Nas cercanias do Central Park, na segunda-feira 9, o presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu um compromisso decisivo para seu destino profissional. Durante almoço oferecido pelo representante brasileiro na Organização das Nações Unidas (ONU), embaixador Gelson Fonseca, ele reuniu-se com o secretário-geral da instituição, Koffi Annan, aceitou o convite para ser conselheiro especial do secretário e já acertou os primeiros detalhes de sua atuação. O presidente enfatizou não querer missões diplomáticas para assegurar pista livre para atuar como embaixador de alto galardão.

?Assessorar Koffi Annan está um degrau abaixo do que alguém com a estatura de Fernando Henrique deveria ocupar?, observa Nanci Valadares, PhD em Ciências Políticas pela Universidade de Nova York e coordenadora do MBA de Política Internacional da Fundação Getúlio Vargas. ?Ele governou um País com dimensões continentais e tem currículo para ir muito além do papel de conselheiro.?

Fernando Henrique enxerga a assessoria a Annan como um degrau para uma escalada que pode terminar na secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA). ?A avaliação do presidente é que a situação do mundo é mais perigosa e instável do que se imagina?, afirmou Benício Schimdt, professor da Universidade de Brasília e interlocutor freqüente do presidente. ?Na ONU, ele irá reforçar seu prestígio internacional, que já não é pequeno, e manter uma grande área de influência sobre os assuntos internacionais.?

As portas do circuito internacional de palestras também estão abertas ao presidente. Em janeiro, ele teria seu batismo em um evento promovido pela New York University ao lado do ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, que costuma cobrar US$ 100 mil por aparição. ?Um por cento desse valor já me faria contente?, costuma dizer Fernando Henrique. O mercado estima que ele poderia receber até US$ 20 mil por conferência. O presidente, todavia, dispensou a palestra de janeiro. Logo após deixar o poder, quer tirar férias de pelo menos dois meses em Paris. ?Quem vai querer me matar lá??, divertiu-se o presidente durante um coquetel oferecido pelo embaixador Fonseca na segunda 9. ?Se levar seguranças, acabarei virando intérprete deles.?

O passe de sociólogo de Fernando Henrique está sendo disputado pelas mais prestigiosas universidades do mundo. Ele tem convite para ser professor visitante da London School of Economics, na Inglaterra, e da norte-americana Princeton. Yale, Brown, Sorbonne e Harvard também fizeram ofertas, mas o presidente ainda não se definiu. Ele sabe apenas que os Estados Unidos deverão servir como segundo lar dos Cardoso. O presidente e sua mulher, Ruth, aceitaram uma oferta para serem pesquisadores e conferencistas da Biblioteca do Congresso. Ainda em Washington, ele irá co-presidir o Inter-American Dialogue, um dos núcleos de estudos não-governamentais mais respeitados do mundo. O presidente do Banco Mundial, Enrique Iglesias, por exemplo, está em seus quadros.

NA EUROPA
FHC vai presidir o Clube de Madri e terá companhia de Jospin e Blair, entre outros

Em terras européias, Fernando Henrique deverá presidir o Clube de Madri, uma junção de ex-presidentes e líderes políticos que incentiva o regime democrático em vários países. Em 2001, o presidente do Brasil foi aclamado por todos os 46 integrantes do Clube como novo líder do grupo, cujas atividades são apoiadas pelo secretário-geral da ONU e pela fundação do ex-presidente russo Mikhail Gorbachev. No clube, o presidente brasileiro irá juntar-se a políticos como os franceses Jacques Chirac e Lionel Jospin, o inglês Tony Blair, o italiano Romano Prodi, o português Antonio Guterrez, o holandês Wim Kok, o espanhol José Maria Aznar e o alemão Gerhard Schröder.

Quando estiver no Brasil, Fernando Henrique irá trabalhar no Edifício Esplanada, no centro de São Paulo, onde está sendo montado um escritório de mil metros quadrados. Lá serão guardados os mais de dez mil exemplares da biblioteca pessoal. ?Quero ler muito, escrever muito?, avisa o presidente, com duas obras encomendadas pela editora Record. A primeira deverá se chamar a Arte da Política. A outra, sobre economia, continua sem título definido.

Com estas possibilidades profissionais, Fernando Henrique já conquistou uma importante vitória. Não poderá ser enquadrado na ?síndrome do pato manco?, como são conhecidos nos meios diplomáticos os presidentes que, ao deixarem seus cargos, não têm para onde ir.