Foi um Deus nos acuda. O governo, para a surpresa de todo o mercado — e até mesmo da equipe econômica —, quis impor na marra um Auxílio Emergencial de sonoros R$ 400 a cada um das mais de 17 milhões de famílias de baixa renda a serem contempladas no programa. A União não tem em caixa recurso para pagar sequer os R$ 300 inicialmente aventados e, por obra e graça dos delírios gestados no Planalto, da noite para o dia, imaginou aplicar um benefício de R$ 400. Proselitismo político escancarado! Não há nada de bondade ou de comiseração com o sofrimento alheio na decisão. Jair Bolsonaro tem olhos exclusivos voltados para as urnas e busca armas que turbinem a batalha de campanha. O instrumento assistencialista em valor gordo tem o objetivo de angariar a simpatia dos mais pobres — uma camada da população na qual o mandatário vem experimentando queda recorde de popularidade. Os efeitos colaterais desse presentão fora de hora são os piores possíveis. A inflação, decerto, virá a galope com fôlego extra, o que, na prática, resultará no efeito aniquilador do benefício. Em outras palavras: o governo irá dar com uma mão e retirar com a outra. A clara ameaça de descontrole fiscal, com esse “Auxílio” vitaminado, estourando o teto de gastos, levará o País a uma política monetária mais austera. Dura mesmo, como já avisou o Banco Central, alertando para o drama de o governo enfrentar um colapso fiscal. Na ponta do lápis, o programa que substitui o Bolsa Família vai custar, em um ano, a bagatela de R$ 83 bilhões. Cerca de R$ 30 bilhões descaradamente fora do teto. Dentro da contabilidade criativa em andamento fizeram uma ginástica orçamentária que não para em pé. O mercado financeiro logo acusou o golpe e deu saltos pirotécnicos no câmbio, com o dólar sendo cotado a quase R$ 6, mesmo após intervenções da autoridade monetária. A bolsa despencou. Ao final e ao cabo do dia da notícia fatídica, na última segunda-feira (19), o governo resolveu adiar o anúncio, mas segue com a ideia fixa de cravar o número. Técnicos do Ministério da Economia ameaçam pedir o boné e sair em debandada, porque sabem da encrenca na qual estarão se metendo caso compactuem com essa lambança. Será assim mais um êxodo dos quadros da pasta, que desde o início assistiu à retirada de algumas de suas melhores cabeças. O czar Paulo Guedes, mesmo desmoralizado pela decisão do chefe, planeja ficar e, a contragosto, endossar o devaneio. A esmagadora maioria dos analistas está apontando que esse “Auxílio” fora do teto representará a completa desconstrução e ruína do regime fiscal brasileiro. A conta, naturalmente, ficará para depois. O estratagema é tão escancaradamente dirigido às eleições que tem previsão para funcionar por apenas um ano. Ou seja, logo após a abertura das urnas, saindo o resultado, a concessão deixará de vigorar, restando o rombo ao vencedor. Efetivamente foi resgatado o hábito da contabilidade criativa que, em outros tempos e de maneira semelhante, levou ao impeachment da presidente Dilma Rousseff. Com Bolsonaro será diferente?

Carlos José Marques, diretor editorial