Ao lado de 15 governadores e quatro vices, o chefe do Executivo do Distrito Federal (DF), Rodrigo Rollemberg (PSB), esteve no jantar promovido pelo presidente Michel Temer, na terça-feira 13, no Palácio do Alvorada. O cardápio do encontro foi a renegociação das dívidas estaduais com o BNDES, embora a crise política fosse o assunto mais comentado do cafezinho. Na semana anterior, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia absolvido a chapa Dilma-Temer. “Foi uma decisão de caráter muito político”, afirma Rollemberg, o primeiro governador a pedir a renúncia do presidente Temer, logo após as polêmicas gravações da JBS, que vieram a público há quase um mês.

O seu partido, o PSB, ao qual é filiado desde 1985, desembarcou do governo Temer no dia 20 de maio. Rollemberg, cujo nome aparece na lista de propinas do delator da JBS, Ricardo Saud, diz que a empresa não teve contrapartida ao longo da sua gestão. “A JBS não recebeu nenhum benefício, ao longo de dois anos e cinco meses de governo, pelas doações feitas à minha campanha”, afirma o governador do Distrito Federal. Ele concedeu entrevista à DINHEIRO no seu gabinete, no Palácio do Buriti, na quarta-feira 14. A seguir, os principais trechos:

DINHEIRO – Qual foi o tema do jantar dos governadores com o presidente Michel Temer?

RODRIGO ROLLEMBERG – Desde o início do governo Temer, justiça seja feita, o presidente esteve aberto a uma pauta construída pelos governadores. A partir de uma iniciativa minha, criamos um Fórum dos Governadores, que já teve sete reuniões, em Brasília. Houve a renegociação das dívidas dos Estados e a repartição dos recursos obtidos com o programa de repatriação. Havia também um acordo para alongar as dívidas dos Estados com o BNDES, até setembro, num total de R$ 20 bilhões. Esse assunto, que não tinha avançado, foi o tema principal do jantar. O presidente do BNDES [Paulo Rabello de Castro] prometeu ainda, a partir de janeiro, alongar outros R$ 30 bilhões, incluindo os recursos do BNDES para financiamentos dos estádios da Copa do Mundo.

DINHEIRO – O que mais foi discutido?

ROLLEMBERG – Um dos temas importantes foi a não aplicação da emenda constitucional 94, aprovada no ano passado, que permite a utilização de 20% dos depósitos judiciais privados para o pagamento de precatórios. O ministro [da Fazenda], Henrique Meirelles, se comprometeu a resolver.

DINHEIRO – Os governadores foram buscar dinheiro?

ROLLEMBERG – A situação dos Estados é muito grave e há uma enorme dependência da União. Em alguns casos, o quadro é mais grave do que em outros, mas, de uma forma geral, todos os Estados estão com uma dificuldade muito grande. Muitos estão parcelando a folha de salários – o Rio Grande do Sul em até nove vezes. Aqui, nós estamos fazendo um esforço hercúleo para pagar os salários em dia. Todo mês, quando chega próximo do dia 25, nós temos de reter o pagamento de fornecedores e prestadores de serviços para poder juntar os recursos e pagar os salários em dia.

DINHEIRO – É a crise econômica ou a má gestão que explica a situação dos Estados?

ROLLEMBERG – É claro que a crise agrava muito a situação dos Estados, especialmente de gestões como a nossa, que assumiu um rombo de R$ 6,5 bilhões do governo anterior [gestão Agnelo Queiroz, do PT]. Tomamos várias medidas de austeridade, reduzimos mais de cinco mil cargos comissionados, cortamos 18 secretarias, mas o PIB encolheu 8% em dois anos. É impossível consertar isso em dois anos e meio, embora tenhamos avançado bastante. Saímos de um déficit de R$ 2,5 bilhões em 2015 para R$ 700 milhões em 2016

DINHEIRO – Arrumar as contas envolvem medidas impopulares. Como lidar com a baixa popularidade a menos de dois anos das eleições?

ROLLEMBERG – O nível de consciência da população brasileira é grande. As pessoas sabem que foi a irresponsabilidade fiscal que nos levou a essa situação. Foi a irresponsabilidade de gestores que gastaram muito mais do que podiam. Em Brasília, mais de 80% do orçamento é comprometido com o pagamento de pessoal. É insustentável. Estamos fazendo o que é preciso, com custo político e pessoal muito elevado. No momento oportuno, as pessoas vão reconhecer esse esforço.

DINHEIRO – Se o senhor ainda fosse senador, aprovaria a reforma da Previdência Social proposta pelo governo Temer?

ROLLEMBERG – Eu certamente aprovaria mudanças na Previdência, mas não sei se exatamente essa reforma.

DINHEIRO – E a reforma trabalhista?

ROLLEMBERG – Qual é a coisa mais importante neste momento para o País? É a retomada do emprego. As medidas que estão sendo apreciadas pelo Congresso Nacional contribuem para reduzir o desemprego? Se a resposta for sim, devemos apoiar.

DINHEIRO – O senhor mencionou anteriormente que os Estados são muito dependentes da União. É preciso rever o pacto federativo?

ROLLEMBERG – Sem dúvida. Os Estados assumiram muitas responsabilidades sem a contrapartida de recursos. Não existe uma União forte com Estados fracos.

DINHEIRO – Por que o PSB desembarcou do governo Temer?

ROLLEMBERG – O PSB entendeu que não deveria apoiar as reformas trabalhista e da Previdência. Eu defendi que não deveríamos fechar questão, mas o partido entendeu de forma diferente. Uma coisa é a posição política do partido. A outra é a posição institucional do governador, que não faz oposição.

DINHEIRO – O senhor não faz oposição, mas defende a renúncia do presidente Temer…

ROLLEMBERG – O partido, num determinado momento, defendeu a renúncia do presidente como um gesto que pudesse atenuar a crise. A renúncia é um ato unilateral e, portanto, o presidente entendeu que não deveria renunciar. Nós temos as instituições funcionando e todo o processo legal em andamento.

DINHEIRO – Como o senhor avalia o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, por 4 votos a 3, absolveu a chapa Dilma-Temer?

ROLLEMBERG – É difícil julgar sem conhecer tudo o que há nos autos. Qualquer decisão ali seria uma decisão difícil. O que eu percebo é que a decisão do TSE foi de caráter muito político, no sentido de que a maioria do tribunal teve um entendimento de que a cassação do presidente, naquele momento, poderia aumentar a instabilidade do País.

Ministros do TSE no julgamento da chapa Dilma-Temer (Crédito:Roberto Jayme/Ascom/TSE )

DINHEIRO – A Procuradoria-Geral da República vai encaminhar uma denúncia contra o presidente Temer. O sr. acredita que dois terços dos deputados federais aceitarão a denúncia?

ROLLEMBERG – Tenho a impressão de que o que vai definir a posição da Câmara são os elementos formais da denúncia e se teremos algum novo fato relevante em relação a isso.

DINHEIRO – Qual foi a sua reação às gravações de Joesley Batista com o presidente Temer?

ROLLEMBERG – Estamos tendo no Brasil, há alguns anos, revelações que têm contribuído para elucidar um sistema político completamente falido e, ao mesmo tempo, que trazem consequências políticas e econômicas. O mais importante é frisar que as instituições estão funcionando e que o Brasil amadureceu. Ao final, teremos um País melhor.

DINHEIRO – O cenário mais provável é o de permanência do Temer até o fim de 2018?

ROLLEMBERG – Tenho a impressão de que, a partir da decisão do TSE, o cenário mais provável é que o presidente Temer chegue até o final do mandato.

DINHEIRO – Os grandes doadores das principais campanhas nas últimas eleições, inclusive da sua, em 2014, foram as empreiteiras e a JBS, empresas investigadas pela Operação Lava Jato. Isso não lhe incomoda?

ROLLEMBERG – É importante registrar que, como você disse, são grandes doadores que doaram para quase todos os candidatos. Ao final, não estamos julgando apenas pessoas, mas um modelo político que se esgotou.

DINHEIRO – O que deve mudar ser alterado para a próxima eleição?

ROLLEMBERG – O grande desafio é o barateamento das campanhas eleitorais. Defendo que, mais importante do que definir se teremos financiamento público ou privado,é democratizar as campanhas a partir do seu barateamento. Qual é o custo mais alto de uma campanha eleitoral? É custo da televisão. Defendo que a Justiça Eleitoral contrate empresas de comunicação, que vão oferecer a todos os candidatos os mesmos recursos de gravação. Seria um financiamento público feito pela própria Justiça Eleitoral.

DINHEIRO – O delator da JBS, Ricardo Saud, afirmou que vários governadores foram eleitos com dinheiro de corrupção, inclusive o senhor. Qual a sua posição?

ROLLEMBERG – As doações que eu recebi da JBS foram rigorosamente declaradas. A primeira parte foi para o partido e a segunda, diretamente para a minha campanha. A JBS não recebeu nenhum benefício, ao longo de dois anos e cinco meses de governo, pelas doações feitas. Nenhuma contrapartida.Muito pelo contrário. Ela tinha um centro de comercialização de carnes em Brasília e solicitou um enquadramento diferenciado. Não foi dado, pois entendemos que, para ter o benefício, teria de fazer o abate também, gerando empregos aqui. Eles fecharam e foram para outro Estado.

Joesley Batista, dono da JBS, presta depoimento ao Ministério Público Federal no acordo de delação premiada (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO – Os acordos de leniência estão adequados?

ROLLEMBERG – Vou responder em tese. É uma inovação na legislação brasileira. Muitas dessas empresas, do ponto de vista tecnológico e da engenharia, têm uma contribuição a dar ao País. Se essas empresas pararem de funcionar ao mesmo tempo, isso vai provocar prejuízos no processo produtivo. É importante que os acordos de leniência sempre levem em conta o interesse público e que sejam feitos num processo de total transparência.

DINHEIRO – Com um orçamento tão apertado, há espaço para investimentos?

ROLLEMBERG – Conseguimos duas operações de crédito, totalizando R$ 1,1 bilhão, que nos permitem investimentos em comunidades carentes, saneamento, captação de água, obras viárias, saúde e aterro sanitário.

DINHEIRO – Há espaço para concessões?

ROLLEMBERG – Sim, há projetos em análise, que terão editais, em breve. Faremos a concessão do Centro de Convenções de Brasília, do Parque de Exposições da Granja do Torto, uma PPP de iluminação pública e a Transbrasília, que é o aterramento de um linhão de alta tensão, financiado por unidades imobiliárias.

DINHEIRO – O que explica a grave crise hídrica em Brasília?

ROLLEMBERG – São três componentes. Há 16 anos que não havia investimentos em captação. O segundo, é a falta de chuvas, que estão muito abaixo da média histórica. Além disso, estamos rompendo uma cultura de ocupação irregular de terras públicas, que geram “gatos”, vazamentos e desperdício.

DINHEIRO – Como o sr. avalia a decisão do governo Temer de convocar as Forças Armadas para controlar os manifestantes, que destruíram vários ministérios, no mês passado?

ROLLEMBERG – Foi precipitada e equivocada. Tanto é que, logo em seguida, o presidente a revogou. Tivemos, em dois anos, 151 manifestações, sem nenhuma ocorrência mais grave durante o processo de impeachment. A Polícia Militar do Distrito Federal demonstrou a sua total capacidade. É importante registrar que o protocolo assinado entre a União e o nosso governo previa que a responsabilidade pela segurança dos ministérios era deles.

DINHEIRO – O sr. é candidato à reeleição?

ROLLEMBERG – O futuro a Deus pertence (risos). Até o final do meu governo, vou tomar as medidas necessárias para garantir o equilíbrio econômico-financeiro de Brasília. O caminho natural é disputar uma reeleição e, se for esse mesmo o caminho, estarei pronto.

DINHEIRO – O PSB terá candidato em 2018?

ROLLEMBERG – Esse é um debate interno.
O jogo no plano nacional está muito indefinido. Não vejo, hoje, no partido nenhum quadro com condições de disputar uma eleição para presidente da República. Temos excelentes quadros, mas não com conhecimento nem densidade nacional. O PSB é um partido que sempre construiu alianças, mas vamos aguardar os próximos meses.