Os homens o consideram a maior invenção da humanidade. E as mulheres, também. Para eles, o biquíni revela muito sem mostrar tudo. Para elas, liberta e sensualiza sem vulgarizar. Desde que foi criado por dois franceses, Jacques Heim e Louis Reard, há exatos 60 anos, o biquíni tornou-se mais do que símbolo da sensualidade feminina para se transformar em uma manifestação de comportamento e de estilo de vida. A ?menor peça entre todas as peças de banho?, como o definiu Reard, integrou-se de vez às paisagens de praias e piscinas de todo o mundo, mas jamais se banalizou nem deixou de seduzir a imaginação masculina e a vaidade masculina. ?Uma garota em um biquíni é como ter uma pistola carregada sobre sua mesa ? não existe nada de errado nisso, mas é difícil parar de pensar nelas?, escreveu o escritor Garrison Keillor.

 

A história e o glamour desses dois minúsculos pedaços de pano acabam de ser retratados nas 400 páginas no livro The Bikini Book, da escritora e ex-modelo Kelly Killoren Bensimon, sem previsão de tradução para o português. Patrocinada pela Lycra, marca intimamente ligada à evolução dos trajes de banho, a publicação revela as diversas faces de um dos segmentos mais badalados da indústria de moda. Para isso, Kelly recorre a um extenso acervo de fotos ? muitas delas, históricas. Trata-se do aspecto mais fascinante do trabalho. Elas revelam o papel que o biquíni foi assumindo ao longo do tempo. Sua certidão de nascimento oficial registra 26 de junho de 1946 como a data em que a criação de Reard e Heim veio ao mundo. Menos de uma semana depois, os EUA realizaram uma série de testes com bombas atômicas no Arquipélago de Bikini, justamente no momento em que a invenção da dupla francesa provocava um tremor na sociedade da época. Mais: de tão minúscula, a peça também remetia ao tamanho do átomo. Pronto: o nome pegou imediatamente. Na ocasião, o próprio Reard definiu os limites de sua criação. ?Um biquíni não é um biquíni a menos que seja possível empurrá-lo através de uma aliança de casamento?, disse ele.

 

Bem antes disso, porém, as moças já se arriscavam a ?expor a pele mais do que nunca?, para usar uma expressão do livro de Kelly. Um mosaico romano datado do século 4 mostra duas jovens atletas vestindo apenas um duas-peças. No Oriente Médio, os haréns de sultão viviam repletos de mulheres com esse tipo de traje. Isso não arrefeceu o furor desencadeado em 1946. Alguns países proibiram o uso de biquínis em suas praias. A resistência começou a cair quando o cinema adotou o modelito para suas maiores estrelas ? o que mereceu um capítulo no livro de Kelly. Jayne Mansfield, Rita Hayworth, Carmem Miranda e sobretudo Esther Williams, a mais famosa nadadora dos musicais, foram personagens decisivas na popularização do maiô de duas peças. Nada, porém, teve mais efeito nessa onda do que ?E Deus criou a mulher?, o filme em que a deslumbrante Brigitte Bardot, metida em um minúsculo biquíni (para os padrões da época), firmou de vez sua imagem de símbolo sexual.

 

A partir daí, cinema e biquíni jamais se separaram. The Bikini Book reserva um capítulo apenas para discutir essa relação nos filmes de James Bond. Afinal, Bond Girl que se preza aparece em trajes de banhos para tirar o fôlego do agente de Sua Majestade e, é claro, de todos os marmanjos presentes à sessão de cinema. O desfile começou no filme de estréia da série, ?O Satânico Dr. No?, de 1962. Nele, Ursula Andress emerge do mar metida num biquíni branco e uma faca enfiada num cinturão, um momento que mudou a vida da atriz. ?O biquíni fez de mim um sucesso?, declarou ela. Em 2001, num leilão da Christie?s, em Londres, a peça foi arrematada por um colecionador pela bagatela de US$ 140 mil. A famosa cena foi refilmada exatamente quarenta anos depois por outra estonteante Bond Girl, a morena Halle Berry, em ?Um novo dia para morrer? ? uma homenagem à antecessora Ursula Andress e aos olhos do público masculino.

 

Consagrado no cinema, o biquíni transformou-se no mais visível produto da indústria da moda. E aí, o Brasil ganhou um espaço de destaque no mundo. É um fato incontestável e reconhecido pela autora Kelly Bensimon, que dedicou um capítulo específico ao País. Estão ali fotos de bumbuns esculpidos com capricho pela natureza, de Helô Pinheiro, a Garota de Ipanema, do Carnaval e até de biquínis com propaganda política. Faltou, porém, a clássica foto de Leila Diniz, grávida, pousando na praia ? um instantâneo que chocou as mentes mais conservadoras e se tornou um emblema do clima de liberdade reinante no fim dos anos 60. Mas não se espere análises sociológicas ou comportamentais de The Bikini Book. Assim como seu objeto de estudo, o biquíni, é um livro muito mais para se ver e apreciar do que para refletir.