“Precisamos nos transformar em uma ’empresa ESG’ antes do final deste ano. Assim que pegarmos esse ‘selo’, vamos seguir adiante para conversar com o mercado financeiro, potenciais sócios estratégicos e, quem sabe, até nos preparamos para uma possível abertura de capital. Em linguagem clara, precisamos dourar a pílula. Temos seis meses para fazer isso”.

Com essas palavras, o presidente do Conselho de Administração de uma empresa, que fatura quase R$ 1 bilhão e tem crescido cerca de dois dígitos nos últimos anos, concluiu a reunião de avaliação do semestre. E deu um direcionador estratégico para que o CEO começasse a tomar as devidas providências. A empresa pretende se capitalizar para maximizar o seu promissor potencial.

As letras ESG (da sigla em inglês para meio ambiente, responsabilidade social e governança, em tradução livre) estão em evidência e são importantes do ponto de vista de gestão e, sobretudo, na percepção do mercado financeiro. Fundos de investimentos estão avaliando as iniciativas ligadas às siglas para o direcionamento de seus recursos. Além disso, o mercado também tem considerado o ESG nas empresas candidatas à abertura de capital. Partindo dessa perspectiva, adotar esse conjunto de práticas pode ajudar na constituição de uma reputação cidadã e até agregar valor. O ESG também tem sido utilizado em campanhas publicitárias para atrair talentos, bem como conquistar e fidelizar clientes. De forma semelhante às empresas que anunciavam uma nova certificação ISO, começa a aparecer como assinatura de algumas marcas a expressão: “Somos uma empresa ESG”.

Ou seja, se você ainda não conhecia a sigla, preocupe-se, pois está um pouco desatualizado.

Contudo, embora tenha relevância significativa, o ESG, por si só, está longe de resolver os desafios da sobrevivência das organizações e assegurar o desempenho da operação em meio às imensas adversidades do presente ou, até mesmo, de garantir a continuidade dos negócios no longo prazo. Esse é o forte alerta que venho fazendo frequentemente a acionistas, membros de Conselhos de Administração e a dirigentes e gestores de inúmeras empresas. No mundo corporativo panaceias têm vida curta, embora, muitas vezes, no momento inicial da onda, sejam abraçadas com entusiasmo.

Em um momento complexo e rico em incertezas de toda ordem, as empresas não podem ter visão reducionista da realidade na árdua luta para garantir a sustentabilidade dos seus negócios.

Seria o mesmo que uma pessoa com sobrepeso tentar resolver problemas de glicemia, colesterol, triglicérides e pressão arterial procurando peças de vestuário com melhor caimento. A solução exige uma frente completa com mudança de hábitos alimentares, prática de atividades físicas e, se necessário, tratamento com medicamentos.

Ser ESG é uma obrigação e se trata de algo realmente necessário. Porém, ser ESG não é suficiente.

O ponto é que defendo incisivamente um mindset mais abrangente no comando das empresas. Isso significa dizer que a sigla ESG precisa ser complementada com outras letras e, se buscarmos simbologia em um elemento geométrico, certamente não estamos falando de um simples triângulo.

O vetor mais importante ou, até mesmo, central dentro de qualquer modelo de gestão é a Liderança, com “L” maiúsculo. Sem isso nenhuma empresa se autossustenta no longo prazo. Afinal, quantas vezes não vimos práticas ambientalmente amigáveis e socialmente responsáveis se dissolverem no enfrentamento da primeira crise? Há muitos exemplos em que o encolhimento do orçamento, infelizmente, varre conceitos altruístas. O que pode manter esse tripé da ESG ativo e o negócio vivo é a presença de líderes em quantidade e qualidade necessárias para executar a estratégia da empresa ou pilotar o imprescindível turnaround.

Desta forma, sempre que perguntam minha opinião sobre o projeto de transformar a organização por meio do ESG, incluo enfaticamente a letra “L”. Até já apelei para uma forma lúdica, dizendo que prefiro o “LESG” ao ESG. Já ouvi alguns argumentarem que a Liderança estaria dentro da Governança. Pode até estar num esforço conceitual, mas essa tese não se sustenta na prática. Ah, quantas empresas conheço muito boas no “G”, com processo decisório bem arrumado, alçadas definidas, vários mecanismos de gestão e comitês estruturados, controles e separação do patrimonial do gerencial, além do cuidado para não deixar a mesma pessoa acumular a posição de Chairman, no Conselho, e CEO, na gestão executiva. Tudo aparentemente perfeito. Entretanto, algumas dessas empresas bem arrumadinhas fracassam porque seus líderes são mais gestores do status quo do que transformadores na velocidade tão exigida nos dias de hoje. São empresas bem organizadas, mas que patinam pela falta de líderes protagonistas e empreendedores comandando as ações do dia a dia.

O papel da liderança é tão importante e determinante que deve ser ressaltado e não ficar implícito ou “escondido”, sob grande risco de camuflar o esforço necessário para fazer as empresas superarem seus desafios.

A análise do tema não para por aí. Ao aprofundar o pensamento, sem esgotar a abordagem dos vários fatores que podem levar empresas ao sucesso e à longevidade, entendo que mais três letras são fundamentais e não podem ser extraídas dessa equação. Estou falando do “C”, de cliente, “P”, de pessoas, e “R”, de resultados.

Nenhuma empresa será autossustentável no longo prazo se não tiver gestão eficaz da razão de ser de qualquer negócio: os Clientes. Sabemos também que sem políticas competentes para a gestão de Pessoas, capazes de atrair e reter talentos diferenciados, a empresa não sobrevive no médio prazo. E, atenção, não se engane: ainda não inventaram nada melhor que o binômio Clientes-Pessoas para gerar Resultados quantitativos e qualitativos relevantes para o negócio.

Repito que o ESG é muito necessário e fico feliz pelo fato de as empresas despertarem para a importância desses três fatores. Entretanto, é necessária a complementação com o CPR, além do fator liderança como fator de exponencialização.

Da mesma forma, para aqueles que argumentam que gestão de clientes, pessoas e resultados podem estar contemplados no conceito de boa governança, reitero o quão pode ser mais benéfico identificarmos com clareza cada um desses componentes. Assim, o guarda-chuva da palavra governança não tira a atenção que precisamos dar a esses fatores tão decisivos para o sucesso e sustentabilidade de um negócio.

Em tempos que, felizmente, muitos já despertaram para a necessidade imperativa de o Brasil fortalecer o estudo e conhecimento no STEM (da sigla em inglês para as disciplinas de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática), ouso propor uma “fórmula” para a equação de tantos fatores essenciais na longevidade saudável de uma empresa: (ESG x CPR)L = S.

Não há caminho fácil para se chegar ao “S”, de sustentabilidade. Ter o selo de “Empresa ESG” é um bom passo. Porém, proponho como próximo patamar promovermos a certificação de “Empresa ESG com Excelência na Gestão de Clientes, Pessoas e Resultados derivados do seu Capital Liderança”. É preciso se transformar, aprofundando pensamento e prática, para sermos agentes da transformação que as empresas necessitam!

*  César Souza é cofundador e presidente do Grupo Empreenda, consultor e palestrante em Estratégia, Liderança, Clientividade e Inovação. Autor de “Seja o Líder que o Momento Exige” é também coautor do recém-lançado “Descubra o Craque que Há em Você” (Buzz, 2020)