Tente buscar a palavra Google no Google: o resultado são 42,4 milhões de respostas. A expressão God (Deus, em inglês) aponta para 60,7 milhões de sites. God, descobre-se, tem 45% de citações a mais na rede. É uma primazia eletrônica que pode estar com os dias contados. O Google vem aí com uma jogada que o fará, definitivamente, todo-poderoso ? e essa iniciativa, como tudo que ocorre no mundo pontocom, imediatamente aparecerá refletida nas respostas do serviço de busca. A companhia está próxima de quebrar um recorde e se transformar em uma das operações financeiras mais bem sucedidas da história, ao abrir seu capital na bolsa de valores. Até hoje, o IPO (a sigla em inglês para oferta pública de ações) de maior retorno arrecadou US$ 16,5 bilhões e foi realizado pela companhia de eletricidade da Itália, a Enel, em novembro de 1999. Outras marcas do setor de tecnologia como a Intel em 1971, a Apple em 1980 e a Netscape em 1995 nem chegaram próximas desse valor.

Os analistas acreditam que o Google tem condições de acrescentar a seu caixa US$ 20 bilhões e ainda gerar um efeito cascata positivo para outras empresas prestes a abrir capital. Na Securities and Exchange Commission, a agência reguladora do mercado acionário nos Estados Unidos, há 26 pedidos de companhias de tecnologia à espera dessa tão esperada estréia antes de iniciar a venda de papéis. Há a crença na volta dos bons tempos. É a expectativa de uma nova bolha na internet, semelhante a de 1999 e 2000.

Essa realidade é conhecida do presidente da brasileira NationSoft, Sergio Cavalcanti. Entre 1997 e 1998, ele fez MBA na universidade americana de Stanford, e conheceu de perto a bolha americana. Quando retornou ao Brasil como diretor para a América Latina do fundo de investimento Europ@web, foi o responsável por apostar em iniciativas como o site de comércio eletrônico Submarino e de leilões Lokau. ?A situação do Google não é tão fácil ?, diz Cavalcanti. ?O céu não é de brigadeiro e há muito vento pela frente.? Nada que fará frear a explosão de uma das grifes mais conhecidas do planeta. O Google foi escolhido pela consultoria Interbrand como a melhor marca de 2003, à frente de gigantes como Apple, IBM e Coca-Cola. Nos EUA, virou verbo. ?To google? significa buscar, procurar ? e achar. Na torre de marfim, ninguém os alcança. Mas há um fantasma, sim. Para variar ele atende pelo nome Bill Gates. A Microsoft já anunciou que a próxima versão do Windows virá com um sistema de busca anexado. Enquanto isso não ocorre, o Google sorri com os seus resultados.

JOVENS BILIONÁRIOS: Larry Page (à esq.) e Sergey Brin têm US$ 1 bilhão cada na conta corrente
A receita anual da empresa é um segredo que será revelado momentos antes do IPO. Estima-se que o Google tenha um faturamento anual entre US$ 60 milhões e US$ 100 milhões. Atualmente o modelo de negócios da companhia é baseado na venda de publicidade. No início, porém, a intenção era se consolidar vendendo tecnologia inovadora para concorrentes como o Yahoo! e o mercado corporativo. O Google pretendia ser um fornecedor de clientes interessados em encontrar dados, informações ou qualquer outro tipo de arquivo em suas redes internas ou na própria internet. Com o sucesso comercial da marca, o Google refez sua estratégia e passou a vender anúncios. É um tipo de publicidade diferenciada. A companhia foi a primeira a adotar a venda de palavras chaves para os seus clientes. Por exemplo: o site de uma indústria de sabonetes pode aparecer em destaque na resposta quando alguém buscar a palavra no serviço. Para cada novidade que elabora, o Google tenta encontrar um cliente interessado. Ao lançar o motor de buscas de notícias jornalísticas, o Google News, em 4.500 fontes de informações, a companhia descobriu a oportunidade de vender o recurso como clipping para grandes corporações. A IBM é cliente mundial do Google nesse serviço.

A trajetória do negócio é uma metáfora da era da informação. Reflete, como numa fábula, a transformação de jovens imberbes em mitos. Larry Page e Sergey Brin, os seus criadores, tinham apenas 24 anos quando defenderam a tese de PhD em Stanford que se transformaria na gênese dos lucros. Desenvolveram uma tecnologia, patenteada como PageRank (numa alusão a um dos fundadores, Page) que atribui hierarquia a cada página da internet de modo a estabelecer um ranking. Foi uma grande idéia ? ela os transformou, em nove anos, em bilionários. Page e Brin acabam de estrear na lista dos mais ricos do mundo, com US$ 1 bilhão cada um. O dinheiro pouco alterou o ambiente de trabalho na sede de Mountain View, no Vale do Silício.

Os mil funcionários, em sua maioria entre 20 e 30 anos – os ?googlers? – , andam de camiseta e bermuda. Muitos chegam de bicicleta e patinete. Alguns levam seus animais de estimação, que se acomo-
dam junto aos donos em suas salas. Uma mesa de sinuca e um restaurante arborizado servem aos funcionários no segundo andar. A recepção tem aquários com bolhas coloridas que sobem e descem,
um piano de cauda, um videogame antigo e pufs. Para entreter os visitantes, um painel atrás da recepcionista aponta o andamento das pesquisas realizadas por usuários em todo o mundo. É o ambiente perfeito para inovações.

O grande mérito do Google é a criatividade. Quando a empresa surgiu, a internet já tinha marcas fortes na área de indexação. Havia o Yahoo! e o Altavista que traziam as respostas sem hierarquia. Era como procurar uma agulha perdida durante a maratona de Nova York. ?A diferença deles é a excelência na precisão e na cobertura?, diz o professor Silvio Meira, da Universidade Federal de Pernambuco e um dos fundados do Radix, um serviço de buscas em português que já não existe mais na rede. Fenômeno de comportamento, ícone de uma geração, o Google recebe 200 milhões de pesquisas diariamente. Os 30 mil servidores de Mountain View vasculham 3 bilhões de páginas indexadas, num total de 4 trilhões de palavras. São cifras que apenas comprovam a força de seis letras com a cara do nosso tempo. Seis letras onipresentes que se transformaram em cifras espetaculares.

Colaborou: Duda Teixeira

TRÊS CENÁRIOS PARA O GOOGLE
Como o Netscape, que sucumbiu diante do poderio da Microsoft e do seu navegador Explorer, a empresa pode ter o mesmo destino e se tornar uma marca acorrentada ao passado da internet.
Seguindo o modelo Yahoo!, o Google tentaria várias apostas equivocadas antes da descoberta final do real destino da companhia no setor de entretenimento e mídia. Bem longe do seu perfil inicial na rede.
O melhor cenário seria a consolidação da hegemonia no serviço de buscas. Para isso, teria de vencer a disputa com a Microsoft, que promete lançar um Windows com sistema de busca anexado ao programa.