Quando o chef Alex Atala abriu as portas do restaurante D.O.M., em 1999, muitas pessoas torceram o nariz. Localizado nos Jardins, bairro nobre de São Paulo, o D.O.M. nasceu com o propósito de mostrar a qualidade da gastronomia brasileira num ambiente em que a culinária europeia era sinônimo de sofisticação. Atala arriscou-se para provar que os temperos e os ingredientes locais tinham personalidade e condições de serem reconhecidos mundialmente. Ele não estava enganado. Em 2015, seu restaurante recebeu duas estrelas do Guia Michelin, o principal e mais importante roteiro da gastronomia. De quebra, o Dalva e Dito, que também pertence a Atala, ganhou uma estrela. Agora, o cozinheiro quer surpreender mais uma vez: vai colocar sua marca em um hotel. “Chega um ponto da carreira de um chef que ele abre várias casas ou o caminho natural é ir para a hotelaria”, diz Atala, em entrevista à DINHEIRO. “Esse sempre foi o meu sonho.”

O hotel D.O.M., sonho do chef mais premiados do Brasil e um dos mais reconhecidos internacionalmente, vai se materializar na esquina da rua Augusta com a alameda Franca, a poucas quadras do estrelado restaurante. Com investimento inicial de R$ 160 milhões, em parceria com a boutique americana de investimentos TAG e com a empresa imobiliária Inovalli, o edifício de 35 andares estará pronto em 2021 para acolher e servir pessoas de todo o mundo. Cerca de 60% do público do D.O.M. e do Dalva e Dito são estrangeiros que vêm para São Paulo a negócios. “Unir a gastronomia com a hotelaria parece a harmonização perfeita para Atala”, diz Amnon Armoni, coordenador do MBA em Gestão estratégica de Negócios da FAAP.

Nos próximos três anos, o desafio é conseguir levar o mesmo conceito de valorização da matéria-prima brasileira utilizada na culinária para o hotel. O projeto arquitetônico assinado por Gui Mattos vai priorizar a estética e materiais locais. A ideia é tornar o hotel 100% sustentável, com reuso da água e aproveitamento máximo dos alimentos. Mas a primeira barreira encontrada é a captação de energia solar, que não é tão eficiente em paredões de 90 graus. “Eu entrego Brasil, esse é meu diferencial”, diz Atala. “É o que as pessoas vão encontrar lá.”

Sonho grande: desenho do hotel D.O.M., que será construído em São Paulo. A previsão de inauguração é em 2021 (Crédito:Divulgação)

Prestes a completar 50 anos, idade em que alguns dos maiores chefs do mundo, como o francês Joël Robuchon e o espanhol Ferran Adrià, deixaram o dia-a-dia da cozinha, o brasileiro não pensa em abandonar as panelas. Ele quer que o hotel seja parte de um grande trabalho de inclusão social. Um dos projetos é recrutar jovens talentos da gastronomia, de diversas localidades do País, para desenvolver pratos criativos para os hóspedes. Além disso, Atala deseja dar movimento para o espaço. Por isso, uma área verde de uso público também ganhará vida nos arredores do empreendimento. “De todas as coisas, essas são as partes que me tocam mais”, diz Atala.

A migração de gastronomia para o ramo hoteleiro não é um movimento novo. No Brasil, a família Fasano, tradicional na gastronomia paulistana desde o início do século 20, criou o seu hotel em 2003. Quatro anos depois, com o grupo JHSF, de Zeco Auriemo, expandiu a rede para o Rio de Janeiro. Foi o início de uma sociedade que consolidou a marca Fasano no setor, inclusive com presença internacional – no balneário uruguaio de Punta del Este. No exterior, o renomado chef japonês Nobu Matsushita é o destaque. Dono de um restaurante japonês considerado um dos dez melhores do mundo, Matsushita criou o hotel que leva o seu nome em sociedade com o ator americano Robert DeNiro. São 14 unidades pelo mundo. Em breve, o Nobu Hotels abrirá suas portas no Brasil, em parceria com a Adress Consulting. “Eles já possuem vários hotéis pelo mundo e São Paulo está nos seus planos”, diz Gabriella Otto, sócia da GO Consultoria, especializada em gestão e estratégias de luxo.

Na América Latina, o Brasil é o terceiro país com maior potencial de crescimento no setor de hotéis de luxo, segundo pesquisa da Marriott International Luxury, grupo dono de marcas como The Ritz-Carlton. Além de oitos novos hotéis que o grupo Marriot pretende abrir no País, a grife carioca de Oskar Metsavaht deve contribuir com a expansão desse movimento. “Esse é um indicativo de que o segmento de luxo no Brasil está amadurecendo”, diz Gabriella. Por enquanto, Atala continuará concentrado na operação de seus restaurantes e na construção do hotel. O que muda a partir de 2021 é que ele também vai passar a oferecer café da manhã.