A provada pela Câmara dos Deputados no dia 1º de setembro, a partir do texto do relator, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA), a versão da proposta de reforma tributária que segue para o Senado a traz várias alterações sobre a original. E, surpreendentemente, algumas delas são benéficas para o contribuinte e para o investidor. Insaciável e implacável, o Leão que simboliza o Fisco aproveitou para tirar um cochilo em sua sanha arrecadadora. Como o texto ainda pode mudar antes de ser submetido à apreciação e aos eventuais vetos do presidente da República, é bom não contar muito com o sono da fera. No entanto, os especialistas ouvidos pela DINHEIRO avaliam que, se as mudanças não forem retiradas do texto, a vida do investidor e do contribuinte ficará mais fácil.

Para começar, houve a tão esperada correção monetária da tabela de isenção no Imposto de Renda da Pessoa Física. Antes em pouco mais de R$ 1,9 mil, o limite de isenção foi elevado para R$ 2,5 mil. “Já não era sem tempo, fazia vários anos que esse valor não era corrigido”, disse a professora de gestão tributária da Fecap, Isabella Gomes.

Outra alteração, com menos efeitos, manteve o instrumento dos Juros Sobre Capital Próprio (JCP), embora tenha anulado seu efeito de abater a base de arrecadação. Ao lado dos dividendos, os JCP eram a principal maneira de as empresas remunerarem seus sócios. A diferença é que os dividendos eram isentos de impostos para o acionista e os JCP não, mas serviam para a empresa reduzir seu imposto a pagar. Essa função sumiu, e agora os dividendos serão tributados em 15%.

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“O proprietário, no geral, terá vantagens em atualizar o valor patrimonial do imóvel para fins fiscais” Cleiton dos Santos Felipe, diretor da BDO.

Isso representa um alívio na mordida. A proposta original era de tributar os dividendos em 20%, mas isso provocaria uma distorção na comparação com a tributação dos fundos de ações, que pagam apenas 15%. “Ao uniformizar a alíquota, a proposta facilitou a vida do investidor”, disse Limerci Cavariani Junior, advogado especialista em planejamento patrimonial do escritório WHG.

Segundo ele, outras medidas que vão facilitar a vida do investidor são a alteração na tributação das aplicações em ações. A legislação em vigor trata diferentemente as compras e vendas realizadas no mesmo dia, conhecidas como “day trade”, e as compras e vendas realizadas com prazos mais longos. O lucro destas é taxado em 15%; o das operações de curto prazo é de 20%. Agora, valerá só a alíquota menor. Para o advogado, a principal alteração é a mudança no prazo de cálculo dos impostos sobre compras e vendas de ações. Atualmente, há uma isenção para transações de até R$ 20 mil por mês. A nova regra prevê uma isenção de R$ 60 mil por trimestre. Parece não haver nenhuma diferença. No entanto, o prazo maior permitirá ao investidor usar melhor os recursos de compensação de ganhos e perdas, e também permite mais flexibilidade nas transações.

IMÓVEIS A permissão de atualização monetária do valor dos imóveis para efeitos fiscais não sofreu alterações na passagem pela Câmara. Segundo Cleiton dos Santos Felipe, diretor da empresa de auditoria e consultoria BDO, esse item da proposta não é exatamente uma mudança tributária, mas um recurso de que se serve o governo para antecipar a arrecadação. Pela legislação atual, o ganho de capital na venda de imóveis com valor superior a R$ 440 mil é tributado. A alíquota varia de 15% a 22,5%, dependendo do valor do imóvel.

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“Ao mudar a apuração dos ganhos com ações de mensal para trimestral, a proposta facilita a vida do investidor” Limerci Cavariani Junior, advogado.

A proposta em análise permite ao contribuinte corrigir o valor do imóvel para fins fiscais, pagando um imposto de ganho de capital de apenas 4% para imóveis no Brasil e de 6% para imóveis no exterior. Para o diretor da BDO, isso vale a pena na maioria dos casos. Por exemplo, se o contribuinte pretende vender o imóvel no curto prazo. “Caso contrário, será preciso fazer contas para ver se vale a pena desembolsar esse dinheiro agora”, disse. A proposta deve limitar essa atualização ao período entre 1º de janeiro e 29 de abril de 2022, para já constar da Declaração de Ajuste Anual do ano que vem.

Segundo Felipe, porém, a proposta ainda não definiu se a isenção para imóveis comprados há muito tempo será cancelada pela atualização patrimonial. Atualmente, imóveis adquiridos antes de 1969 são isentos desse imposto, e a isenção decresce 5% ao ano até imóveis comprados em 1988. “Ainda não está definido se a atualização vai anular essa vantagem. Se isso ocorrer, o proprietário tem de fazer contas”, afirmou.