Choque de gestão pode ser uma expressão desgastada para muitas empresas. Não para a Bosch. Com portfólio que envolve o desenvolvimento de tecnologias e serviços para diferentes negócios, do automotivo à mineração, a companhia alemã adotou seu choque de gestão para driblar a crise sanitária. Enxugou custos, sem descartar investimentos, e viu a receita na América Latina apresentar alta de 6% em 2020, para R$ 6,9 bilhões – o Brasil respondeu por 74% (ou R$ 5,1 bilhões). “Estamos prevendo crescimento de dois dígitos na região em 2021”, afirmou à DINHEIRO Besaliel Botelho, presidente da Bosch América Latina.

A confiança na retomada dos negócios está diretamente relacionada ao aumento no ritmo da vacinação contra a Covid-19. Até quarta-feira (30), 26 milhões de pessoas (16% da população acima de 18 anos) foram totalmente imunizadas no Brasil – e o total de vacinados com ao menos uma dose chegou a 47 milhões. Apesar de prever um ano tão desafiador quanto o anterior diante das incertezas, a empresa prevê investimentos de R$ 170 milhões no País.

A versatilidade do portfólio permitiu à Bosch enxergar oportunidades, como o aumento das demandas no setor de tecnologia, principalmente em comunicação. “Investimos bastante em TI”, disse Botelho. Em julho e agosto, a multinacional atingiu níveis de receita bem parecidos aos do período pré-pandêmico. Diante da situação, abriu mão das medidas provisórias que, por exemplo, reduziram a jornada de trabalho e o salário dos funcionários – dos 9,8 mil postos na região, 8,2 estão no Brasil. Isso só foi possível, segundo ele, porque a recuperação no segundo semestre levou a um leve crescimento da receita no fim do ano. “Tivemos fortes impactos de custo que afetaram os resultados, mas fechar 2020 com um número levemente positivo, mesmo que de apenas um dígito [6%], foi fator de sucesso para a empresa”, disse.

LZP Producoes

“Tivemos impactos de custo fortes, mas fechar 2020 com um crescimento levemente positivo, mesmo que de apenas um dígito, foi para nós um fator de sucesso” Besaliel Botelho, presidente da Bosch América Latina.

O mercado automotivo é o carro-chefe do portfólio de serviços oferecidos pela companhia. Em junho, a empresa inaugurou, na Alemanha, uma fábrica de semicondutores. O investimento de 1 bilhão de euros foi financiado em parte pelo governo local e por instituições financeiras da União Europeia. A produção irá abastecer o mercado global, inclusive o Brasil. A abertura das instalações foi antecipada em seis meses devido à crise de abastecimento provocada pela pandemia. A situação tem provocado a paralisação de fábricas de automóveis pelo mundo, inclusive no Brasil. “A situação deve ser normalizar apenas em 2022”, afirmou o executivo.

O desenvolvimento da empresa, que por muitos anos trabalhou com a linha branca (fogão e geladeiras), andou para outros segmentos. Além de ferramentas elétricas, a Bosch comercializa serviços de sistemas de segurança, tecnologias para o agronegócio e mineração, por exemplo. Ao mesmo tempo em que a diversificação traz mais receita, embute novas preocupações, como a alta demanda por insumos, como aço, plástico e papelão, que tem obrigado o setor de supply chain a se desdobrar para garantir o abastecimento. “Estamos com vários gargalos pequenos sendo mitigados”, disse Botelho. “Porém, estamos crescendo.”

A especialista Flávia Nunes, consultora de varejo da Complement Consultoria & Marketing, valoriza essa diversificação e afirmou que empresas com o perfil da Bosch identificaram nos últimos anos onde poderiam criar e ofertar soluções. “Ela criou soluções de mobilidade, domésticas, industriais e comerciais. É uma marca que está presente do agronegócio até a dona de casa”, disse, ao destacar que não basta simplesmente crescer e atender todo lugar sem ter uma solução que, de fato, ajude o negócio. “Envolve muito estudo.” Uma lição de casa que parece estar sendo feita da melhor maneira pela Bosch.