É do ministro Paulo Guedes a avaliação figurativa, dias atrás, sobre o tamanho da queda do PIB, comparável, no seu entender, ao impacto de um raio que caiu em abril e que somente agora fez barulho. Sobre as vítimas do raio, nenhum comentário. Ele próprio desponta como o mais afetado pelo fenômeno. Guedes já não é mais o mesmo. Não professa pelo ideário liberal e, ao contrário, até prega ideias antes impensáveis em se ouvir da boca dele. O ministro passou a falar, por exemplo, no aumento do teto salarial do funcionalismo público, dentro do intuito de valorizar a “meritocracia”. Como assim? O czar da economia, o “Posto Ipiranga” que defendia ardorosamente o enxugamento da máquina, o fim dos benefícios e privilégios, o tratamento equânime de servidores e profissionais da iniciativa privada, resolveu dar um cavalo de pau nas convicções para defender o que abominava? A troco de quê? Muitos apontam que o convicto do “Estado mínimo” cedeu lugar ao auxiliar eleitoral do chefe. Mero consultor e atendente de suas vontades. Em toda a Esplanada e mesmo entre as pedras que cercam o Palácio do Planalto, não há quem duvide do encolhimento da missão a Guedes atribuída. Quem manda hoje efetivamente na pauta fala em aumento dos gastos em obras, do congelamento de medidas tributárias incômodas, do tratamento diferenciado para militares, juízes e quetais. Na interlocução com o Congresso, não é mais Guedes quem dá o tom. Seus palpites sequer são considerados.

O rompimento – dessa vez parece definitivo – com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, selou seu prestígio por ali. A conversa agora está em outra esfera. Antigos desafetos como Rogério Marinho, que comanda a pasta do Desenvolvimento Regional, passaram à condição de mandachuva e interlocutor preferencial. Generais, e a caserna, que cercam Bolsonaro não dão mais ouvidos ao antes poderoso ministro. O mandatário em pessoa também faz pouco caso do subordinado. Já o considera até substituível e aguarda apenas o momento adequado para fazer a troca. Nesse contexto, o mercado alimenta o receio crescente de uma nova cadência nas hostes da gestão econômica. Temem a possibilidade de o presidente virar, por assim dizer, “uma nova Dilma”, vindo a gastar mais do que pode. Seria um desastre. Não apenas do ponto de vista da saúde das contas da União. A pedalagem levaria ao caos e, provavelmente, ao impedimento. Guedes, antigo guardião da disciplina fiscal e financeira, não possui mais os instrumentos e a respeitabilidade para garantir a meta, o teto, e frear os abusos. O raio de abril pode e deve ter feito um ruído tardio, mas o estrondo de uma hecatombe dessa magnitude será sentido na hora e com um impacto, certamente, muito mais avassalador.

Carlos José Marques, diretor editorial