POR ALEXANDRE GARCIA*

Neste momento em que começamos a enxergar as luzes da retomada do mercado, quais ensinamentos podemos extrair, enquanto líderes, de um ambiente de negócios que acelerou ainda mais seu ritmo incessante de digitalização? Mesmo com os desafios e as incertezas do isolamento social, novas tecnologias nos permitiram testar  modelos inéditos de trabalho e de gerir empresas.
Penso que o primeiro aprendizado envolve a certeza de que, no mercado, não existem convicções inabaláveis e temos de estar sempre prontos para a mudança. E este último ano – que, sob diversos indicadores de antes da crise sanitária e social que vivemos, se apresentava como um período capaz de alimentar positivamente os ânimos do mercado – é uma prova cabal de que a economia e a própria dinâmica da sociedade estão sujeitas a imprevisibilidades que vão além dos mais acurados planejamentos.
Dentro desse contexto concomitantemente único e ineludível do mercado, outros dois ensinamentos se tornam evidentes. Um deles envolve a necessidade de resiliência para superarmos os desafios de um ambiente de negócios que – seja pela disrupção que rompe paradigmas mercadológico ou pelas crises que também o compõe – é circundado pelo imprevisível.
E aqui, não basta apenas vencermos obstáculos, precisamos enxergar nestes cenários desafiantes, oportunidades para inovar e crescer. Como reforça o estatístico e pensador líbano-americano, Nassim Taleb, precisamos parar de enxergar o elemento aleatório da vida e do mercado como um fator negativo. Ou, nas palavras de Taleb: “a incerteza é algo presente, desejável e necessária para a evolução.”
O outro insight que surge desta reflexão envolve a necessidade de sermos mais céticos quanto as promessas e certezas absolutas que surgem de tempos em tempos no mercado – mercado este, no qual, para citar o filósofo Heráclito de Éfeso, nada é permanente, exceto a mudança.
Isso não significa que não devemos estudar indicadores, tendências ou nos planejar. Pelo contrário! O único ponto é que um planejamento só é eficiente quando é flexível o bastante para abraçar novas estratégias que podem se fazer necessárias diante de diferentes conjunturas.

O trabalho híbrido e suas possibilidades

E isso vale para o momento atual do mercado em que discutimos, por exemplo, as transformações nas estruturas de trabalho nas empresas. Debates acalorados em torno da permanência plena do trabalho remoto, versus uma volta ao modelo tradicional de escritório parecem excessivos se, simplesmente, nos agarramos a uma ideia e desconsideramos os benefícios que a outra visão de negócio pode nos oferecer.
Sobre este ponto, me parece claro que, ao mesmo tempo em que extraímos e oferecemos vantagens para nossas equipes no trabalho remoto, é inegável que o contato humano e as trocas de ideias mais constantes estimuladas por um ambiente de proximidade nos fazem falta, mesmo com todos os avanços de uma tecnologia mais imersiva e eficiente para reuniões e contatos remotos.
Neste sentido, acredito que o trabalho híbrido tem a vantagem de não se assentar em uma possibilidade única de entendimento das relações de trabalho e favorece a construção de cenários mais adaptativos, conforme as necessidades que surgem nas empresas ou se apresentam no ambiente externo.
Como bem frisou Tim Cook no mês de março ao anunciar seu plano de trabalho híbrido para a Apple a partir de setembro, “a chamada de videoconferência diminuiu a distância entre nós, mas existem coisas que ela simplesmente não pode fazer”. E isso inclui o contato humano do dia a dia, a quebra do gelo entre líderes e colaboradores em um papo no café, a construção de amizades que fortalecem a cultura de uma empresa, as trocas criativas, os momentos de descompressão, o suporte mais próximo, as trocas culturais.

Alexandre Garcia, CEO do Cel.Lep
*Alexandre Garcia é CEO do Cel.Lep

Em complemento, dias de trabalho remoto continuarão fazendo parte de um mercado em que colaboradores também buscam mais flexibilidade, proximidade com a família e, cada vez mais, trabalham a partir de modelos de autogestão.
Com tudo isso, partindo da reflexão inicial, a retomada do mercado não significa renunciar a tudo que de positivo se colheu neste cenário desafiante – e nisso se incluem as inovações benéficas nos modelos de trabalho. Mas também não significa abrir mão do contato humano que faz evoluir culturas empresariais e a nós enquanto pessoas.
A proposta, por fim, é caminhar pelas vias que buscam absorver o melhor das possibilidades disponíveis – sem dogmatismos e cientes de que, num piscar de olhos tudo pode se transformar e deveremos traçar novas rotas a caminho do novo!