Estar entre os dez maiores contribuintes do Imposto de Renda no Brasil e ainda assim ser desconhecido do público é uma façanha. Os irmãos Rolf, Curt e Ursula Baumgart, donos dos shoppings Center Norte e Lar Center, na capital paulista e do grupo industrial que leva o nome de seu pai, Otto, conseguiram esta e outras. Sem jamais usar um centavo sequer de financiamento bancário e sem nunca expor o rosto na mídia, os três transformaram um grupo tipicamente industrial em um império imobiliário e um gigante dos serviços em São Paulo. A primeira virada, há vinte anos, foi a construção do Center Norte, então o primeiro shopping da pouco glamurosa zona norte e ainda hoje o maior e o de maior volume de vendas na cidade. A segunda guinada tomou corpo apenas há três meses e mudou de vez a cara do grupo. Os Baumgart inauguraram um sofisticado hotel quatro estrelas, a um passo do shopping e do centro de convenções do grupo, e tomaram gosto pela coisa. O empreendimento, que leva a bandeira Novotel e está localizado próximo a vizinhos inusitados, como a Rodoviária e o presídio do Carandiru, será ampliado de 286 quartos para 426 e ganhará um irmão mais novo. O grupo construirá na mesma área um hotel três estrelas, no estilo da rede Íbis. É dessa forma discreta e heterodoxa que o grupo se expande. Hoje, os terrenos que a família acumula em torno dos shoppings já somam mais de 500 mil metros quadrados, o que, pelos preços de mercado, corresponde a um patrimônio acima de R$ 400 milhões ? sem contar o valor dos empreendimentos construídos no local. Ninguém no grupo gosta de falar em números, mas segundo os balanços divulgados pelas empresas, apenas o Center Norte faturou R$ 46 milhões ano passado, e a área industrial, outros R$ 73 milhões.

 

Apostar em hotéis numa região pouco ?nobre? não parece inusitado para a família, estabelecida na zona norte desde que o velho Otto Baumgart começou a produzir o impermeabilizante Vedacit, em 1936, em uma fábrica no meio da várzea onde hoje há os bairros de Vila Guilherme e Vila Maria. O Expo Center Norte, o centro de feiras e convenções do grupo, garante hoje um giro sempre alto de pessoas de fora de São Paulo em seus eventos e, com isso, cria uma demanda pelo chamado turismo de negócios na região. Nada mais lógico, então, que o próprio grupo, maior proprietário de imóveis nas imediações, explorar essa demanda. ?Vem gente do Brasil todo para as feiras do Expo. Não tem sentido essa gente se hospedar nos Jardins?, explica Rolf Baumgart. Os investimentos no Novotel já consumiram R$ 30 milhões do caixa gerado pela indústria e pelos shoppings, e deverão absorver ainda mais R$ 10 milhões até o próximo ano. O hotel abriga desde junho os empresários que vão ao centro de convenções e, mesmo na baixa temporada, não tem ocupação inferior a 55%. O próximo hotel, de três estrelas, servirá para abrigar os executivos de nível médio que freqüentam as feiras. ?Nós é que geramos a demanda na região e queremos atendê-la integralmente?, explica Rolf.

Construir na zona norte significa valorizar o patrimônio da família. E novas aquisições não estão descartadas, segundo o gerente geral do grupo, Erwin Kaufmann. Nem sempre, porém, os imóveis figuraram com tanto destaque no portfólio dos Baumgart. As primeiras áreas, compradas pelo próprio Otto a preço de banana, eram regiões alagadiças e sem uso para construção. Esse problema foi resolvido por iniciativa de Curt, o mais velho dos três irmãos, que conseguiu um acordo com o governo do Estado, na época da construção do Metrô, para que a terra tirada dos buracos dos túneis fosse despejada em seus terrenos, para ser usada como aterro. Uma vez aterrada, a área chegou a ser embargada pela Prefeitura para fins tão diversos quanto a construção de um parque náutico ou uma estação de estrada de ferro, até que um decreto autorizou a construção do Center Norte. De lá para cá, a área se valorizou. No primeiro ano do Real, o metro quadrado na região valia R$ 500. Agora há quem o avalie em R$ 1.000.

Investir só com o capital próprio soa exótico e antiquado para o mercado, mas é uma estratégia fincada na cultura do grupo. ?Não sei se alavancar as empresas ia acelerar o retorno do capital. Acho que ia só aumentar os problemas?, afirma Kaufmann. Solidez e risco baixo estão sempre na mira dos Baumgart. ?Vemos os hotéis, os shoppings e o Expo como diversificação dos negócios e como patrimônio?, resume Rolf. A história já deu razão ao medo de alavancagem. A Veplan, incorporadora do Shopping Ibirapuera, chegou a propor sociedade aos Baumgart para fazer o Center Norte com financiamento. O grupo recusou e tocou o projeto sozinho. Já a Veplan foi obrigada a sair do Ibirapuera, enforcada com os bancos.
As diferenças de personalidade entre os três irmãos fazem com que o grupo abrace os novos projetos, mas se mantenha preso à tradição. Curt, engenheiro formado em Hannover, Alemanha, é o mais executivo dos três e o mais inquieto na busca por novos negócios. Recuperando-se de um tumor, voltou a trabalhar diariamente na sede da Otto Baumgart Indústria e Comércio. Rolf e Ursula são mais conservadores, como o pai. ?O ímpeto de um equilibra a cautela dos outros?, diz Kaufmann, há 35 anos junto dos irmãos. Rolf levou ainda para o grupo um ativo específico: seus hábitos sofisticados, como o de colecionar vinhos (é dono de uma das maiores adegas do Brasil) e dirigir Porsches, transformaram-se em negócio para o grupo quando ele interferiu pessoalmente em todos os detalhes da decoração do recém-inaugurado hotel quatro estrelas. A lista dos dez maiores contribuintes do País que vazou da Receita Federal no ano passado incluía Rolf e seus irmãos como parte de um grupo que contava com gente como o empresário da mídia Silvio Santos e o ex-banqueiro Aloysio Faria