Há um clima de otimismo quando se fala sobre o futuro com carros sem motorista. Afinal, não precisar dirigir parece algo incrível para muita gente. Mas para Noam Bardin, presidente executivo do Waze, isso não é o suficiente. Preocupado com congestionamentos, ele afirma que a nova tecnologia pode torná-los ainda mais caóticos no futuro. Para resolver esse problema, o israelense prega que as pessoas precisam parar de andar sozinhas em seus veículos e começar a compartilhar suas viagens por aí. “Se não mudarmos nossa rotina, o trânsito só vai piorar cada vez mais, não importa se você está numa Ferrari ou num carro popular”, diz.

Bardin é parte interessada nessa mudança de hábito: desde 2018, sua empresa oferece no Brasil o Waze Carpool, serviço que conecta motoristas com bancos vazios a passageiros dispostos a pagar uma pequena quantia, para “rachar o combustível”, aos condutores. Mais do que só uma proposta para ajudar a resolver o trânsito, o Carpool é também uma das formas que a empresa encontrou para faturar, cobrando uma comissão sobre as viagens.

Na entrevista a seguir, Bardin fala mais sobre o negócio de caronas do Waze, tira dúvidas sobre como de fato o aplicativo funciona e fala sobre a relação de sua companhia com a divisão de carros autônomos Waymo, da Alphabet.

O Waze Carpool teve 2 milhões de corridas desde que começou a operar no Brasil, em agosto de 2018. Só em São Paulo, são 4,5 milhões de usuários fazendo, em média, duas viagens por dia. Não é um número baixo de caronas?

Os 4,5 milhões de motoristas mostram o potencial do Carpool. Se algumas centenas de milhares toparem dar caronas, o impacto pode ser grande. Por outro lado, esses números mostram que a mudança de comportamento é difícil. Agora, estamos provocando as pessoas para fazer algo diferente, como dar uma carona ou deixar o carro em casa e pedir uma. É por isso que este é um projeto de longo prazo. Mas se não mudarmos nossa rotina, o trânsito só vai piorar cada vez mais. Há bons argumentos para mudar: o custo de ter um carro, o tempo que se perde dentro deles, o impacto na saúde e no meio ambiente. Ao mesmo tempo, a preguiça também fala mais alto – e ela é o nosso maior concorrente.

É possível imaginar muita gente interessada em caronas, mas pouca gente oferecendo. Há mais demanda que oferta?

O problema está nos dois lados. Tanto motoristas quanto passageiros têm receio de fazer a primeira viagem. Outro desafio é achar o preço correto que seja barato para o passageiro, mas valha a pena para que o motorista desvie sua rota

Como o Waze ganha dinheiro?

Hoje, temos dois modelos de negócio: o Carpool e os anúncios. Neste segundo lado, estamos indo bem. Não somos a plataforma certa para todo tipo de propaganda, mas podemos ajudar quem tem uma loja física – afinal, só em São Paulo, falamos com 4,5 milhões.

Muita gente usa o Waze, mas não entende como o app funciona. Pode explicar?

Imagine que, nesse minuto, há centenas de milhares de motoristas andando em São Paulo. Agora, pense que você poderia perguntar para todos eles como está o trânsito, só para decidir qual caminho você vai pegar para sair de casa. É isso o que o Waze faz, em tempo real: captamos as informações de rota e de velocidade de cada usuário. Com esses dados, bem como a média histórica de tráfego em cada rua, podemos mostrar quais são os melhores caminhos. Usar o Waze é como perguntar qual é a melhor rota para milhares de pessoas ao mesmo tempo.

Ao desviar rotas para ruas menos movimentadas, o Waze causa impacto em bairros residenciais. Como o sr. vê isso?

Não fomos nós que criamos as regras para as ruas, foi o poder público. Se há uma rua em que carros podem passar, então há uma rota. Tenho certeza de que as pessoas que reclamam que sua vizinhança está movimentada também usam o Waze em outros bairros – e adoram quando conseguem chegar mais rápido.

O sr. fala bastante sobre carros autônomos. Qual a relação do Waze com a Waymo, a divisão de veículos sem motorista da Alphabet, que controla o Google?

Falamos bastante, mas as duas empresas têm uma jornada de longo prazo. Nós, com caronas; eles, com carros autônomos. Haverá tipos mistos de transporte no futuro. O que eu sei é que precisamos que mais pessoas ocupem um veículo só, senão o trânsito não vai mudar. A mudança de comportamento tem que acontecer antes dos carros autônomos. Depois deles, não vai fazer diferença – afinal, você poderá dormir no meio do trânsito, então não vai se importar. Os carros autônomos não vão resolver o trânsito sozinhos. Precisamos que as pessoas dividam os carros. Mas podemos resolver isso: se todos dermos caronas a partir de amanhã, o problema do trânsito pode ser resolvido!

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.