Quando o democrata Joe Biden acordar no dia 20 de janeiro, faltando poucas horas para tomar posse como o 46º presidente dos Estados Unidos, estará cercado de todos os mimos a que apenas chefes de Estado têm direito quando se hospedam na Blair House, em Washinton D.C. A apenas 150 metros da Casa Branca, ela é considerada o hotel mais exclusivo do mundo — e recebe apenas convidados da presidência dos EUA.

Foi Jimmy Carter quem iniciou a tradição de se hospedar ali antes da posse. Em 1976, ansioso por dar início à sua gestão, ele fez da Blair House a base de operações durante o período de transição presidencial. A partir de então, cada presidente passou a se hospedar por lá nos dias que antecedem o juramento. Até mesmo George H.W. Bush, que por ser vice-presidente de Ronald Reagan já tinha residência próxima à Casa Branca, seguiu o costume e passou na guest house as três noites que antecederam sua posse. Levou toda a família junto, inclusive os netos.

Construída em 1824, a Blair House ganhou relevância política em 1837, quando Francis Preston Blair, editor de jornais e conselheiro político, fixou nela residência com a família. A casa só seria adquirida pelo governo americano em 1942, a pedido de Franklin Roosevelt. A necessidade veio do crescimento abrupto de visitantes oficiais, em meio aos esforços dos Aliados durante a Segunda Guerra Mundial. Mas a gota d’água para que a aquisição fosse autorizada foi a estadia de Winston Churchill na Casa Branca, em dezembro de 1941, quando o primeiro ministro britânico comeu, bebeu, fumou charutos e vagou pelos aposentos privados da família Roosevelt madrugada adentro. Outras três casas vizinhas seriam anexadas anos depois.

Parte do complexo que abriga a sede do governo federal dos EUA, o imóvel hospeda apenas líderes escolhidos pelo presidente americano, com suas respectivas famílias e comitivas. É uma deferência que não cabe a qualquer governante, mas foi dada aos quatro últimos presidentes do Brasil. Jair Bolsonaro foi a convite de Donald Trump. Dilma Rousseff e Lula, de Barack Obama. Mas foi Fernando Henrique Cardoso o último a fazer uma visita de Estado, em 1995, durante o primeiro mandato de Bill Clinton. Ele recebeu todas as honrarias, incluindo conversas privadas com os presidentes da Casa Legislativa e do Judiciário.

Além de governantes, a Blair House também sedia jantares e recepções oficiais, caso da reunião de cúpula de ministros do exterior do G8 em 2012, comandada pela então secretária de Estado Hillary Clinton. As famílias de ex-presidentes americanos falecidos também podem se hospedar por ocasião do funeral, como fez em 2007 a ex-primeira-dama Betty Ford, que ali recebeu as condolências pela morte do marido, Gerald Ford.

CINCO ESTRELAS Ainda que mantenha seu nome original, a Blair House é hoje formada por quatro casas conectadas, com 120 cômodos e área total de 6,5 mil m2. À disposição em tempo integral, uma equipe de 18 funcionários supervisiona qualquer problema durante a estadia. O imóvel tem 14 suítes, três salas de jantar formais, duas salas de conferência, cozinhas quente e fria com chef executivo e subchefe, salão de beleza, academia, lavanderia, jardins e pátio interno. A biblioteca era o local favorito de Chelsea, filha de Hillary e Bill Clinton, para fazer a lição de casa. Ali estão reunidos mais de 1,5 mil livros com temas americanos, e outros tantos doados por hóspedes estrangeiros sobre seus países de origem. Nos ambientes, chamam atenção as capas de assentos bordadas por esposas de membros do Gabinete de John F. Kennedy, vistosos lustres de cristal, coleções de arte, papéis de parede e murais pintados à mão por artistas como o nova-iorquino Robert Jackson.

Quando um convidado estrangeiro se hospeda na Blair House, a bandeira de seu país é hasteada em frente à residência. Ao deixá-la, o protocolo prevê a assinatura do livro de visitas, unindo agradecimentos com os dizeres de convidados como a Rainha Elizabeth II, os ex-presidentes Boris Yeltsin, François Mitterrand e Nelson Mandella, entre muitos outros. Uma espécie de livro de ouro autografado que, a propósito, fica muito bem guardado no interior de um cofre.