A poucos metros do prédio da reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Ilha do Bom Jesus, na capital fluminense, um moderno edifício horizontal envidraçado abriga o mais novo laboratório da gigante francesa L’Oréal, a maior fabricante global de cosméticos, dona de um faturamento de € 25,8 bilhões no ano passado. Inaugurado oficialmente na terça-feira 24, com investimento de R$ 160 milhões, o Centro de Pesquisa e Inovação, o oitavo da empresa no mundo, nasceu com a promessa de se tornar uma plataforma de expansão dos negócios da L’Oréal, além uma base de desenvolvimento de novas fórmulas para mercado local e para países com características semelhantes às do Brasil. “A indústria da beleza não é uniforme porque as características físicas da população também não são uniformes”, disse à DINHEIRO a presidente da L’Oréal Brasil, a belga An Verhulst-Santos. “Por isso é tão importante ter um centro de pesquisas dedicado a consumidores locais.”

O laboratório brasileiro da L’Oréal possui até uma divisão de cultivo de pele humana, criada a partir da reprodução de células reais, voltada a teste produtos – há cerca de três décadas a empresa não utiliza animais como cobaias. Mais de 100 cientistas e pesquisadores trabalham no local, focados principalmente nos estudos para os segmentos de pele, proteção solar e cabelo, o carro-chefe da marca no País. “O Brasil é um grande laboratóriopara nós graças à miscigenação de sua população e diversidade cultural”, afirma a francesa Delphine Allard, diretora de pesquisa e inovação. E ainda há muito espaço para crescer.

An Verhulst-Santos, presidente: “Esse centro de inovação reflete nossa confiança no potencial do mercado brasileiro e a certeza que as dificuldades são passageiras” (Crédito:Stephane de Bourgies)

De acordo com dados da Euromonitor, de 2015, a empresa francesa é a quinta colocada no mercado brasileiro, com 6,8% de participação. O ranking tem a Unilever no topo, com 12,2%, seguindo de Natura, O Boticário e P&G. A L’Oréal, que mantém três fábricas no Brasil, conta com 19 marcas e vende milhares de produtos, desde esmalte Colorama de R$ 2 a perfume Lancôme de R$ 400, não divulga seus números por região. No relatório global, no entanto, informa que o investimento total em pesquisa é de € 850 milhões por ano, cerca de 3,3% da receita em 2016. Em 2014, a empresa comprou a brasileira Niely por um valor não divulgado. Neste ano, vendeu sua marca The Body Shop para a Natura por E 1 bilhão.

A expansão das operações da L’Oréal no País não chama atenção apenas pelas dimensões, cifras e ambições cientificas, mas pelo timing. Apesar da ligeira melhora no consumo das famílias nos últimos meses, o momento da economia ainda inspira cautela. Até mesmo a indústria da beleza, historicamente uma mais resilientes às oscilações macroeconômicas, sucumbiu à crise. Em 2015, pela primeira vez em 23 anos, houve uma retração de 8%, com faturamento de R$ 42,6 bilhões, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). Em 2016, foi contabilizado um novo recuo, de 2,5%. “A recessão, aliada ao aumento da carga tributária, prejudicou demais o nosso setor”, garante João Carlos Basílio, presidente da associação. Com a retração, o Brasil caiu da terceira para a quarta colocação no ranking global dos maiores mercados do o setor de beleza, atrás de Estados Unidos, China e Japão.

O Centro de Pesquisa e Inovação da L‘Oréal, no Rio de Janeiro, é o oitavo da empresa no mundo e recebeu investimentos de R$ 160 milhões (Crédito:Benoit DECOUT | Divulgação)

A queda de 2015 e 2016 contrariou também o chamado “efeito batom”, que define o comportamento dos consumidores em tempos crise. É quando as mulheres, principalmente, aumentam seus gastos em produtos de estética para elevar a auto-estima. “Esse centro de inovação reflete nossa confiança no potencial do mercado brasileiro e a certeza que as dificuldades são passageiras”, disse Verhulst-Santos. “É certo que o País voltará a crescer.” As quedas, de fato, parecem ter ficado para trás. O setor de cosméticos deve crescer entre 1% e 3% acima da inflação em 2017, de acordo com a expectativa Abihpec.

“Vivemos a era da ansiedade e o Brasil é um dos países com mais pessoas ansiosas, segundo a Organização Mundial da Saúde”, afirma a especialista em varejo Fabiana Gilio. Segundo ela, esse fator deve continuar impulsionando a indústria da beleza, cujos produtos proporcionam bem-estar. “Mesmo que a economia não deslanchar nos próximos anos, o setor de beleza voltará a se expandir”, acrescenta. Se a previsão de concretizar, o velho efeito batom voltará a fazer sentido.