Roberto Campos Neto assumiu a presidência do Banco Central (BC) em janeiro de 2019 com um trunfo nas mãos e um desafio à frente. O trunfo foi ter encontrado a casa arrumada. Depois de vários anos de inflação acelerada e taxas de juros mantidas artificialmente baixas durante o governo de Dilma Rousseff, a situação voltara à normalidade. No jargão dos banqueiros centrais, Ilan Goldfajn, antecessor de Campos Neto, havia conseguido “ancorar as expectativas”. Em português de dia de semana: injetar confiança nos agentes econômicos de que a inflação permaneceria controlada e que o risco das aplicações financeiras e das decisões econômicas havia diminuído. Parece pouco, mas foi isso que permitiu a redução da Taxa de Juros referencial Selic ao patamar até então historicamente baixo de 6,50% ao ano, sem que os preços disparassem.

Goldfajn também começou a enfrentar o problema crônico da diferença entre o quanto os bancos pagam a quem neles investe, e quanto cobram para emprestar esse dinheiro. Ao regulamentar os empréstimos nos cartões de crédito e forçar os bancos a encontrar uma solução para as taxas salgadas cobradas no cheque especial, ele atacou diretamente o spread bancário, a taxa média cobrada pelos bancos que enrubesceria a maioria dos agiotas. Para enfrentar isso, ele lançou um programa de modernização do sistema financeiro brasileiro, batizado BC+.

Esse era o trunfo. E também o principal desafio do novo presidente do BC. Descendente de Roberto Campos, decano dos economistas liberais brasileiros, e com uma trajetória bem-sucedida na iniciativa privada e no sistema financeiro, era inevitável que o indicado para suceder Goldfajn tivesse seu trabalho comparado com o de seu antecessor. No entanto, Campos Neto veio, viu e venceu.

“A competição vai baratear, amplificar e incluir muito mais gente no sistema financeiro, e o resultado final é que todos vão sair ganhando”

Logo ao assumir, ele anunciou a ampliação do programa de modernização rebatizado para BC# (lê-se “BC hashtag”). Além de continuar enfrentando o spread bancário, Campos Neto lançou as bases das duas maiores revoluções na banca brasileira em décadas, o open banking e o Pix. O open banking pode ser explicado de maneira fácil. Ao servir-se de um banco por algum tempo, um cliente, pessoa física ou empresa, torna-se conhecido dessa instituição financeira, e esse conhecimento vale dinheiro. Não por acaso, os bancos defendem a identidade de seus melhores clientes mais ferozmente do que o numerário guardado em suas agências, para não aguçar a concorrência. O open banking muda isso. Com ele, as informações deixam de ser propriedade do banco, e passam a ser propriedade do cliente, que pode usá-las para fazer negócios com outras instituições financeiras de forma mais favorável. “A indústria bancária está deixando de ser apenas um processo de intermediação para ser uma indústria de serviços financeiros cada vez mais baseada em tecnologia”, disse Campos Neto à DINHEIRO. “Quanto mais informação a instituição tem, mas eficiente é o processo de intermediação.” Quando estiver totalmente operacional, em 2021, o open banking conseguirá baratear os produtos e serviços financeiros, reduzindo tanto as tarifas quanto o spread bancário. Isso com apenas um remédio, tão potente quanto consagrado: o aumento da concorrência. “Uma grande barreira à entrada para as pequenas empresas financeiras é exatamente não conhecer o cliente como o banco conhece”, disse o presidente. “Vamos promover uma competição que vai baratear, amplificar e incluir muito mais gente no sistema financeiro.” Ao democratizar o acesso a essas informações, com a devida autorização do cliente, o BC induzirá maior eficiência no sistema.

INSERÇÃO BANCÁRIA O open banking é apenas um lado da moeda. O outro é o Pix, um sistema de transferência de recursos operado pelo BC, e que permite remessas e pagamentos instantâneos. Desde 16 de novembro, esse serviço, que concorre com TED e DOC, muito bem cobrados pelos bancos, passou a ser prestado diretamente pelo BC. Gratuitamente para as pessoas físicas e praticamente de graça para as empresas. A principal vantagem econômica do Pix não é reduzir os custos de remessa para quem já tem conta em banco. É possibilitar aos cerca de 50 milhões de brasileiras e brasileiros desbancarizados participar do sistema. Uma multidão de cidadãos é privada do direito de ter uma conta bancária por falta de renda ou problemas de cadastro. O famoso “nome sujo”. Com o Pix, é possível remeter dinheiro e pagar contas servindo-se de um telefone celular e associando-se a uma empresa financeira mais simples que um banco. “O Pix democratiza os pagamentos e reduz as barreiras à entrada”, disse Campos Neto.

O presidente do BC está otimista. “Esse é o ciclo de modernização, e ele é muito inclusivo”, afirmou. “Com o aumento da bancarização e a maior segmentação do mercado, o resultado final é que todos vão sair ganhando.”

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