Impérios costumam virar ruínas vagarosamente. E o fatiamento do conglomerado de José Carlos Fragoso Pires, 80 anos, comprova a tese. O armador, que durante décadas comandou um próspero conglomerado com negócios que iam de banco a uma companhia de navegação e viveu como uma espécie de Onassis brasileiro, vê seu patrimônio se esvair em praça pública. Volta a ser notícia, agora, por ter colocado à venda seu maior símbolo de poder e status: um espetacular triplex de 3.800 metros quadrados na Praia do Flamengo, na zona sul do Rio de Janeiro, com vista para o Aterro e o Pão de Açúcar. 

 

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Considerado o apartamento mais luxuoso da cidade, está à venda por R$ 55 milhões — menos do que valeria caso ficasse em Ipanema ou no Leblon, os metros quadrados mais caros do País. Depois de perder a maior parte dos seus bens (leia quadro ao final da reportagem), chegou o momento de Fragoso Pires abandonar o imóvel que pertenceu ao playboy Jorginho Guinle e que foi cenário de festas capazes de reunir os mais importantes sobrenomes do País e consagrados convidados do jet set internacional. Mas um verdadeiro aristocrata sabe tombar com elegância – e até certa arrogância, marca comumente associada a Fragoso Pires. 

 

Através de seu advogado, Francisco Gaiga, ele disse à DINHEIRO que o motivo da venda é prático: ele e a mulher, Ângela, 64 anos, estão cansados do excesso de espaço e pretendem viver em um imóvel menor. De fato, já não há motivos para abrir os espaçosos salões. Ou mesmo verba para patrocinar os banquetes. Gaiga admite que seu cliente não tem mais nenhuma fonte de renda e precisa, eventualmente, se desfazer de algum bem para viver. Pires continua dono da Frota Oceânica, outrora sua joia mais reluzente. Mas ela não continua a mesma: há tempos deixou de ser uma empresa de proa no ramo da cabotagem e, da frota de navios, só restaram cinco, todos hipotecados pelo BNDES. 

 

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Onassis nunca mais: o magnata está vendendo o apartamento de luxo que pertenceu

ao ex-playboy Jorginho Guinle por R$ 55 milhões

 

Um deles, o cargueiro Angra Star, abandonado, encalhou na semana passada na baía de Guanabara, depois de ser saqueado, e ameaçava provocar um acidente ecológico. Por conta disso, a Frota Oceânica receberá multa milionária por deixar vazar para o mar uma parte dos 200 mil litros de uma mistura de óleo, água e areia encontrada em seus reservatórios. Fragoso Pires, porém, já disse que não é mais timoneiro do navio, que foi alugado pela Log-In (pertencente à Vale) e também está hipotecado pelo BNDES, e não vai, portanto, assumir a dívida pelo dano ambiental. De seu antigo império de 27 empresas, hoje apenas uma funciona e dá lucro, a Salinor, e já não é mais controlada por Fragoso Pires. 

 

“O grupo não tem mais praticamente nada em operação, com exceção da Salinor, que fatura R$ 20 milhões por mês. Mas o gestor se apropriou dela. Estamos tentando reavê-la na Justiça”, diz Gaiga, referindo-se à produtora de sal do Rio Grande do Norte. No início da década de 1990, o armador contraiu dívida junto ao BNDES, que não pôde honrar devido ao naufrágio de seus negócios. Desde 2004, corre ação na Justiça Federal do Rio para tentar quitar os débitos, avaliados inicialmente em R$ 149 milhões. Recentemente, foi pedida pelo juiz Vigdor Teitel a atualização desse valor, o que ainda não aconteceu. Nos 20 últimos anos, a rotina do armador tem sido lutar para sanear dívidas e quitar compromissos. 

 

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Navio encalhado: na baía de guanabara, o cargueiro angra star já foi saqueado

e pode provocar um acidente ambiental

 

O empresário chegou a contratar o banco suíço Union Bancaire Privé para reestruturar o grupo na década de 1990, sem sucesso. Atualmente, a gestão está com o economista José Hamilton Mandarino. Até a Companhia Nacional de Álcalis, que detinha o monopólio do fornecimento de barrilha (matéria-prima para a produção de vidros) no Brasil, encerrou suas atividades em Arraial do Cabo, na Região dos Lagos fluminense. A boa notícia no horizonte de Pires foi a nomeação, no mês passado, pelo Banco Central, de um novo liquidante para seu banco e corretora, ambos com nome Vega, e a autorização para que termine a liquidação extrajudicial iniciada em 1997. Com isso, parte dos ativos poderia ser recuperada. 

 

O liquidante Tupinambá Quirino dos Santos reconheceu À DINHEIRO que tinha prazos curtos e ainda estava levantando todas as dívidas e bens das instituições financeiras. “Tenho exigências a cumprir, e a intenção é devolver as empresas aos acionistas”, afirmou o liquidante. Gaiga informou que o objetivo não é a volta da operação do banco e da corretora, mas dividir o que sobrar com o sócio Antonio Carlos Coelho. Criador de cavalos de corrida, Fragoso Pires foi presidente do Jockey Club Brasileiro, entre 1992 e 2000. Deixou de frequentar clubes e eventos, mas continua dando expediente diário em seu escritório, no centro do Rio. 

 

Caberá, portanto, à sua mulher, Ângela, a tarefa de administrar as visitas de milionários interessados em comprar o triplex de cinco suítes, 11 quartos de empregados, jardim com árvores frutíferas na cobertura, dez vagas para estacionamento e elevador privativo. Amante de ópera, Ângela chegou a oferecer jantares aos tenores italianos Plácido Domingo e Luciano Pavarotti, em 1995, e é considerada ótima anfitriã entre os cariocas da alta sociedade. “Eu gosto muito do casal. A Ângela fazia um trabalho social lindíssimo”, diz a amiga Glória Severiano Ribeiro. “Nós ainda nos encontramos em alguns aniversários, mas o José Carlos quase não sai mais. Acho que eles estão vivendo a vida em família.”

 

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Colaborou: Mariana Brugger