A taxação dos dividendos é um assunto que paira no horizonte do investidor desde a campanha presidencial. No fim de janeiro, o assunto ficou sério quando o ministro da Economia, Paulo Guedes, abordou o tema durante o Forum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, a um grupo seleto de executivos do mercado financeiro. Ele sinalizou que pretende taxar os dividendos do investidor no Imposto de Renda do investidor – como era feito até 1995. Como contrapartida, haveria uma redução na carga tributária das empresas. No entanto, Guedes não detalhou como isso seria feito. O tamanho da potencial mordida do leão é, portanto, uma incógnita. “Existe grande chance desse projeto sair do papel, mas não sabemos o formato”, diz o advogado Alessandro Amadeu da Fonseca, sócio do Mattos Filho. Para ele, “o importante é que a mudança seja atrelada à redução do imposto das empresas”.

Especialistas acreditam que a tributação de 34% que incide sobre as companhias pode ser diminuída para 20%, enquanto a taxação prevista para os dividendos será de 15%. Esse é o mesmo percentual que já incide sobre o pagamento de Juros sobre Capital Próprio (JCP), outra forma de pagamento de proventos. “O objetivo dessa mudança é criar condições para os empresários elevarem os investimentos e, portanto, entregarem maiores lucros aos acionistas”, diz Giancarlo Chamma Matarazzo, sócio da área tributária de Pinheiro Neto Advogados. Há efeitos colaterais. Fonseca pondera que somente a taxação dos dividendos – sem estar atrelada à uma redução de impostos –poderia afetar a atratividade de investidores estrangeiros.

ALTERNATIVA Para Marcos Peixoto, sócio da XP Investimentos, se os dividendos passarem a ser taxados, as companhias podem driblar os efeitos nocivos ao substituir o pagamento deles pela recompra de ações. “Nos Estados Unidos isso é comum, e acaba sendo uma vantagem para o acionista, pois a operação valoriza a ação”, afirma. “Uma coisa pode neutralizar a outra”. Peixoto avalia a discussão como incipiente, e por isso, a possível taxação não modifica a sua estratégia para os três fundos dedicados a dividendos que administra, com cerca de 10 mil cotistas e cujo patrimônio soma R$ 1 bilhão. O portfólio engloba 15 empresas e a sua joia da coroa é a Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), que lucrou R$ 1,36 bilhão em 2017 e paga dividendo de quase 20% sobre o valor da ação. “Esses fundos são produtos de grande atratividade”, diz.

CTEEP: a companhia é uma das maiores pagadoras de dividendos do País

A preferência tem fundamentos. Um levantamento preliminar feito pela DINHEIRO com os dados da empresa de informações financeiras Economatica mostra que o pagamento de dividendos cresceu acentuadamente em 2018 em relação ao ano anterior. No total, os proventos pagos por 553 ações somaram R$ 220 bilhões no ano passado, alta de 59,4% ante 2017. Peixoto explica que em 2014 e 2015, em meio à recessão, as empresas preferiram segurar a distribuição de dividendos para terem recursos e investir sem recorrer a empréstimos, evitando assim o aumento da alavancagem. “Vale e Petrobras fizeram isso”, diz. Diante da recuperação da atividade econômica, as companhias estariam distribuindo os lucros com atraso.

Em 2018, o pagamento de dividendos – aqueles que isentam o acionista de imposto – cresceu de R$ 49 bilhões para R$ 119 bilhões, um avanço de 142,8%. Especialistas são unânimes em avaliar que a distribuição de dividendos é um importante atrativo para o mercado de renda variável. Por isso, a preocupação dos empresários e investidores com a taxação é crescente, especialmente pela falta de informação concreta sobre o assunto. “Não temos visto essa discussão de forma aberta no governo”, diz Fernando Tonanni, sócio do Machado Meyer Advogados.

Para Fonseca, do Mattos Filho, a mudança pode partir do projeto de lei 7274, de 2014, que está arquivado desde 2015 na Câmara e prevê a revogação da atual taxação dos dividendos vigente no País desde 1995. “Geralmente, mudanças como essa partem de um projeto que já tenha sido abordado em comissões da Casa”, diz. Na avaliação de Matarazzo, do Pinheiro Neto Advogados, essa discussão deve acontecer no Congresso no segundo semestre, depois que a reforma da Previdência estiver definida. “Qualquer mudança só passa a valer no começo de 2020”, diz.