Poucos banqueiros no Brasil podem se orgulhar de haver feito algo além de manusear dinheiro ao longo de suas vidas. Eudoro Villela, que morreu na semana passada aos 93 anos, era uma dessas exceções. Um dos últimos representantes da geração que transformou o Brasil de país agrícola, no início do século, a potência industrial, nos anos 70, Villela cumpriu uma biografia que parece obra de ficção.

Nascido em Vargem Grande do Sul, interior paulista, ele formou-se em medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Queria seguir a carreira do pai, membro da equipe que descobriu o microorganismo causador da doença de Chagas. Em 1931, quando era professor do Instituto Oswaldo Cruz, obteve uma bolsa da Fundação Gaffré-Guinle e foi trabalhar em Paris, no instituto de Madame Curie. Nessa época, desenvolveu uma técnica para identificação de tumores malignos (?Rio-Hortega-Villela?) que é utilizada até hoje no diagnóstico de câncer. Mas estava prestes a dar uma guinada em sua carreira.

Pesquisador respeitado, que publicava dezenas de trabalhos científicos, ele aproveitava o tempo livre para visitar centros de tecnologia na Europa. Até que em Estocolmo, na Suécia, Villela conheceu um método novo para tratar chapas de fibra de madeira. Ao retornar para o Brasil, sugeriu ao sogro ? Alfredo Egydio de Souza Aranha, dono do Banco Federal de Crédito ? a criação de uma fábrica que explorasse a tecnologia no País. Nascia a Duratex, durante anos uma das empresas mais lucrativas do grupo.
Eudoro tornou-se um dos diretores do banco. Quando Alfredo Egydio faleceu, em 1961, ele tomou a frente dos negócios, ao lado do primo e sócio Olavo Setúbal. Iniciou um projeto de expansão. Achava melhor ser presidente de um banco grande, dividindo o poder, do que ser dono de uma casa pequena onde reinasse absoluto. Deu início a uma série de incorporações que formaram o Itaú. O nome veio de um dos bancos adquiridos e significava ?pedra preta? em tupi. Naquela época, bancos atendiam basicamente a aristocracia rural, mas Villela viu que poderia crescer com a classe média urbana ? que, com a industrialização, despontava para o sistema financeiro. Modernizou a administração do banco, dando bônus aos funcionários bem-sucedidos.

Nos anos 70, com a compra do Banco Português, o Itaú tornou-se a segunda instituição do País em volume de depósitos. A expansão foi coroada no ano seguinte com a aquisição do Banco União Comercial, ele próprio produto de uma série de oito fusões. Assim o Itaú estabeleceu-se como o segundo do País em volume de ativos. Em 1975, Villela deixou a presidência por uma cadeira no conselho. Nos últimos anos o patriarca sofria com problemas de saúde, após uma série de derrames. Na terça-feira 17, em sua casa, sofreu uma parada cardíaca. Deixou uma viúva, Maria de Lourdes, e uma filha, Maria de Lourdes Villela, a Milu, presidente do Museu de Arte Moderna. O outro filho do casal, Alfredo, morreu em um acidente de avião em 1982. Eudoro deixa quatro netos.