O decreto do presidente Donald Trump para frear temporariamente a chegada aos Estados Unidos de refugiados e imigrantes procedentes de sete países de maioria muçulmana constituiu o momento mais polêmico de seu mandato recém iniciado.

A decisão provocou um escândalo internacional, sobretudo depois que mais de 100 imigrantes e refugiados, incluindo vários que têm visto de residência permanente nos Estados Unidos, foram detidos em diferentes aeroportos do país. Alguns foram devolvidos aos seus países e muitos outros foram liberados nos Estados Unidos, frequentemente com a ajuda de advogados locais, depois de terem permanecido retidos durante horas.

Os críticos do decreto presidencial consideram que se trata de uma decisão inconstitucional e inclusive “antiamericana”.

Seus defensores sustentam que é apenas uma medida temporária similar a restrições aplicadas em 2011 pelo antecessor de Trump, o democrata Barack Obama, para defender a segurança nacional num momento de máxima tensão internacional provocada por atentados terroristas.

Mas é legal? A seguir, um resumo das posturas de ambas as partes:

– “Não é contra os muçulmanos” –

A primeira emenda da Constituição americana protege o direito à liberdade de culto, de expressão e de imprensa.

Os partidários do decreto de Trump insistem que a ordem executiva tem por objetivo “proteger a nação da entrada de terroristas estrangeiros” e não atenta contra o direito de ninguém.

“Isto não é, repito, uma proibição aos muçulmanos”, disse na terça-feira o secretário de Segurança Interior, John Kelly, acrescentando que a liberdade religiosa é um “valor fundamental, um tesouro” a cuidar no país.

O decreto não está dirigido explicitamente contra os muçulmanos, considerou Jonathan Turley, professor de direito na Universidade George Washington, em defesa da decisão do novo inquilino da Casa Branca.

“Existe uma lei de 1965” que proíbe a discriminação por motivos religiosos ou pela origem nacional, lembrou, referindo-se à Lei de Imigração e Nacionalidade. “Há argumentos convincentes em favor do presidente”, acrescentou em declarações à MSNBC.

Benjamin Wittes, redator-chefe da Lawfare, disse em seu blog sobre temas de segurança nacional que, apesar da natureza “malévola” da ordem por seu potencial impacto negativo sobre muitas vidas de inocentes, tem base legal.

“O poder do presidente em relação à admissão de refugiados é enorme”, escreveu Witter. “Seu poder para limitar a emissão de vistos e a entrada de estrangeiros nos Estados Unidos é muito amplo”, disse.

– “O decreto viola direitos” –

Mas os opositores ao decreto presidencial também têm argumentos a seu favor.

A União pelas Liberdades Civis, um grupo de defesa dos direitos humanos que apresentou recursos contra a expulsão de muitos imigrantes, conseguiu fazer com que os juízes proibissem as deportações de refugiados que já estão admitidos legalmente no país, ou dos imigrantes dotados de vistos provenientes das sete nações de maioria muçulmana mencionadas no decreto.

A juíza distrital Ann Donnelly escreveu em uma de suas decisões que a disposição de Trump “viola direitos ao devido processo e à proteção igualitária garantida pela Constituição dos Estados Unidos” a todas as pessoas.

Michael Price, assessor do programa de liberdade e segurança nacional no Centro Brennan pela Justiça, disse que muitos dos argumentos em favor do poder discricionário do presidente para decidir sobre assuntos migratórios “estão fora de lugar”. Afirmou que há duas perguntas relacionadas: se o presidente tem autoridade legal e se tem autoridade constitucional para agir da forma que agiu, e estimou que Trump está equivocado em ambos os casos.

O Congresso promulgou muitas leis para impedir que o presidente exclua pessoas por motivos ideológicos, disse, lembrando que a seção 212 do código atual sobre imigração proíbe claramente impedir ou negar a entrada de uma pessoa em função de suas crenças, afirmou à AFP. “O presidente violou” este princípio, disse.

Em relação ao tema mais amplo da constitucionalidade do decreto, os tribunais garantiram que o presidente goza de amplos poderes, “mas se agir baseando-se em considerações religiosas ou com intenção discriminatória, a decisão pode mudar”, indicou.

Vários legisladores republicanos afirmaram que Trump simplesmente está tomando medidas para proteger os americanos, mas Price estima que suas decisões não caminham neste sentido, mas em uma direção discriminatória.

Lembrou que durante a campanha eleitoral, Trump e vários de seus seguidores, como o ex-prefeito republicano de Nova York Rudolph Giuliani, falaram de proibir a entrada no país de imigrantes muçulmanos e de adotar leis para alcançar isso.

“Serão apresentadas muitas demandas legais contra este decreto nos próximos dias”, previu.