O Salão do Automóvel do terceiro milênio, que abriu suas portas na quinta-feira,12, em São Paulo, foi inaugurado tendo o estilo criado no passado como inspiração maior. Os carros-conceito, veículos que revelam tendências de mercado, como os vestidos exibidos pela alta costura mundial nos desfiles de Paris e Milão, mostram que o design dos anos 40 e 50 está bem vivo na memória dos projetistas das montadoras. O estilo retrô domina os lançamentos e dá novo rumo à passarela automobilística. Mas calma, caro leitor. Nem tudo é passado no maravilhoso mundo dos carros. Por dentro, ainda impera a tecnologia e a qualidade, que de mãos dadas tomaram conta da indústria nos últimos anos. E se isso tudo não bastasse, este é o Salão do Automóvel com o maior número de fabricantes em um mesmo país. Em nenhum lugar do mundo existem tantas marcas com fábricas instaladas. Enfim, a edição deste ano vai ficar na memória dos amantes do carro.

 

Um dos arautos dessa era é Bryan Nesbitt, o chefe do departamento de design da Chrysler. Saiu da ponta do seu lápis os esboços que se transformaram em uma das maiores atrações do evento, o PT Cruiser. O modelo é um furgão com desenho inspirado nos carros de entrega americanos da década de 40. O PT fez sua primeira aparição pública em 1998, no Salão do Automóvel de Genebra. Na época, era apenas um carro-conceito. Dois anos depois, seu estilo antiquado, aliado à tecnologia de ponta e a um motor de 141 cavalos de potência, conquistou o coração dos americanos. A fórmula do sucesso Nesbitt explica com simplicidade: ?Uni o melhor do passado com o melhor do futuro?.

Desenhar os carros de hoje, mirando as linhas dos modelos antigos pelo espelho retrovisor da história, não aconteceu por acaso. Quem aponta o caminho a ser seguido são os consumidores dos Estados Unidos. A razão é simples. Por ter o maior mercado consumidor de veículos e os maiores grupos de mídia do planeta, responsáveis pela disseminação do ?american way of life?, é natural que a indústria busque seguir uma linha que se assemelhe a essa cultura de consumo. Na década de 90, os consumidores americanos mostraram uma nítida preferência pelo estilo desenvolvido nos EUA entre o início dos anos 40 e o final dos anos 50. Esse anseio foi detectado pela indústria automobilística, que abriu seus velhos arquivos fotográficos para achar o desenho ideal. O resultado está nas ruas e atende por nomes como Chrysler PT Cruiser, Audi TT e Alfa Romeo Nuvola, todos presentes no Salão do Automóvel de São Paulo.

 

Para chegar ao design retrô ideal não basta ao projetista simplesmente pegar um carro antigo e copiar linha por linha dele. O consumidor de hoje é nostálgico mas quer estilo arrojado. A solução para isso passa obrigatoriamente pelo carro-conceito. No passado, eles eram apenas experiências de estilo, resultado da imaginação dos desenhistas que colocavam em um mesmo veículo todas as idéias de desenho e tecnologia que lhes vinham à cabeça. Ficaram famosos os automóveis como o Futura, da Volkswagen, um carrinho de linhas arredondadas que estacionava sozinho, com a ajuda de sensores e computadores. Na prática, o modelo futurista jamais foi posto em linha e hoje enfeita o museu da companhia na Alemanha. Depois de tantos anos fazendo carros-conceito sem um propósito maior, a indústria descobriu que esses exercícios de estilo eram poderosas ferramentas de aferição do gosto do cliente. Os modelos-conceito passaram a ter as rodas apoiadas na realidade das ruas e não mais na fantasia. ?Hoje, os carros-conceito nascem como produtos viáveis?, afirma Roberto Bógus, diretor de Marketing e Vendas da DaimlerChrysler para a América Latina.

Se por fora os automóveis foram desenhados com os lápis apontados há 60 anos, por dentro o que manda mesmo é a alta tecnologia. E nesse quesito, os carros estão cada vez mais parecidos com os aviões. O sedan de luxo Classe S, da Mercedes-Benz, por exemplo, tem 37 computadores que chegam até a corrigir os erros cometidos pelos motoristas na direção. O popular Palio, da Fiat, tem pedal de acelerador eletrônico, aposentando os velhos cabos de ligação com o motor, como nos grandes jatos comerciais. E o último lançamento da Ferrari, a 360 Spider, acelera de 0 a 100 quilômetros em cinco segundos. Toda essa tecnologia que era impensável comercialmente há 10 anos hoje está à disposição dos consumidores. Ou seja, o que era pura diversão dos projetistas foi incorporado ao departamento de marketing e vendas. Na maioria dos casos com uma roupagem retrô. Assim, quem estiver no Salão do Automóvel e se perguntar como será o veículo do futuro basta dar uma boa olhada nos carros-conceito expostos. Ou então, nos velhos álbuns de fotografia guardados em casa. Entre muitas
fotos amareladas provavelmente
estará um modelo que um dia será sucesso no futuro.

 

MANIA VERMELHA

Sono molto felice. A frase em italiano dita por Michael Schumacher, depois de se sagrar tricampeão de Fórmula 1 e tirar a Ferrari de um jejum de 21 anos, soou como garantia de lucros para a empresa em todo o mundo. O fenômeno acontece menos pela venda de carros e mais pelos negócios de merchandising. ?Devemos dobrar nosso faturamento?, diz Viviane Polzim, gerente de Marketing da FR, companhia que vende produtos Ferrari no Brasil. A explicação é simples. A produção anual da montadora é de 3,7 mil carros, vendidos por no mínimo US$ 300 mil cada. Ou seja, para bem poucos. Nem o lançamento da 360 Spider (foto), que estréia por aqui antes dos EUA, ajuda no incremento de vendas. Para expandir a receita só mesmo com merchandising. Há dois anos foi criada a Ferrari Idea Company, que cuida do licenciamento da marca. A expectativa de faturamento
para este ano, antes da vitória na F-1, era de
aproximadamente US$ 300 milhões.

O fim do jejum fará as vendas explodirem. No Brasil, o efeito deve ser o mesmo. A peça mais procurada, o boné vermelho, custa R$ 50, o que dá uma idéia do volume de dinheiro que virá por aí. Viviane conta que a legião de ferraristas no País aumentou com a entrada de Rubens Barrichello na escuderia. Mas há uma ressalva. Mesmo com o brasileiro na Ferrari, as vendas de produtos com a assinatura dele não são maiores do que os modelos simples, só com o símbolo do cavalinho. Afinal, todo ferrarista sabe que os pilotos passam mas Ferrari é para sempre.