É no caminho do mar brasileiro que está o horizonte para a retomada do crescimento da gigante alemã Thyssenkrupp, após perder 40% da receita global com a venda, no ano passado, da divisão de elevadores, que era sua unidade de negócios mais conhecida. No último ano fiscal (de outubro de 2019 a setembro de 2020), o faturamento da companhia alcançou 29 bilhões de euros, contra 40 bilhões de euros do período anterior. A aposta para a recuperação na América do Sul está no contrato assinado em 2020, no valor de R$ 9,1 bilhões, pela Marinha do Brasil com o Consórcio Águas Azuis, liderado pela empresa germânica, para a construção de quatro fragatas até 2028. “Espero recuperar essa parcela do faturamento perdida e superar essa receita. O objetivo é dobrar de tamanho no continente em três anos”, disse Paulo Alvarenga, CEO da Thyssenkrupp na América do Sul.

O grupo alemão fechou o ano fiscal com R$ 3 bilhões de receita na região, ante R$ 5 bilhões no exercício anterior. Na América do Sul, o Brasil representa 80% do total. Das 20 plantas industriais da companhia no continente, 16 estão no Brasil, duas no Chile e duas no Peru. E aí a construção das quatro fragatas entra de forma decisiva. Até esse contrato, a companhia não atuava na área de defesa naval no País. Elas poderão atuar na proteção dos 5,7 milhões de km² de território marinho, chamado pela Marinha de Amazônia Azul, onde estão reservas de óleo e gás e da camada de pré-sal. Além disso, a modernização da frota tem a ver com uma necessidade de atuação geopolítica. O poderio de defesa demonstra também quanto um país pode contribuir em uma missão oficial. E, nos últimos anos, o Brasil vem perdendo protagonismo.

Se por um lado o foco naval é a saída, a venda da linha de elevadores também pode virar oportunidade. Com o caixa reforçado, será possível saldar a dívida que alcançava 5 bilhões de euros. “Foi importante completar essa transação porque a dívida elevada estava limitando nossa capacidade de investimento”, afirmou Alvarenga. “É muito ruim quando há boas oportunidades de negócios e não há recursos para isso.” A divisão foi vendida por 17 bilhões de euros a um consórcio formado por Advent, Cinven e fundação RAG. Mesmo com novo dono, o segmento de elevadores ainda segue com o nome da Thyssenkrupp.

ENTREGA E é justamente com parte desses recursos que a empresa esperar dobrar de tamanho no continente, a partir dos investimentos na área naval. A primeira fragata, que demanda mais tempo para ser construída por causa do desenvolvimento da engenharia, será entregue em 2025. As demais serão concluídas nos três anos seguintes. Para construir os navios, a empresa alemã que chegou ao Brasil no século 19 a partir de encomendas de máquinas para cunhar moedas por Dom Pedro II, comprou, logo após a concretização do negócio com a Marinha, um estaleiro em Itajaí (SC). A aquisição do estaleiro possibilitará outros negócios do tipo com países da América do Sul. O projeto resultará na contratação de pelo menos 800 funcionários, juntando-se aos 4 mil trabalhadores da empresa na América do Sul. Desse total, pelo menos 3,5 mil estão no Brasil.

Além da Thyssenkrupp, o consórcio Águas Azuis é formado por Atech e Embraer. O projeto prevê transferência de tecnologia. Para Bruno Galhardo, presidente da Câmara Setorial de Equipamentos Navais, Offshore e Onshore da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (CSENO/Abimaq), a construção dos navios terá um impacto muito positivo na cadeia de fornecedores locais.
“É importante para a indústria naval, para a indústria nacional, e poder agregar valor à cadeia”, disse Galhardo.

Para o CEO da Thyssenkrupp na América do Sul, a frota da Marinha carece de renovação e essas serão as embarcações mais avançadas produzidas no Brasil. Os navios, de 107 metros, terão lançadores de mísseis e torpedos, e capacidade para 136 tripulantes e um helicóptero. “A nossa tecnologia eletrônica que faz a gestão do navio será repassada para a Embraer. Isso foi importante para a celebração
do contrato. É um casamento perfeito, já que o Brasil ganha com isso”, afirmou Paulo Alvarenga.

Se um em cada três edifícios no Brasil trazem elevadores da marca, a missão da companhia agora é conseguir manter que o botão para subir siga acionado. Desta vez, para navegar em mares mais calmos. E mais lucrativos.