Houve um tempo em que comprar roupas de segunda mão era um hábito restrito a fashionistas vintage ou a quem não podia renovar o figurino com peças novas. O garimpo de roupas usadas em brechós, que sempre foi uma tradição na Europa, era visto com preconceito no Brasil. Não mais. A preocupação com o consumo sustentável e a diversidade de plataformas que oferecem experiências sofisticadas atraem mais gente interessada em itens de luxo que já tiveram outro dono.

Um exemplo é a Prettynew. Fundado em 2014 pela empreendedora Gabriella Constantino como um hobby, o serviço de e-commerce de artigos de segunda mão foi ganhando relevância até que se tornou a principal ocupação de Gabriella, há cerca de três anos. No ano passado, a plataforma cresceu 100% em vendas e superou a marca de 10 mil usuários cadastrados. São mais de 400 marcas disponíveis. “As pessoas tomaram a pandemia como um alerta e começaram a repensar o consumo desenfreado”, disse Gabriella, que trabalha no modelo de consignação.

Quem quer vender suas peças na plataforma precisa primeiro fotografá-las e enviar as imagens para a pré-seleção. Se forem aceitas, vão para a sede da Prettynew, em Brasília. Lá, passam por uma verificação de autenticidade, são higienizadas e cadastradas na plataforma. Feita a venda, a empresa fica com uma comissão. É possível encontrar bolsas das grifes Prada e Chanel, joias da H. Stern ou sneakers da Balenciaga pela metade dos preços cobrados nessas lojas.

GIGANTE Uma das maiores do setor no mundo, a ThredUP já firmou parceria com a Farfetch, referência em e-commerce de luxo. (Crédito:Divulgação)

O foco é a venda on-line, mas a Prettynew também tem uma loja física. O espaço foi pensado para oferecer a mesma experiência a que o consumidor de roupas de luxo está acostumado. E isso ajuda a superar o preconceito que existe com as peças de segunda mão. “Quando comecei, as pessoas perguntavam como eu tinha coragem de vender roupas usadas, cheias de energia. A cada ano, esse preconceito foi diminuindo”, afirmou Gabriella. A empreendedora aponta que o cliente brasileiro busca uma peça com pouquíssimas marcas de uso, além da certeza de que o produto é original e foi tratado com o cuidado que merece.

IGUATEMI E AREZZO A Prettynew não é a única a revender roupas de grife. Um dos principais nomes entre os brechós de luxo é o Etiqueta Única, de Nelson e Patrícia Barros. A dupla iniciou suas atividades bem antes de as peças usadas entrarem na moda. Em maio, quando o interesse do consumidor já era patente, o brechó firmou uma parceria com o Iguatemi 365, marketplace da rede de shopping centers, oferecendo créditos em compras a cada item de segunda mão vendido.

Há também a Troc, fundada por Luanna Toniolo. Embora ofereça peças de grifes como Fendi e Gucci em seu e-commerce, a atuação é mais abrangente e inclui marcas mais acessíveis. A empresa foi comprada no final do ano passado pela ZZ Ventures, do grupo Arezzo&Co.

A tendência ganhou tração globalmente durante a pandemia. A thredUP, uma das maiores do mundo em venda de itens usados, fez uma pesquisa a partir de dados da GlobalData. Ela aponta que o segmento de resale, como é chamada a moda de segunda mão, pode superar US$ 77 bilhões apenas nos Estados Unidos até 2025. De acordo com as informações levantadas, 33 milhões de americanos compraram uma roupa em um brechó pela primeira vez em 2020, e 76% deles pretendem continuar buscando opções de segunda mão.

MODA CIRCULAR Luanna Toniolo, da Troc, startup de resale que foi a primeira aquisição do braço de corporate venture do grupo Arezzo&Co. (Crédito:Giorgio Tararthuch Bastos)

A thredUP anunciou uma parceria com a Farfetch, principal e-commerce de moda de luxo do mundo. Com o projeto Farfetch Donate U.S., consumidores podem doar peças que não querem à plataforma de usados. Quando um item é vendido, ao menos 50% do valor é doado a instituições de caridade, e o restante (menos a comissão da loja) é transformado em créditos na Farfetch.

Grandes grupos já olham para o resale. O conglomerado Kering comprou uma fatia de 5% da startup Vestiaire Collective e fechou parceria com a plataforma The Real Real para oferecer peças seminovas de grifes como Gucci e Alexandre McQueen. Além do charme, os brechós de luxo estão se tornando um negócio altamente rentável.