dos mais enguiçados da logística brasileira, deve ser alvo de outras inovações. Uma delas é permitir com que investidores privados paguem as outorgas com investimentos na construção de outros trechos, em vez de direcionar recursos do Tesouro Nacional. A outra é trabalhar pela aprovação do projeto que permite a criação de trechos por autorização, em que grupos privados podem construir quando tiverem interesse, sem depender de leilões.

É o caso da Ferrogrão, idealizada por gigantes do agronegócio dispostos a investir R$ 12,7 bilhões entre Sinop (MT) e Miritituba (PA), e capaz de encurtar o percurso em quatro dias. “O ministério tem se mostrado presente em diversas instâncias e regiões do país. Identificou o que era emergencial, como a operação em torno do escoamento da safra, e tem clareza da importância do planejamento, da elaboração de projetos, do diálogo”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Venilton Tadini.

João Doria governador de São Paulo: “O Tarcísio é uma vitória Para o Brasil. Ele carrega o mastro e a bandeira da desestatização” (Crédito:Andrea Felizolla/FramePhoto/Folhapress)

Com extensa experiência no setor de infraestrutura, o engenheiro demonstra intimidade com o tema também nas redes sociais, num estilo de comunicação alinhado ao novo governo. Em 31 de dezembro, antes mesmo de assumir o cargo, ele abriu perfis nas principais redes. Só no Instagram (@tarcisiogdf) já publicou mais de 170 fotos documentando reuniões, anúncios, vistorias em obras e inaugurações. Pela conta @tarcisiogdf publicou mais de 500 tweets, a maioria de mensagens estritamente técnicas e a respeito do seu trabalho, sem entrar em polêmicas, ao contrário de colegas de esplanada.

Sua trajetória no setor público demonstra afinidade com os gargalos da logística. De 2011 a 2014, ele foi diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Também coordenou a auditoria de transportes da Controladoria-Geral da União (CGU), integrou a missão brasileira no Haiti e a atuou como consultor legislativo da Câmara dos Deputados para a área de Desenvolvimento Urbano e Transportes. Seu último cargo foi no governo de Michel Temer (MDB) como secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). “Seus méritos se dão não só pelo conhecimento técnico, mas pela liderança e a tomada de decisão”, conta o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB).

PORTO DE SANTOS A capacidade de tomar decisão deve resolver outro impasse de anos da infraestrutura brasileira: os problemas de dragagem no porto de Santos. O terminal deve ser privatizado, assim como as outras Companhias Docas, que administram portos por todo o Brasil. O perfil de liderança também tem feito a diferença para frear o processo de judicialização que costuma atrasar a operação de projetos. Só no recente leilão de aeroportos, foram barradas dez ações. “Com órgãos de controle só tem dois tipos de relação: de suspeição ou de confiança. Nossa relação é de confiança.” Daí porque considere como mérito de sua gestão a realização dos 23 leilões, que haviam sido encaminhados pela gestão Temer. “Converso todo santo dia com investidores e eles estão doidos para investir no Brasil”, afirma Freitas. “Estão esperando um gesto, o compromisso do Brasil com a solvência.” Em outras palavras, a aprovação da reforma da Previdência, um assunto para outros colegas de Esplanada.