Era por demais previsível a queda do titular da Receita Federal, Marcos Cintra, que acabou acontecendo na última quarta-feira 11, em meio a desentendimentos sobre a CPMF. Esse famigerado imposto, demonizado em praticamente toda a sociedade, era uma cisma do Secretário que, sem qualquer cabimento, tentava impô-lo à ferro e fogo, apesar das reações contrárias, inclusive do próprio presidente. A família Bolsonaro, incluindo filhos, e mesmo os aliados, passaram anos criticando o tributo. A sua inclusão no pacote da reforma se converteria, por assim dizer, numa espécie de estelionato eleitoral.

Tentou-se inventar uma nova sigla, a alíquota que inicialmente seria proposta na casa de 2% caiu para 0,4%, mas nada foi suficiente para levar tamanho despautério adiante. A Câmara dos Deputados já havia avisado que sequer cogitaria votar o tal imposto que, na prática, representa sim aumento da carga por todos os efeitos deletérios envolvidos. A ideia é de toda ruim. Trata-se de um imposto regressivo, penalizando mais quem ganha menos, em cascata, devendo recair com força sobre as cadeias mais extensas de produção, aumentando enormemente o custo final, e, principalmente: ao contrário do que se diz, ele provocaria a informalidade, estimulando os pagamentos e recebimentos fora do sistema, em moeda corrente.

Haveria a volta do velho conceito de se guardar dinheiro em casa, embaixo do colchão. Afinal, quem efetivamente iria aguentar ser tributado a cada vez que depositasse ou retirasse recursos das contas? Um sujeito comum receberia o salário em um banco e já levaria a mordida. Ao eventualmente transferir para uma próxima instituição seria taxado de novo. Tirando para pagar alguma compra, mais uma tungada, e assim por diante em cada transação. Que investimento, do ponto de vista das aplicações, seria atraente, em meio à queda dos juros, agregando uma mordida de 0,4% na entrada e na saída? A CPMF, com qualquer denominação, foi um desastre anunciado aonde chegou a ser implantada.

Ao menos 14 países a adotaram e sofreram reveses. Taxar movimentações financeiras ainda distorce os preços relativos dos mercados competitivos, como diz o professor e decano da economia, Delfim Netto, prejudicando a determinação do custo de oportunidade de cada bem quando se quer maximizar o bem-estar social. Torna, nas palavras dele, aleatória a incidência do tributo sobre a capacidade de pagar de cada contribuinte. Em resumo, premia a injustiça. Com a queda de Cintra, a proposta foi para a geladeira. Não sai mais, como determinou o presidente. Essa virada de quadro deve certamente impulsionar o ritmo de discussão e aprovação da reforma tributária por uniformizar entendimentos entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Já não era sem tempo!

(Nota publicada na Edição 1138 da Revista Dinheiro)