No fim de 2021 foi publicada uma mudança na legislação para modernizar um dos setores mais atrasados das finanças nacionais, a regulamentação das transações com outras moedas além do real. Já apelidada de “novo marco cambial”, a alteração reduz a burocracia nas entradas e nas saídas de recursos do País, além de eliminar vários entraves à transferência de recursos. “Esse novo marco cambial retira todo o entulho anterior deixado pelas regras que se acumularam desde 1924”, disse o sócio-fundador da Tendências Consultoria, Nathan Blanche, um dos maiores especialistas em câmbio do País.

A principais mudança para pessoas físicas é a elevação do limite de recursos em viagens internacionais. Anteriormente, o viajante só poderia levar (ou trazer) R$ 10 mil na bagagem, o equivalente a US$ 1,8 mil. O novo limite são US$ 10 mil, ou R$ 55,3 mil pelo câmbio da quarta-feira (12). Outra facilidade é que pessoas físicas poderão comprar e vender até US$ 500 em espécie em qualquer moeda estrangeira.

Fabiane Lazzareschi

“O novo marco cambial retira todo o entulho anterior deixado pelas regras que se acumularam desde 1924” Nathan Blanche sócio-fundador da Tendências consultoria.

Os investidores internacionais também poderão abrir contas em dólar no País. O fim dessa barreira representa um alívio para os expatriados que tinham de se entender com as regras bizantinas do sistema bancário. Também deverá destravar o caminho para que investidores internacionais de menor porte façam suas apostas por aqui.

Houve mudanças para as empresas também. As companhias exportadoras, que recebem em dólares ou em outras moedas, deixam de ser obrigadas a converter essas receitas para reais. Agora, elas poderão ter contas-correntes e pagar contas diretamente. Já os bancos e instituições financeiras ganharam a liberdade para captar recursos em reais e então investi-los no exterior. Tudo devidamente justificado perante o Banco Central (BC).

RESTRIÇÕES As dificuldades da legislação anterior tinham sua justificativa. Durante quase todo o século passado, o Brasil sofreu com a escassez de moedas fortes para pagar suas importações. Os poucos dólares que entravam tinham de ser usados para comprar petróleo e itens essenciais. Assim, era necessário dificultar sua saída. A situação mudou há alguns anos, mas a legislação não foi atualizada. Segundo a advogada e especialista em direito bancário do escritório Lefosse, Renata Cardoso, nos anos 2000 até se tentou fazer uma reforma, que não avançou. “Já a nova norma é mais ampla e permitirá maior flexibilidade”, afirmou.

Apesar de sancionada e já publicada, a nova lei só entrará em vigor efetivamente daqui um ano. Enquanto isso, ficará a cargo do BC definir como as mudanças vão funcionar na prática. Pelo novo marco cambial, algumas atribuições do Conselho Monetário Nacional (CMN) serão transferidas para o BC. Entre elas, a regulação das operações de câmbio, dos contratos futuros de dólar e a organização e fiscalização de corretoras que negociam com moedas. “O mercado ficará mais fluido e mais rápido, mais alinhado aos padrões internacionais”, disse Renata. “A falta de flexibilidade complicava a vida das multinacionais, que não podiam fazer a compensação privada de crédito ou realizar pagamentos em moeda estrangeira em território nacional.” A nova regra define que o BC terá todas as informações sobre o fluxo de dólares no País registradas eletronicamente. Para Blanch, da Tendências, a regra antiga ficou anacrônica dentro da realidade global atual e já devia ter mudado. “Essa atualização deixa tudo a cargo do BC, que é quem entende do assunto”, afirmou.